O elfo desviou de mais um golpe de machado, esquivou-se de uma espada e feriu um dos agressores no ombro, por cima do escudo. Os guerreiros agora formavam um grande círculo ao seu redor.
— E agora, quem é o próximo de vocês a agonizar? — provocou Farodin.
Enquanto isso, o gigantesco líder havia colocado um elmo e afivelado um escudo no braço.
— Vamos pegá-lo! — disse, avançando e erguendo o machado duplo.
Farodin era atacado por todos os lados. O guerreiro elfo ficou de cócoras para desviar dos golpes raivosos. Fez um giro baixo com a espada. Como uma faca quente na cera, sua lâmina de aço élfico cortava as pernas de todos que se aproximavam.
Algo roçou o braço esquerdo de Farodin, e sangue encharcou sua camisa. Com uma calma mortal, deteve um golpe de machado que mirava seu peito. A espada destroçou o cabo de madeira da arma. Os humanos moviam-se desajeitadamente. Farodin já observara isso em Mandred antes. Eles eram valentes e fortes, mas, comparados a um elfo que treinara a luta de espada ao longo de séculos, eram como crianças. Mas quanto ao resultado da luta, dificilmente haveria dúvidas. Eles simplesmente eram numerosos demais.
Como um dançarino, Farodin movimentava-se entre as fileiras de adversários, abaixando-se sob os golpes para reagir imediatamente em contra-ataque.
De repente estava diante do comandante louro.
— Vou fazer um colar com suas orelhas — provocou o homem. Ele atacou com um golpe impetuoso, mirando o braço de Farodin que segurava a espada, mas mudou de direção no meio do ataque.
Com um passo dançante, Farodin esquivou-se e chutou o gigante com toda a força sob a borda do escudo. Com um ruído repulsivo, a borda de cima do escudo, revestida de ferro, chocou-se contra o queixo do agressor. O gigante mordeu com força o lábio inferior e cuspiu sangue.
Farodin fez uma rotação e aplicou outro pontapé no escudo, que caiu para o lado. Com o lado plano da espada, atingiu o rosto do líder em cheio.
O gigante tropeçou. Farodin o agarrou, arrancou-lhe o elmo da cabeça e pôs a lâmina sobre sua garganta.
— Parem de lutar ou o seu líder morre! — gritou o elfo.
Os guerreiros recuaram. Um silêncio lúgubre baixou sobre a praça, interrompido somente pelos gemidos baixos dos feridos.
Nuramon saiu da casa do sacerdote. Sua camisa de couro estava suja de sangue.
— Vamos recuar para dentro do templo! — gritou Farodin para ele.
— Vocês jamais sairão vivos de Aniscans — disse o líder dos humanos, de forma ameaçadora e alto o suficiente para que seus homens pudessem ouvi-lo. — A ponte está ocupada. Todas as ruas estão bloqueadas. Estávamos preparados para o caso de o curandeiro criar dificuldades. Entreguem-se e prometo a vocês uma morte rápida.
— Nós somos elfos — retrucou Farodin friamente. — Você realmente acha que seria capaz de nos deter? — Fez um sinal para Nuramon, e seu companheiro foi com dois sacerdotes até a porta do templo.
Guillaume estava pálido como um cadáver. Durante a luta ficara simplesmente ali em pé, observando. Estava claro que era totalmente incapaz de infligir dor a alguém.
— Você está sangrando, elfo — disse o guerreiro louro. — Você é de carne e osso como eu. E pode morrer, assim como eu. Antes que o sol se ponha, beberei vinho no seu crânio.
— Para um homem com uma espada na garganta, é notável como você parece confiar no futuro. Farodin andou lentamente de costas na direção da alta porta do templo.
Os besteiros ao seu redor recarregavam suas armas.
Farodin pensou em Mandred e nos demais companheiros que havia deixado para trás na montanha do vinhedo. Será que viriam? Eles provavelmente viram o templo ser atacado.
Ele empurrou seu prisioneiro rapidamente para o chão e pulou através da porta do templo. Flechas dos besteiros zuniam ao seu redor. Nuramon bateu a pesada porta de carvalho e colocou a barra atravessando a porta. Farodin observou preocupado a camisa de Nuramon, empapada de sangue.
— Está muito ruim?
O elfo olhou para baixo.
— É mais sangue de humanos do que o meu próprio.
