interrogou-se
naquele
momento
desesperado. Onde parava Sam? Onde se encontrava Rebecca? Porque demoravam tanto a ir em seu socorro? Será que tinham problemas de comunicação semelhantes aos seus no início da operação? Será que não ouviam os insistentes apelos de Jarogniew nos auriculares? Se assim fosse, estava perdido.
Crrrrrr.
0
"Onde estás, Blackkawk? O que está a acontecer?"
Apercebendo-se de que a sua resistência chegava rapidamente ao fim, Tomás contorceu-se numa tentativa desesperada de se libertar, mas o desconhecido imobilizou-o com o braço esquerdo, como havia feito momentos antes a Zacarias, e, já com o braço direito livre, ergueu bem alto o punhal para esfaquear o historiador com toda a força.
Pab.
Pab.
O pulso do desconhecido perdeu energia. Tomás olhou para cima e viu o seu agressor de olhos vidrados e um buraco aberto na testa a expulsar matéria branca e sangue. O homem de negro estava muito hirto e inclinou-se devagar, como uma árvore a tombar, até cair no chão, evidentemente morto.
Deitado de costas e finalmente sem ninguém por cima dele, o historiador ergueu a cabeça e viu Sam com as duas mãos agarradas a uma pistola em riste, os olhos a dardejarem em todas as direcções em busca de ameaças potenciais, o fumo a flutuar diante do cano da arma.
"Você está bem?", perguntou Sam sem olhar para ele.
Tomás soergueu-se, assentando o corpo sobre um cotovelo, e massajou o peito dorido.
"Acho que o gajo me atingiu no peito", disse, avaliando ainda a reacção do corpo. "Mas tenho a impressão de que só me apanhou de raspão."
"Já vamos ver isso."
A atenção do português desviou-se da ferida que lhe sujava a camisa com sangue para o americano.
"Estava a ver que nunca mais aparecia ninguém!", resmungou. "Você não ouviu o seu amigo chamar pelo auricular?"
"Ouvi."
"Então porque raio levou tanto tempo?"
"Fui retido por outros capangas." Indicou com a cabeça o fim da rua, onde se encontravam dois vultos prostrados no chão. "Levei uns instantes a despachá-los."
Crrrrrr.
"Blackhawk! Qual é a situação?"
"Bluebird está okay", revelou Sam. "Charlie está down. Standby."
O historiador levantou-se devagar e, cambaleante, aproximou-se de Zacarias, que se encontrava deitado no chão, inanimado, ao lado de uma poça de sangue que aparentemente lhe saíra do pescoço. Mas já não havia sangue a jorrar. Tomás ajoelhou-se ao lado do antigo aluno e pousou-lhe dois dedos por baixo da orelha, tentando captar-lhe a pulsação.
Nada.
Experimentou-lhe o pulso, mas voltou a não sentir a pulsação.
"Então?", quis saber Sam.
Tomás abanou a cabeça com tristeza. Libertando uma mão, o americano ajoelhou-se também ao lado de Zacarias e experimentou-lhe a pulsação. Levou apenas um breve momento a tirar as suas próprias conclusões.
"Está morto."
Crrrrrr.
"Hello?" Agora era a voz de Rebecca. "O que se passa? Aconteceu alguma
"Houve um incidente", respondeu Sam. " Perdemos Charlie. Temos de sair daqui."
"Mas o que se passa? Como está o Tom?" A voz era frenética e destilava ansiedade. "Tom! Você está bem?"
"Estou bem."
"Shopgirl, saia da linha", ordenou Sam. "Temos de fugir
daqui."
,. #
Uma multidão aproximava-se agora do local, espreitando os corpos inertes de Zacarias e do desconhecido. Sam mostrava-se ansioso por abandonar aquelas paragens antes que a polícia chegasse e puxou Tomás pelo braço. O historiador tinha, no entanto, relutância em abandonar o cadáver do seu antigo aluno, e sacudiu a mão do americano.
"Oiça, temos mesmo de sair daqui!", argumentou Sam com sentido de urgência. "Ele está morto, não há nada que possamos fazer."
