Giliath ergueu-se e olhou diretamente para ele.
— Ela conduziu a mim e meus guerreiros por uma trilha alba, partindo de Firnstayn até a fortaleza de um mosteiro próximo a Aniscans. Lá, ela queria atravessar por uma segunda estrela e procurar por vocês. Mas havia um encantamento no portal. Nós não conseguimos abri-lo e fomos descobertos. Durante a luta que se seguiu, queimamos o mosteiro até os alicerces. Yulivee era contra isso, mas esses sacerdotes de Tjured só entendem uma língua! Eu pensei que você e seus companheiros soubessem disso. Acho que ela jamais diria espontaneamente alguma coisa a esse respeito. Ela se sente em dívida com vocês.
Uma esfera de chumbo tirou lascas de madeira do escudo troll. Giliath armou o arco e mirou na muralha de fumaça espessa.
Soaram batidas de tambor e o som de flautas. Uma fileira de homens com canos de fogo saiu do vapor de pólvora e começou a subir a encosta. Eram seguidos por duas outras fileiras. Giliath praguejou e atirou.
Farodin puxou duas espadas curtas que havia apanhado de elfos mortos. A espada de duas mãos era difícil demais de manejar lutando no meio das próprias linhas de defesa.
Os atiradores embaixo da encosta agora seguiam os cavaleiros da ordem, que estavam armados com espadas e escudos redondos. Entre eles caminhavam homens com tochas. Todos levavam pequenas caixas de madeira afiveladas à barriga.
Com estampidos, uma salva de tiros começou. Atingido no peito, Farodin foi jogado para trás. Sua armadura sofreu um amassado profundo.
Os atiradores da primeira fila pararam e carregaram suas armas. Andavam em formação aberta, de modo que os outros soldados da ordem não fossem atrapalhados pela sua marcha de avanço.
Chuvas de flechas baixaram sobre os agressores. Giliath atirava sem parar, ao mesmo tempo soltando pragas e blasfêmias. Farodin admirava-se com a coragem dos humanos. Devia estar claro para eles com quanto sangue eles teriam de pagar. Ainda assim, avançavam continuamente.
Quando a fileira seguinte de atiradores se deteve, Farodin agachou-se, apreensivo, atrás do grosso escudo de madeira. Línguas de fogo se adiantaram e outras esferas de chumbo bateram contra a madeira. Farodin viu um troll cambalear, atingido por vários tiros, e então sucumbir.
Os elfos revidavam o tiroteio com uma determinação desesperada. Saraivada atrás de saraivada de flechas atingiam os agressores. Mas nada mais parecia capaz de deter o seu avanço.
Quando estavam a menos de quarenta passos de distância, a terceira fileira de atiradores de fogo fincou suas hastes de apoio no chão. Eles baixaram as armas pesadas e sopraram as brasas de seus estopins.
— Para o chão! — gritou Giliath, atirando o arco de lado e deitando-se no solo. Farodin agachou-se ao seu lado. Quando a salva trovejou, ouviu a madeira do grande escudo de proteção se estilhaçar. Ao redor deles ressoaram gritos.
O elfo rolou de lado e voltou a se erguer com dificuldade. Viu os furos no grosso escudo troll. Lentamente, compreendeu o porquê de os humanos estarem tão convictos a respeito dessas novas armas. Passando por entre os atiradores, os guerreiros com as caixinhas de madeira afiveladas avançaram. Cada um deles segurava na mão direita uma pequena garrafa esférica de barro. Eles acenderam tiras de tecido sobre as garrafas, das quais subiu uma fumaça espessa e gordurosa. Então lançaram os estranhos projéteis na direção dos defensores.
Uma das garrafas despedaçou-se com ruído ao acertar o escudo troll. Uma chama ardente subiu pelo ar. Farodin recuou assustado com o calor repentino. O fogo agora ardia por todos os lados da linha de defesa. Farodin viu um arqueiro ser atingido e se transformar em uma tocha humana. O elfo atirou-se no chão e rolou aos gritos para lá e para cá, mas nada era capaz de apagar as chamas.
— O fogo de Balbar — murmurou Farodin. — A praga de Iskendria.
— De volta para a segunda fila! — destacou-se a voz de Ollowain no meio daquele inferno. — Recuem e apanhem algumas garrafas dessas para mim!
Farodin e Giliath correram na direção das ruínas da torre no começo da encosta íngreme.
— Apanhar as garrafas? Você perdeu a razão, elfo? Tirem as garrafas do caminho! — gritou Orgrim.
