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Não. Está no castelo de Joinville, não muito longe daqui, com o duque Renato II da Lorena. O Rei ”emprestou-o” ao jovem duque para que ele tratasse da velha princesa Vaudémont, sua avó, que está muito doente. Além disso, Demétrios fez o horóscopo do príncipe e o que leu deixou-o tão interessado que já não o quer abandonar. E o Rei consentiu. Quanto a Esteban, foi ter com o patrão e fizemos a viagem juntos até Saint-Dizier... Assim, Demétrios abandona-me? disse Fiora um pouco triste. Pensava que tínhamos concluído um pacto? Mas, aparentemente, a minha sorte interessa-o menos do que a do Menino...

Menino?

É assim que o duque Carlos chama àquele cujas terras e coroa acaba de conquistar.

Podeis ter a certeza que não é nenhum menino. É um homem impressionante. Mas, não achais que é tempo de me dizerdes o que fizestes este tempo todo sem a vossa velha Léonarde?

O relato de Fiora foi mais longo. Fê-lo honestamente, sem concessões por si própria ou por pudor e, por vezes, Léonarde corou ao escutar, mas quando a história acabou a velha solteirona contentou-se em assoar-se vigorosamente, o que, nela, era sinal de grande emoção, e beijou Fiora na fronte.

Gostaria muito de vos ver esquecer tudo isso rapidamente, meu cordeirinho, mas parece-me difícil com este duque Carlos, que insiste em manter-vos aqui.

Ele disse a Campobasso que eu era uma refém.

Foi o que eu ouvi. Mas então, por que disse ele tão altivamente àquele insuportável Mortimer que o lugar da senhora de Selongey era perto dele? Até porque, se bem compreendi, vós acabais de renunciar a essa honra, ao pedir a anulação do vosso casamento?

É estranho, na realidade, mas eu não vos consigo explicar a pessoa do Temerário. Ninguém consegue, creio... talvez nem ele próprio!...

Chegada a noite, as duas mulheres, deixando os Marqueiz seguirem para a igreja de Saint-Epvre para ouvirem a missa da meia-noite, seguiram Battista Colonna que viera, em nome do duque Carlos, convidá-las para a missa na colegial de Saint-Georges.

Era a primeira vez, depois de Notre-Dame de Paris, que Fiora assistia a uma missa. Mas a sua paz com Deus estava feita, porque Ele permitira que Philippe não sucumbisse sob a espada de Campobasso e naquela igreja iluminada, que com os seus grandes braçados de azevinho e visco mais parecia uma floresta encantada, a jovem deixou-se embalar pelas vozes angélicas dos jovens cantores da Borgonha... Cintilante, com as suas mais belas jóias, o Temerário resplandecia no coro fabuloso de esplendor com um manto bordado a ouro e semeado de pedrarias. À sua volta, os seus oficiais, se bem que vestidos com os seus mais ricos trajes, passavam despercebidos...

Será permitido um homem nascido da mulher glorificar-se a si mesmo a este ponto? murmurou Léonarde.

Creio respondeu Fiora que ele considera tudo isto com a maior das naturalidades. Não é ele o grande duque do Ocidente e, a acreditar nos rumores, não poderá ser, dentro em breve, rei? Mas as festas desta noite não constituem, para ele, senão uma etapa. Battista disse-me que, daqui a pouco, vai pegar outra vez em armas para libertar as terras da duquesa de Sabóia e vingar-se dos suíços, que se apoderaram do seu condado de Ferrette e puseram o Franco Condado em maus lençóis...

Que vai ele fazer de nós, nesse caso? Pensa arrastar-nos consigo, como as rainhas da Antiguidade, que eram amarradas ao carro do vencedor?

Ninguém se separa de um refém e ele pretende que eu sou um. Aliás, penso que não será mais penoso para nós do que para os embaixadores estrangeiros que vedes junto dele e que devem segui-lo por toda a parte...

Alguns chh!” enérgicos lembraram às duas mulheres que uma igreja não era um local para conversar. Ambas se calaram e juntaram as suas vozes às dos fiéis que entoavam um cântico de Natal.

