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— Não pensem! — gritou Farodin. — Ele conhece todos os seus pensamentos. Não planejem o que querem fazer. Simplesmente ataquem!

Então a lança de Mandred rasgou a carne da fera. Fizera-lhe um corte fundo, bem embaixo das costelas. A criatura girou, bufando de raiva. O guerreiro levantou a arma para deter um golpe que tentou acertar sua cabeça. O cabo da lança quebrou-se com a força do choque. Mandred foi lançado para trás. Antes que a besta viesse ao seu encontro, Farodin se colocou à frente dela. Com impetuosos golpes de espada, o elfo a afastou de Mandred, dando ao humano a chance de se recuperar penosamente.

O jarl olhou para a arma destruída. A lâmina da lança tinha o tamanho de uma espada curta. Jogou fora a metade inútil do cabo. O sangue descia pelo seu braço. Ele sequer tinha percebido que fora atingido.

Enquanto isso, Farodin e a fera giravam um ao redor do outro, numa dança mortal, buscando a melhor posição para o ataque. Movimentavam-se tão rápido que Mandred não ousava avançar, com receio de atrapalhar Farodin.

A respiração do elfo tornou-se ofegante. O ar rarefeito! Mandred pôde ver como os movimentos de Farodin tornaram-se mais lentos. Com um tilintar, um golpe de garra rasgou-lhe o traje de malha de ferro, bem acima de seu ombro esquerdo. No mesmo instante, a espada de Brandan se ergueu. Sangue claro jorrou, e uma das garras do devanthar rodopiou no ar. A espadada amputara-lhe o pulso.

O devanthar grunhiu e recuou um pouco. Seria medo aquilo que se refletia em seus olhos azuis?

Farodin avançou. A besta, por sua vez, baixou a cabeça e imitou o gesto. Suas presas fincaram-se no peito de Farodin. Ambos despencaram no chão.

— Mandred...

A ponta da espada de Brandan estava atravessada no ventre da fera, saindo por suas costas. E mesmo assim ainda havia vida na criatura. Com horror, Mandred a viu se levantar.

— Nuramon... — O sangue escorreu dos lábios de Farodin. — Diga a ela... — E seu olhar se turvou.

— Farodin!

De repente Nuramon estava sobre o devanthar. Ergueu a espada com ambas as mãos e deixou-a despencar sobre a cabeça da fera. Com um som lancinante, a lâmina escorregou, deixando um sulco profundo e sangrento, mas sem penetrar. Com a força do próprio golpe, Nuramon recuou, vacilante. Seu rosto era a estampa de puro horror.

Ainda meio curvada, a besta voltou-se, perseguindo o elfo. Foi então que parou de repente.

“Esta é a minha última chance!”, pensou Mandred. O guerreiro, então, agiu rápido, aproveitando-se que a fera se ocupava de Nuramon. Deu a volta e, por trás do devanthar, agarrou, resoluto, sua presa com a mão esquerda, puxando-a com força e fazendo com que o monstro virasse a enorme cabeça para trás. Sem perder tempo, com a mão direita cravou a lâmina da lança num daqueles aterradores olhos azuis. Sem encontrar resistência desta vez, o aço forjado com a excelência élfica enterrou-se profundamente no crânio da fera.

O devanthar se revolveu uma última vez. Mandred foi arremessado contra a imensa pedra sobre a qual Luth um dia se sentou. Uma dor pesada palpitava em seu peito.

— Os cães comerão o seu fígado. — exclamou Mandred, tossindo.

Um sonho

O sonho que acometeu Noroelle naquela noite foi nítido. Primeiro seu olhar vagueou pelas imediações primaveris de sua casa, e depois sobre a costa de Alvemer. De repente ela viu uma estranha paisagem de inverno, montanhas escarpadas e florestas densas, permeadas por vozes e gritos. Diante de um tronco de carvalho jazia um centauro morto, ferido tão terrivelmente como nunca vira antes. Era Aigilaos. De súbito tinha Lijema diante dos olhos, deitada inerte na neve, com um enorme ferimento no ventre. De Lijema foi até Brandan, que jazia imóvel ao lado de uma fogueira de acampamento, enquanto berros sofridos de lobos ecoavam da floresta.