Tomás deitou um derradeiro olhar a Zacarias, como se se estivesse a despedir. Mirou-lhe os olhos vidrados, o pescoço dilacerado, a mão esticada com o indicador a arranhar o chão...
"Espere!"
Sam impacientou-se. "O que
é agora?"
Tomás voltou a abeirar-se do corpo e inclinou-se sobre a mão imóvel de Zacarias. "O que é isto aqui?"
O americano aproximou-se e espreitou para o local.
"O quê?"
Diante do dedo a terra parecia revolver-se em traços. Tomás girou a cabeça, tentando decifrar o desenho que pelos vistos Zacarias fizera no chão enquanto agonizava. Tinha de ser uma coisa importante, percebeu. Ninguém gastava os seus derradeiros instantes de vida a fazer um desenho irrelevante.
Girou mais uma vez a cabeça e fixou os traços. Não era um desenho, acabou por perceber. Eram letras.
"Use me?", interrogou-se Tomás. "O que raio quer isto dizer?"
"Ele pediu que o usasse", constatou Sam, traduzindo a frase.
O historiador fez uma careta intrigada e abanou a cabeça num gesto de incompreensão. "Isso não faz sentido nenhum!"
O som longínquo de uma sirene rasgou o ar e trouxe-os à realidade. Sam agarrou de imediato no braço de Tomás, dessa vez com a determinação de quem não admite mais hesitações, e puxou-o com força.
Let's go!
XXXVI
A figura que se materializou na rampa das chegadas do aeroporto de Lisboa atraiu os olhares de toda a gente. Era uma mulher coberta da cabeça aos pés por trajes islâmicos, uma imagem pouco comum na capital portuguesa.
Metido no meio daquela pequena multidão, Ahmed fixou a atenção na figura tímida e reconheceu-lhe os olhos.
"Adara!", chamou, erguendo o braço. "Adara! Por aqui!"
Foi recebê-la no final da rampa. Apesar de se terem visto com frequência na loja dos cachimbos de água, nunca haviam trocado mais do que breves palavras. Adara vinha adequadamente tapada, mas era evidente que se transformara numa mulher, o corpo mais largo e longo, os olhos ainda pérolas reluzentes, a face de um anjo.
A transbordar de felicidade, Ahmed levou-a para o seu novo apartamento no Monte de Caparica, para onde se mudara de modo a estar mais perto da faculdade, e deu-lhe
carneiro assado e arroz árabe, jantar que lhe havia sido preparado por Bina, a mulher de Faruk.
"Está bom?", perguntou ele, tentando fazer conversa.
Adara assentiu em silêncio.
"Sentes-te cansada?"
Ela voltou a acenar afirmativamente, os olhos sempre pousados na comida. A mulher não parecia faladora, o que desapontou Ahmed. Achava-a linda e queria-a alegre, mas ela parecia fechada como uma concha. O noivo encolheu os ombros, resignado. Em devido tempo ela desabrocharia, considerou.
Logo que terminaram a refeição instalou-se um certo aca-brunhamento entre eles. Ambos sabiam o que teria de acontecer a seguir, mas não era claro como chegariam a esse momento. Ahmed ponderou o assunto e optou por um caminho indirecto.
"Queres ver a casa?"
Adara levantou o olhar assustado; percebeu muito bem o sentido da pergunta. Ahmed interpretou o silêncio como consentimento implícito, a postura adequada de uma mulher modesta e recatada, e conduziu-a para o quarto. Havia uma grande cama de casal no meio e fez-lhe sinal de que se dirigisse a ela. Adara obedeceu e estendeu-se vestida na cama, o corpo hirto, os olhos a saltitarem de nervosismo.
O marido desligou a luz: e deitou-se ao lado dela.
Não sabia bem o que fazer em tais circunstâncias, uma vez que aqueles assuntos eram proibidos até nas conversas entre homens, mas tinha a ideia de que tudo se passava entre as pernas dela. Ganhou coragem e meteu-lhe desajeitadamente a mão pela parte de baixo do vestido, explorando-a até lhe detectar a abertura quente. Sentiu a erecção formar-se-lhe nas calças e despiu-se com um movimento rápido.