1 O Landgraviat da Alta-Alsácia

Passada a festa, tiveram de fazer face a um problema quando, no momento da partida, Mortimer lhes foi dizer adeus e reclamar Florent, que devia levar consigo: o duque não permitia que nenhum francês permanecesse no seu séquito. O rapaz chorou, pediu, suplicou, mas nada feito, até que o escocês lhe declarou com a sua voz tranquila:

Honram-vos muito ao tratar-vos como um homem. No fim de contas, talvez eu consiga obter do duque que deixe o miúdo choramingas que vós sois debaixo das saias das damas!

Foi remédio santo. Florent ficou muito pálido e foi arrumar as suas coisas. Quando regressou em silêncio para se despedir de Fiora e de Léonarde, lançou-lhes um olhar tão desesperado que a velha solteirona, após a partida do rapaz, exclamou:

Este Mortimer é maçador, mas, pelo menos, não está apaixonado por vós, contrariamente a muitos outros e vós nem imaginais como acho isso repousante...

CAPÍTULO XII

AS TROMPAS DA MORTE

Os turbilhões de neve varriam a passagem de Jougne, onde não se conseguia ver o caminho. Depois de deixarem Pontarlier e o poderoso castelo de Joux, onde sire d’Arbon, que o ocupava por conta do duque, recebera o seu senhor, entregando a sua cave e despensa à pilhagem, o vento levantara-se até se transformar em tempestade, enquanto o exército subia penosamente para a linha de cumeada entre o Ródano e o Reno.

O exército? De facto, era uma multidão, que se espalhava interminavelmente pela estrada jurassiana. Aquilo evocava o êxodo, porque, para além dos vinte mil homens sob o comando de diversos capitães, havia centenas de carroças transportando as tendas e os pavilhões de cerimónia, as tapeçarias, as arcas das jóias, os trajes sumptuosos, os manuscritos, as pratas, o dinheiro, o fabuloso tesouro que compunha a capela ducal, com as estátuas de ouro dos doze apóstolos, os relicários e objectos de culto preciosíssimos, sem contar com os padres e os cantores e, enfim, todo o aparato da Chancelaria, com os seus escrevinhadores e o seu chanceler Hugonet, móveis e muitas outras coisas... Tudo aquilo destinado a demonstrar, não apenas aos Suíços, mas também à Europa inteira que a autoridade, a força e organização borgonhesas eram sem rival no mundo. Aliás, no espírito do duque Carlos, aquela guerra que ia começar seria rápida e sem quarteclass="underline" uma simples expedição definitiva, destinada a estabelecer a sua definitiva autoridade.

No alto da passagem, com os pés na neve, o Temerário via desfilar aquele comboio imenso que o enchia de orgulho. Já não era o duque da Borgonha, era Aníbal atravessando os Alpes em pleno Inverno e pouco lhe importava que aquilo fosse o Jura! A sua única pena residia no facto de não possuir nenhum elefante...

Estava ali há duas horas, insensível à borrasca de neve e ao vento cortante, contemplando com avidez aquela afirmação de soberania traduzida em bandeiras, pendões e estandartes. Os que passavam por ele esforçavam-se em mantê-los bem erguidos e endireitar a espinha, apesar da tormenta. E, aparentemente, não fazia tenções de abandonar o lugar...

A seu lado, o seu irmão Antoine e, um pouco mais atrás, envoltos em cobertores até aos olhos, aqueles que estavam mais próximos dele desde que tinham saído de Nancy: o embaixador milanês Jean-Pierre Panigarola e, envolto num grande manto duplo de marta, os cabelos completamente escondidos por um enorme capuz de veludo cor de rubi, um jovem magro, que não era outro senão Fiora. Olivier de La Marche ficara em Salins, sofrendo de disenteria.

Na véspera do dia em que deveriam abandonar Nancy, no dia 10 de Janeiro, o Temerário chamara para junto de si a jovem, completamente curada do seu ferimento. Recebera-a a sós no seu gabinete de guerra, onde examinava um novo tipo de besta que um armeiro alemão lhe fizera chegar às mãos.

Donna Fiora disse ele sem se virar já sabeis, penso, que partimos amanhã para castigar os ladrões e invasores Suíços? Decidi que viajaríeis na companhia de messire Panigarola, embaixador de monsenhor o duque de Milão, que é um dos homens mais sábios e mais amáveis que me foi dado conhecer e como ele nunca está longe de mim, quer dizer que marcharemos em boa companhia.