— Nós precisamos delas para pôr fogo sobre a ponte! — gritou Ollowain de volta.
A sede de luta dos defensores fora vencida. Em multidões densas, os últimos sobreviventes avançavam pelo caminho no rochedo.
Logo os primeiros humanos haviam chegado às trincheiras. Espadachins e atiradores passavam por entre as estacas. Com eles, vinham os guerreiros com as tochas e as caixas de madeira.
Os tiros de fogo agora caíam no meio da aglomeração de fugitivos. Orgrim tentou conduzir um contra-ataque com uma pequena tropa de trolls para deter os humanos um pouco mais. Giliath atirava flecha atrás de flecha enquanto recuava ao lado de Farodin.
O elfo, por sua vez, guardou suas duas espadas de volta na bainha e correu até Ollowain.
— Nós precisamos desse maldito fogo para bloquear a ponte. Precisamos detê-los por mais tempo!
De repente, o elfo deu um salto à frente e ergueu a mão com agilidade. Apanhara uma das malditas garrafas de barro no ar. Arrancou a tira de tecido acesa e colocou a garrafa cuidadosamente no chão.
— Viu só? É possível!
Farodin respirou com dificuldade.
— Vou preferir pegar uma caixa dessas!
Então cerrou os dentes e se apressou a seguir Orgrim.
Ali onde os trolls estavam atacando, os soldados da ordem recuaram. Com uma coragem cega, Farodin lançou-se para dentro da massa de inimigos. Rodopiava em uma dança mortal, bloqueando lâminas e golpeando os oponentes nas brechas de sua defesa. Um golpe de revés cortou a garganta de um dos atiradores de fogo, que não conseguiu erguer sua arma com rapidez suficiente para interceptar a investida. Uma pontada atravessou o bloqueio de um espadachim e entrou-lhe pela boca. Farodin se abaixou, soltou a lâmina e bloqueou o golpe de um segundo espadachim. Com um golpe no ombro, tirou o equilíbrio do homem e atingiu-o impiedosamente.
Abaixar, bloquear, estocar! Sangue espirrou no seu rosto. Um cano de fogo estalou tão perto que ele sentiu a mordida da chama vindo do cano da arma, mas a esfera o errou. Pôde sentir na boca o sabor do enxofre. Eles eram realmente filhos do devanthar! Farodin rasgou a barriga do atirador e o homem caiu de joelhos, aos gritos.
— Recuar! — gritou Orgrim. — Eles estão nos isolando dos outros. Recuar!
De canto de olho, Farodin viu um atirador apontar para o rei dos trolls. Estava distante demais para que conseguisse chegar até ele a tempo, então arremessou uma de suas espadas. A lâmina fincou, certeira, nas costas do soldado da ordem.
Farodin abaixou-se para pegar a arma de um morto.
— De volta, seu maluco sanguinário! Você não vai vencê-los sozinho! — o rei dos trolls havia corrido até o seu lado.
Uma garrafa de óleo estilhaçou-se no escudo de Orgrim. Chamas claras varreram a madeira. Línguas do fogo de Balbar também atingiram a armadura de Farodin, mas as manchas escuras que causaram não se incendiaram.
Bem próximos dele, o elfo viu dois guerreiros se ajoelharem com suas malditas caixas de madeira.
— Precisamos pegar aquelas caixas! — gritou para Orgrim. — Então vamos recuar!
O rei dos trolls soltou um xingamento que teria feito até Mandred empalidecer, mas Farodin não fez caso dele. Três espadachins apressaram-se em sua direção. Ele bloqueou um golpe e deixou a lâmina do agressor deslizar por sua arma. Então deu meia-volta, mudou a pegada e cravou a espada nas costas do guerreiro, enquanto deteve, com a segunda arma, uma investida por cima de sua cabeça. A clava de Orgrim destroçou o crânio do combatente seguinte.
Farodin lançou-se com ambas as espadas sobre o soldado sobrevivente da ordem. Com um movimento giratório, prendeu a lâmina do homem e enfiou-lhe sua segunda espada no abdome, atravessando seu escudo protetor.
Com um grande salto, o elfo chegou aos homens com as esferas de fogo e massacrou-os, sem piedade. As pequenas arcas de madeira tinham divisórias forradas com palha para que as finas garrafas de cerâmica pudessem ser transportadas e resistissem a pequenos impactos. Havia ainda nove garrafas nas duas arcas que conseguiram. Isso devia bastar!