O olhar de Noroelle encontrou uma caverna de gelo, tomada por sons de luta. Ela não podia ver quem lutava ali. Via somente os que haviam sido abatidos. Lá estavam Vanna, a feiticeira, e também um lobo. Com um golpe, o ruído de luta cessou, e Noroelle viu Farodin no chão. Tinha uma ferida aberta no peito, e em seus olhos parecia não haver vida.

Noroelle gritou e gritou, sem respirar...

De repente estava novamente na sala da rainha, ao lado do trono vazio. Olhou em volta. Estava sozinha. As paredes estavam secas, não havia mais o doce murmúrio da água. A luz do dia atravessava o teto e refletia no salão. Noroelle olhou para baixo e viu que vestia uma camisola branca.

O portão abriu-se lentamente. Elfas vestidas de branco, com as faces ocultas por véus, traziam duas macas, uma ao lado da outra. Noroelle sabia quem traziam até ela. Desesperada, virou-se de costas. Não conseguiria suportar a visão.

As elfas se aproximavam mais e mais. Finalmente pararam diante da escada até o trono. De canto de olho, Noroelle observava as carregadoras das macas ali em pé, mudas e imóveis como se fossem estátuas. Não queria de forma alguma ver os corpos sem vida de seus amados. Mas, em vez de obedecê-la, seu olhar vagou até os corpos de Farodin e Nuramon. Pareciam estar intactos, mas a eles faltava qualquer vida.

Tremendo, Noroelle olhou em volta de si, como se ali tivesse de haver alguém para apoiá-la. Mas não havia uma pessoa sequer. Então viu sangue escorrendo pelas paredes. Olhou para cima e observou que ele vinha das fontes.

Noroelle correu dali. Atravessou a porta lateral, que era restrita à rainha, deixando o salão. Correu o mais rápido que podia, sem prestar atenção no destino a que seus pés a levavam.

De repente, estava de novo à margem de um lago. Foi até a nascente e ficou aliviada ao encontrar água em vez de sangue. Esgotada, recostou-se no tronco de uma das duas tílias e chorou. Ela sabia que era somente um sonho. Mas também sabia quantas vezes vira em sonho a mais pura verdade. Então tinha medo do despertar.

Pouco depois, ajoelhou-se junto ao lago e observou seu semblante na superfície da água. Não restara nada do que Farodin e Nuramon viam nela. Suas lágrimas caíam na água e turvavam o seu reflexo.

— Noroelle! — ouviu uma voz familiar dizer.

Ela se levantou e deu meia-volta. Era Nuramon.

— É você mesmo?

Ele vestia uma calça e uma camisa de linho simples. Estava descalço.

— Sim — disse ele, sorrindo.

Noroelle sentou-se sobre a pedra ao lado da água e sinalizou para que ele viesse junto de si.

Ele se acomodou perto dela e segurou sua mão.

— Você chorou.

— Tive um sonho ruim. Mas agora já passou. Você está aqui. — Ela olhou em volta. — É estranho. Tudo é tão nítido. Como se não fosse sonho.

— Você tem poderes sobre este mundo de sonho. Isso é o que sinto. O que você quiser vai acontecer. A dor lhe conferiu essa força. Ela despertou desejos em você.

— Não é a primeira vez que vejo você em meus sonhos, Nuramon. Você se lembra da última vez que nos encontramos aqui, durante o meu sono?

— Não. Pois eu não sou o Nuramon dos seus sonhos. Eu não sou a imagem que você faz de mim. Eu vim de fora do seu sonho.

— Mas por quê?

— Porque preciso me desculpar. Eu quebrei a minha promessa. Nós não voltaremos — disse isso com a voz tão suave que ela permaneceu totalmente calma.

— Então o que vi há pouco era verdade?

Ele concordou com a cabeça.

— A Caçada dos Elfos fracassou. Estamos todos mortos.

— Mas você está aqui.

— Sim, mas não posso ficar muito. Sou somente um espírito que a morte logo vai levar e que um dia renascerá. Agora você sabe o que aconteceu. E você não o ouviu da boca de qualquer outra pessoa. — Ele se levantou. — Eu lamento tanto, Noroelle.

Nuramon olhou-a, já sentindo saudades.

Ela pôs-se de pé.

— Você disse que tenho poderes sobre este sonho.

Ele confirmou com a cabeça.

— Então segure a minha mão, Nuramon!

Ele a obedeceu.