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"Isto é sério."

"Porque diz isso?", quis saber Rebecca, intuindo uma ameaça escondida.

"Em primeiro lugar, repare no início do versículo:

«Combatam na causa de Deus.» No original do Alcorão em árabe, a palavra combate deve ler-se jibad. Isto é, pois, uma ordem divina para que se faça a jibad. A seguir vem esta expressão estranha:

«os que trocam a vida mundana pela outra». No original em árabe, a vida mundana é esta vida e a outra é a vida depois da morte, no Paraíso. Ou seja, com estas palavras Alá está a prometer o Paraíso aos muçulmanos que morram na jibad. Esta ideia é reforçada pela segunda parte do versículo: «A esses, que combatam na senda de Deus e sejam mortos ou vencedores, dar-lhes-emos uma enorme recompensa.» A recompensa para os que morrem é, como se percebe pela referência inicial à outra vida, o Paraíso."

"Então vamos lá a ver, como descodifica você esse versículo?"

"Trata-se de uma ordem de Alá aos crentes, dizendo-lhes que façam a jibad e prometendo o Paraíso aos shabid que morrerem", disse Tomás. "É

isso o que este versículo quer dizer."

Os homens do FBI, que se calaram para ouvir o historiador, abanaram a cabeça quase em uníssono.

"Eles acreditam mesmo nisso?", interrogou-se o chefe da equipa. "Que idiotas!"

Tomás releu mais uma vez o versículo, situando-o no contexto da operação que a Al-Qaeda tinha em curso.

"Isto é uma ordem operacional", sentenciou. "O

Fireball recebeu uma instrução para se preparar para o martírio e passar à acção."

"Que está para aí a dizer?"

Convicto de que tinha interpretado tudo o que havia a interpretar, o português fechou o Alcorão e encarou o responsável do Bureau.

"Prepare os seus homens." "Para quê?"

Sem perder mais tempo, Tomás pegou nas suas coisas, fez sinal a Rebecca de que o seguisse, abriu a porta da carrinha e saltou para a rua. Antes de desaparecer, porém, lançou da rua um derradeiro olhar para o homem do FBI.

"O atentado vai ser hoje." «* *

LVIII

O portão da casa abriu-se lentamente.

Crrrrrr.

"Standby."

Instantes depois de a voz do chefe operacional soar pela intercomunicação rádio do FBI, um Pontiac verde envelhecido emergiu no portão. Instalados nos assentos de trás do carro de Ted, Tomás e Rebecca viram os homens do Bureau disparar uma rajada de fotografias sobre a viatura em marcha.

"É ele", confirmou Ted, o olho colado à câmara com zoom. "O motherfucker está a sair."

Crrrrrr.

"Fireball em movimento. Sierra One, podes pegar nele?" Ted colou o microfone à boca e respondeu.

"Roger, Big Mother", confirmou. "Sierra One em movimento."

O Pontiac passou por eles e o carro de Ted, que tinha ligado a ignição logo após a ordem de standby, arrancou com

suavidade e pôs-se no encalço de Ahmed. Era uma parte muito delicada da operação, com vários automóveis do FBI já em marcha ou a aguardar a passagem do suspeito em diferentes pontos dos itinerários possíveis, numa espécie de coreografia improvisada.

Para evitar denunciar as suas intenções, a viatura onde Tomás se encontrava seguia Ahmed com alguma cautela, mantendo quase duzentos metros de distância.

Crrrrrr.

"Sierra Two", chamou o chefe da equipa.

"Ultrapassa o Fireball e faz uma verificação com o geiger."

"Roger, Big Mother. Sierra Two em movimento."

Um carro azul arrancou lá de trás, como se estivesse apressado, e ultrapassou a viatura onde Tomás se encontrava. Depois aproximou-se do Pontiac de Ahmed e ultrapassou-o também, mas sem muita pressa. A seguir virou à esquerda e desapareceu.

Crrrrrr.

"Sierra Two aqui. O geiger deu negativo."

"Tem a certeza, Sierra Two}"

"Roger, Big Mother. O geiger deu negativo."

