6 A Y-H A 5 1 H A S R.U
Tomás deslizou o indicador pelas múltiplas experiências que fizera, até se fixar na derradeira.
"Estão a ver isto?"
£ A«-Y -H-A S t i t i
t i
1-M A-8 R-U
"Seis Ayhas 1 Ha 8 Ru}", leu Bellamy. "O que diabo quer dizer isso?"
Tomás abanou a cabeça, mas deixou os lábios esboçarem um sorriso.
"Cortei a sequência original a meio e pus uma metade sobre a outra. A mensagem está em árabe, pelo que deve ser lida da direita para a esquerda e de cima para baixo, zigueza-gueando depois de baixo para cima, acompanhando o movimento destas setas que desenhei entre as letras e os números. E esse o itinerário."
"Não estou a perceber..."
"Já lhe mostro."
O historiador pegou numa caneta e rabiscou as letras na sequência sugerida pelo percurso que quebrava o segredo da cifra.
SUKAH S AYAH 16
"Vo/tá/"
Frank Bellamy fez uma careta. "O
que é isto?" "Surah 8 Ayah 16."
"Eu sei ler!", rosnou o americano. "Mas o que significa isto?"
"É a mensagem que a Al-Qaeda enviou para o seu operacional em Lisboa."
LII
"Sentem-se."
Só a rígida autodisciplina emocional desenvolvida no campo de Khaldan impediu Ibn Taymiyyah de deixar transparecer no rosto a decepção que sentiu ao ver o que lhe era oferecido para o jantar. Havia já alguns meses que não comia uma refeição decente, apenas feijão e pão, pelo que, ao perceber que iria visitar a base do xeque, não conseguira controlar o impulso salivante que lhe provocava a expectativa de uma refeição mais satisfatória. Se Bin Laden era assim tão poderoso, raciocinara, decerto que os seus repastos seriam lautos banquetes!
Agora que o momento havia chegado, o desapontamento quase lhe fazia doer o estômago.
Sobre a toalha suja da mesa estavam batatas mergulhadas em óleo, uma pequena omeleta, um queijo e uma cesta com pão afegão. Mais nada. Os quatro ocuparam os seus lugares e Bin Laden fez sinal ao convidado de que se servisse primeiro.
Escondendo o desencanto, Ibn Taymiyyah cortou um quarto da omeleta, o que dava uma porção minúscula, pôs algumas batatas gordurosas no prato, escolheu umas fatias de queijo e tirou um pão da cesta. Não era pior do que no campo de Khaldan, claro; porém, considerando as suas elevadas expectativas, o jantar constituía um duro revés.
Depois de todos se servirem, Ibn Taymiyyah decidiu começar pelo queijo; sempre tinha um ar mais decente. Mas logo que o começou a mastigar apercebeu-se de que era muito salgado. Para disfarçar o sabor, trincou o pão e logo os dentes se puseram a ranger. Arregalou os olhos, atónito: havia areia no pão!
"Então?", perguntou Al-Zawahiri, que detectara a reacção. "Está bom?"
"Hmm-hmm", assentiu o convidado, corando de embaraço por ter deixado transparecer o que realmente pensava do jantar. "Muito bom."
"Um koshari caía. agora bem, não?", sorriu com uma simplicidade cúmplice.
Ibn Taymiyyah devolveu o sorriso. Lembrou-se de que Al-Zawahiri era egípcio, como ele, pelo que a referência aos pratos do seu país constituía um laço invisível que os unia.
"Isso", concordou o convidado. "Ou uma molokhiyya."
Bin Laden não parecia ser homem para comer muito, constatou ao passar os olhos pelos seus parceiros de mesa. Aliás, isso nem admirava, considerando quão magro ele era. O xeque engoliu as batatas gordurosas como se fossem caviar, comeu um pouco de pão com queijo, bebeu água e pareceu dar-se por satisfeito.
"Meu irmão", disse, enquanto mastigava os últimos pedaços de pão. "Deixa-me explicar-te a missão para a qual te convidámos. Calculo que te interrogues sobre os motivos que nos levaram a chamar-te aqui ao Ninho da Águia..."