Estava escuro e frio dentro do templo. Sólidas vigas de madeira atravessavam o teto, suportado por fortes colunas. O templo inteiro era composto de uma só sala. Não havia móveis, nem um púlpito onde um orador pudesse subir. O único adorno era um menir, uma pedra de mais de dois metros de altura com alguns caracteres gravados. As paredes eram caiadas de branco e divididas em duas galerias, que iam até o fim das paredes internas. Ainda acima das galerias havia janelas altas, através das quais a luz pálida da manhã cintilava. Lâmpadas a óleo queimavam em nichos ao longo das paredes e, em torno do menir, erguiam-se incensários de cobre, dos quais subia uma fumaça pálida.
A construção como um todo lembrava a Farodin mais uma torre de fortificação que um templo. Que tipo de deus seria Tjured? Um guerreiro certamente não era, tão desamparados estavam seus criados. Ambos os sacerdotes ajoelharam-se diante do menir, no meio do átrio redondo do templo. Rezavam submissos, agradecendo por terem sido salvos.
— Guillaume? — gritou Nuramon, que ainda estava em pé perto da porta. — Onde você está?
O curador saiu de trás de uma das colunas. Parecia estranhamente calmo, quase absorto.
— Vocês deviam ter me cedido a eles. Depois do banho de sangue na praça do templo, eles não descansarão até que estejamos todos mortos.
— Será possível que você esteja ansiando por sua própria morte? — perguntou Farodin aborrecido.
— Mas vocês não foram enviados para me matar? Que sentido faz disputar o privilégio de ser meu carrasco?
Farodin fez um gesto de desdém.
— O que rumina sobre a morte durante uma luta é o que deixará a vida. É melhor que você tenha alguma utilidade. Leve-nos até a saída dos fundos. Talvez possamos escapar por lá.
Guillaume abriu as mãos num gesto de desamparo.
— Isto é um templo, não uma fortaleza. Não há saída traseira, nenhum túnel escondido nem portas secretas.
Farodin olhou em volta sem acreditar. Ao lado do portal, uma escada em caracol subia até ambas as galerias. Sob as vigas do teto, os muros eram cortados por altos vitrais arqueados e coloridos. Eles mostravam imagens de sacerdotes vestindo os hábitos azuis-escuros dos veneradores de Tjured. Confuso, o elfo observava os vitrais. Um deles exibia um sacerdote sendo jogado em um caldeirão sobre uma fogueira. Em outra imagem, um sacerdote tinha os braços e pernas cortados e, em uma terceira, um homem de hábito azul era queimado em uma fogueira por selvagens que vestiam peles de animais. Quase todos os vitrais retratavam cenas de assassinatos. Agora Farodin entendia o motivo de Guillaume permanecer tão sereno. Ter um fim terrível era aparentemente a maior realização de um sacerdote de Tjured.
O som de um trovão arrancou o elfo de seus pensamentos. Poeira fina penetrou por entre as fendas da porta do templo. Outro trovão se seguiu, e as pesadas folhas da porta rangeram em seus ângulos. Farodin praguejou baixo. Parecia que os guardas do rei haviam encontrado algo para servir de aríete.
— Parem de rezar e façam alguma coisa de útil — bradou o elfo a ambos os sacerdotes, ajoelhados diante do menir. — Recolham todas as lâmpadas de óleo dos nichos. Nuramon, tente encontrar uma tocha. Então subam até a galeria superior. Depois vou tirá-los de novo dessa armadilha e trazê-los para baixo.
Com um estalo, uma das grossas tábuas de madeira da porta se partiu. Logo ela não conseguiria mais detê-los.
Inclemente, Farodin obrigou os sacerdotes a se apressar. Para subir a escada em caracol sem tropeçar, precisavam segurar seus longos hábitos, como se fossem saias. Da segunda galeria era possível chegar às janelas do templo. Por causa da espessura dos muros, elas ficavam em nichos profundos. Ao esticar os braços, Farodin conseguia agarrar diretamente a beirada inferior dos nichos. De um só golpe, ele puxou-se para cima e subiu diante da imagem de vidro de um dos sacerdotes, cujos membros destroçados eram trespassados pelos raios de uma roda. Os rostos dos torturadores pareciam impassíveis; o artista também não refletira sobre a combinação das cores do vidro com a luz da manhã. Era uma obra de arte inferior, que mesmo alguém sem talento conseguiria criar em um ou dois anos de trabalho razoável e ambicioso. Esse trabalho malfeito sequer podia ser comparado aos vitrais do castelo de Emerelle, feitos juntando milhares de fragmentos de vidro. Naquelas janelas trabalharam os mais talentosos artistas da Terra dos Albos ao longo de décadas, para conseguir criar uma combinação perfeita do vidro com a luz de cada hora do dia.