Выбрать главу

— O poema de morte delas é o seguinte:

Do nada ao nada,

Um cadáver é um cadáver,

E nada mais —

O meu, o seu, até o delas,

Será que existiram? Nós existimos?

Dali por diante, a toda velocidade, até alcançarem o castelo. Mas nem ali houvera descanso, o castelo, Iedo e todo Kwanto em polvorosa pelos preparativos dos gai-jin para a guerra... precipitada pelo ultimato do tairo, como Yoshi esperava

— Era inevitável — declarara Yoshi, na reunião dos anciãos que convocara de imediato, acrescentando, para proporcionar a Anjo um meio de se livrar da situação: — Você foi mal aconselhado... afaste o idiota que fez a sugestão e elaborou a carta.

— Foi ordem do imperador e do xógum, para que todos os gai-jin fossem expulsos — protestara Anjo, furioso.

— Ordem? O xogunato é que ordena, não um menino menor de idade, que repete as palavras que o xogunato lhe diz... nem o imperador, que só pode nos solicitar para fazer alguma coisa!

— Como tairo, considerei que o ultimato era necessário.

— E pergunto de novo, o que propõe fazer quando a esquadra chegar aqui?

— Isso não vai acontecer, porque atacaremos primeiro — respondera Anjo, para depois estremecer com uma pontada de dor, comprimindo seu flanco. — Já os cerquei; Iocoama é como um peixe morto esperando para ser estripado. A força de ataque está quase pronta.

— E a esquadra dos gai-jin?

A ira de Yoshi era intensa por seu conselho ter sido mais uma vez descartado e por se meterem, de novo, numa armadilha que eles próprios haviam criado. Não adiantava recordar a Anjo e aos outros o plano que ele projetara de forma tão meticulosa, ganhando tempo para novas táticas protelatórias contra os gai-jin, enquanto o xogunato aumentava sua força e cuidava do problema mais específico e premente de destruir a coalizão hostil de Tosa, Choshu e Satsuma, que acabaria por derrubá-los, se permitissem que vicejasse.

— Primeiro, surpreendemos Iocoama, incendiamos tudo, como sugeri há meses — dissera Toyama, tremendo de excitamento. — Vamos queimá-los!

— E como afundaria a esquadra? — indagara Yoshi, desdenhoso.

Ele notara a dor de Anjo, e sentia-se contente por isso, recordando seu acordo com Ogama de Choshu, que deveria ser confirmado depressa, a fim de manter o inimigo desconcertado e neutralizado. Toyama dissera, veemente:

— Os deuses afundarão seus navios, Yoshi-dono, como fizeram contra Kublai Khan e seus mongóis. Esta é a terra dos deuses e eles não vão nos abandonar.

— E caso os deuses estejam ausentes ou dormindo — acrescentara Anjo — mandaremos nossos brulotes... tenho centenas já em construção, centenas. Se o inimigo passar por essa barreira para bombardear Iedo, só camponeses, mercadores, artífices e parasitas morrerão. Nossas legiões continuarão intactas.

— Isso mesmo, ficarão intactas — concordara Toyama, exultante.

Anjo continuou:

— Depois que Iocoama cair, a esquadra dos gai-jin deverá partir, porque não terá mais uma base aqui para se reagrupar. Seguirá para as colônias na China, por falta de uma posição segura aqui. Se eles voltarem, nós...

— Quando eles voltarem — corrigira Yoshi.

— Está certo, Yoshi-dono, quando eles voltarem, com mais navios, vamos afundá-los no estreito de Shimonoseki, Ogama cuidará disso ou, a essa altura, já teremos mais canhões, mais brulotes, e nunca permitiremos que desembarquem, nunca mais deixaremos que instalem outra base aqui. Não haverá mais tratados para protegê-los! Absolutamente nenhum! Fecharemos nossa terra, como antes. É isso o que planejo. — A expressão de Anjo era triunfante. — Rasguei os tratados, como quer o imperador!

— Você é divino, tairo, os deuses nos protegerão com um vento divino! — exclamara Zukumura, rindo, a saliva escorrendo pelo queixo.

— Os deuses não nos protegerão das granadas dos gai-jin, nem os brulotes — garantira Yoshi. — Se perdermos Iedo, perderemos a nossa cidadela de xogunato, e depois todos os daimios da terra se juntarão contra nós para partilharem os despojos... liderados por Ogama de Choshu, Sanjiro de Satsuma e Yodo de Tosa. Sem Iedo, nosso xogunato está liquidado. Por que não podem compreender isso?

Anjo se contorcera sob outra pontada de dor, e explodira:

— Compreendo muito bem que você pensa que é o lorde da terra e a dádiva dos deuses ao Nipão, mas acontece que não é, não é mesmo, está sob as minhas ordens, sob o meu comando. O tairo SOU EU!

— Você é o tairo, e... mas por que essa dor? — indagara Yoshi, simulando preocupação, como se tivesse acabado de notar, com a intenção de interromper a confrontação. — Há quanto tempo sente essa dor? O que diz o doutor?

— O que diz? Ele... — Anjo tomou outro gole do amargo extrato de ervas. O medicamento quase não atenuava a dor. Vinha se agravando e o novo doutor chinês se mostrava tão inútil quanto os outros, a tal ponto que ele até passara a considerar a possibilidade de um exame secreto pelo famoso doutor gigante gai-jin de Kanagawa. — Não importa minha dor. Eu conheço você.

Yoshi percebera o ódio de Anjo e sabia que o ódio era causado por sua juventude e força... e o idiota nem imagina como estou cansado da vida.

— Posso...

— Você não pode fazer nada! Atacaremos quando eu ordenar e chega de conversa! A reunião está encerrada!

Anjo saíra, mais furioso do que nunca. Agora que era o tairo, Anjo reinava autoritário, e tratava todos os outros com um profundo desdém.

Num acesso de raiva, Yoshi vagueara pelo castelo como um tigre enjaulado. Depois daquele primeiro dia terrível, relegara Koiko para um compartimento isolado e o trancara com firmeza. Mesmo assim, ela o espiava lá de dentro de vez guando, sorrindo. Irritado, ele a empurrava de volta... agora não havia como saber se Koiko se adiantara para salvar sua vida, como Abeh lhe assegurara, não havia como descobrir por que ela empregara uma assassina shishi, Sumomo Fujahit a um nome falso, sem dúvida, mas com certeza uma acólita de Katsumata.

E onde se encontra Katsumata agora?

Ele já dera ordens para que o descobrissem, onde quer que estivesse, oferecera vultosa recompensa por sua cabeça. Também ordenara a caçada e destruição de todos os shishi e seus protetores. Depois, mandara chamar Ineijn seu maior espião. O velho entrara claudicando, fizera uma reverência.

— Parece, Sire, que os deuses o protegeram como se fosse um dos seus.

— Permitindo que uma assassina shishi, armada com um shuriken, entrasse no santuário interior de minha cortesã, permitindo que minha cortesã se tornasse uma traidora, parte da conspiração?