Ibn Taymiyyah engoliu depressa a sua fatia de omeleta para poder responder.
"Pois... enfim, confesso que fiquei realmente um pouco surpreendido quando o Abu Omar me deu a notícia..."
O xeque afastou o seu prato para o lado, dando sinal de que a conversa entrava na fase realmente importante.
"O meu convite", disse devagar, medindo as palavras, "est¿í, como já te expliquei, relacionado com a grande jihad que se avizinha."
Ibn Taymiyyah ficou calado um instante até perceber que Bin Laden aguardava dele um sinal de aceitação ou rejeição, como se disso dependesse a continuação da conversa.
"Xeque, os seus desejos são ordens para mim", declarou com solenidade. "Diga-me o que eu tenho a fazer e eu fá-lo-ei."
Ao ouvir isto, Bin Laden olhou-o com tal intensidade que o convidado teve a impressão de que lhe via a alma.
"Estás disposto a tudo?"
"Aos maiores sacrifícios."
O xeque inclinou-se na direcção do seu convidado.
"Mesmo a tornares-te um sbakid}"
A
referência
ao
martírio
chocou
momentaneamente Ibn Taymiyyah. Então era disso o que se tratava! O xeque queria recrutá-lo para uma missão suicida! O xeque queria fazer dele um sbahid!
Por Alá, isso era... era... era um orgulho!
"Seria para mim uma honra sem igual morrer ao serviço de Alá", proclamou, quase comovido. "O
martírio em nome de Deus é o meu maior desejo e se Alá, na Sua infinita graça e generosidade, me conceder uma tal oportunidade, podeis estar certo de que não O decepcionarei."
"Sabes que te espera o Paraíso", afirmou Bin Laden com suavidade. "O Profeta, que a paz esteja com ele, numa ocasião em que enfrentava o inimigo disse: «As portas do Paraíso
estão sob a sombra das espadas.» Um homem que o ouviu ergueu-se, despediu-se dos amigos, lançou-se contra o inimigo e combateu-o até morrer. O homem sabia que não iria sair vivo, daí que se tenha despedido. Este baditb prova, para lá de qualquer dúvida, que o apóstolo de Deus defendia o ataque-suicida, desde que fosse para bem do islão, prometendo o Paraíso a quem o fizesse. O Profeta, que a paz esteja com ele, esclareceu num outro baditb: «O sbabid possui seis características para Alá: ele é perdoado, entre os primeiros a serem perdoados; ser-lhe-á mostrado o seu lugar no Paraíso; não será punido no túmulo; está a salvo do supremo terror do dia do julgamento; a coroa da dignidade será colocada na sua cabeça; casará com setenta e duas mulheres no céu; e poderá interceder por setenta dos seus familiares». Assim sendo, como não aproveitar esta magnífica oportunidade de ir para o jardim eterno? Como ignorar que o sbabid tem setenta e duas mulheres à sua espera no Paraíso?" "Eu sei, xeque."
Nesse instante, Ibn Taymiyyah não pôde deixar de se lembrar do mudjabedin palestiniano que conhecera em Khaldan e que sonhava com as setenta e duas virgens que o aguardavam no Paraíso.
"O próprio Alá o diz na sura 4, versículo 74 do Santo Alcorão", retomou Bin Laden. "«Combatam na causa de Deus os que trocam a vida mundana pela outra! A esses, que combatam na senda de Deus e sejam mortos ou vencedores, dar--lhes-emos uma enorme recompensa». A recompensa é, como todos sabem, o Paraíso. Já na sura 9, versículos 88 e 89, Alá o esclarece: «O Enviado e os que com ele crêem combatem com as suas riquezas e as suas pessoas.
Esses terão os bens e esses serão os bem-aventurados. Deus preparou-lhes jardins por onde correm rios. Neles viverão eternamente.» A importância da jihad é tal que o Profeta explicou certa vez: «Permanecer uma hora nas fileiras de combate no caminho de Alá é melhor do que rezar durante sessenta anos.»"