Ted espreitou de relance pelo espelho retrovisor para os seus convidados da NEST.

"A medição não detectou nenhuma radioactividade no carro", disse. "O tipo não leva a bomba."

"E porque ela já deve estar posicionada", observou Rebecca, os dedos a tamborilarem pensativamente na janela do carro. "E estranho, não é?" Olhou para Tomás com a expressão de quem se sente baralhado.

"Por que motivo não fizeram eles explodir a bomba logo que a colocaram no sítio? Não faz sentido..."

"Talvez ela ainda não esteja instalada no alvo", disse Tomás. "Às tantas o Ahmed vai agora buscá-la."

"Só pode ser isso..."

Continuavam a seguir pelas ruas de New Jersey e a operação de vigilância decorria sem novidades. A certa altura o Pontiac aproximou-se de uma rotunda e Ted preparou-se para o problema.

Crrrrrr.

"Aproximamo-nos de Blue Three."

Blue Three era a rotunda. "Mantenha em Blue Three."

O Pontiac meteu-se na rotunda e Ted tentou acompanhado, mas o tráfego intensificou-se de repente, impedindo-o de avançar de imediato.

Percebeu que teria de ser outro automóvel a assumir a cauda do suspeito.

"Fuck!", praguejou Ted, dando uma palmada frustrada no volante. Sem se desconcentrar, seguiu com os olhos o movimento do carro verde que contornava a rotunda, ao mesmo tempo que, com um gesto

rápido,

pegava

no

microfone

da

intercomunicação rádio e se mantinha atento à saída da viatura suspeita. "Fireball na Blue Three." Viu-o virar à direita e sair da rotunda. "Tomou dois." O

Pontiac tinha tomado a segunda saída. "Tomou dois.

Quem pode?"

Uma nova voz respondeu.

"Sierra Five, tenho o Fireball."

Ao ouvir uma outra viatura assumir o controlo, Ted descontraiu-se e contornou tranquilamente a rotunda. Identificou a rota escolhida por Ahmed e, com um sorriso de satisfação, virou à direita e foi dar a uma rua paralela. Meteu por ela e acelerou, num esforço para assumir uma nova posição mais adiante.

"Onde vamos?", perguntou Tomás, sem perceber os pormenores da manobra.

"Vamos esperá-lo lá mais à frente."

"Lá à frente como? Vocês já conhecem o itinerário que ele vai seguir?"

"Considerando a estrada que ele tomou depois da rotunda, até já percebemos qual é o destino." "Ai sim?"

Ted apontou para a floresta de betão que se erguia do outro lado do rio, o topo dos arranha-céus iluminados ptlas aberturas soalheiras, as ruas mergulhadas na sombra.

"Manhattan."

A boca do Lincoln Tunnel ia engolindo tráfego como um monstro sôfrego. Dentro do carro do FBI o grupo permanecia em silêncio, acompanhando pelas intercomunicações a progressão do automóvel de Ahmed e à espera de ver o Pontiac verde aparecer a todo o momento da Route 495.

"Está atrasado", observou Tomás, impaciente.

Ninguém

respondeu.

Ted

manteve-se

tranquilamente a mastigar a sua chewing gum, os olhos colados ao trânsito ininterrupto.

"Se ele se dirige para Manhattan é porque a bomba já está posicionada", observou Rebecca. "Não faz sentido que ele vá a Manhattan buscar a bomba para a instalar noutro sítio qualquer. Não existe nas redondezas alvo com um perfil mais elevado do que Manhattan. O atentado tem de ser aqui."

"Tem razão", admitiu Tomás. "Mas se assim é, porque diabo não a rebentaram já? De que estão eles à espera?" A americana encolheu os ombros. "Beats me."

Ted mantinha a atenção fixa no tráfego e fez-lhes sinal de que se calassem. "Ali vem ele!"

Ligou a ignição e esperou que o carro verde se aproximasse. Quando Ahmed passou, arrancou e posicionou-se atrás, tendo o cuidado de manter uma viatura entre os dois, uma medida de precaução para se fazer menos notado.