— Compreendo isso, mas neste caso, sinto muito, não é possível. — Sentado agora no mesmo nível dos outros homens, a exceção de Babcott, Yoshi sentia-se mais à vontade. — Garanto o salvo-conduto.
Sir William fingiu franzir o rosto em preocupação.
— O que me diz, George?
Já haviam discutido essa possibilidade.
— Eu concordaria em ir sozinho, Sir William. Um dos meus assistentes me contou que circulam rumores que o tairo está doente. Pode ser ele.
— Se você pudesse curar aquele patife... ou envenená-lo... não sei qual das duas coisas é melhor. Estou brincando, é claro.
— Não é um risco, não para mim. Só sou valioso vivo e não sirvo como refém. E curar uma pessoa muito importante seria ótimo para nós.
— Concordo. Tocaremos de ouvido. Por falar nisso, soube que Angelique o procurou ontem.
— Parece que toda a colônia já soube. É o oitavo que me fala a respeito. Ela tinha um resfriado, você está resfriado, todo mundo tem um resfriado com este tempo... e mesmo que tivesse me consultado por qualquer outro motivo, é e sempre seria confidencial. Portanto, desista.
Sir William sorriu para si mesmo, ao recordar como fungara, e protestara que não queria saber de questões particulares, como uma possível gravidez. Não faltavam muitos dias agora, e a colônia toda se encontrava nervosa, ninguém disposto a apostar muito dinheiro em qual seria o “Dia G” ou se não haveria nenhum... e menos de cinco dias para chegar o primeiro despacho de Hong Kong sobre Malcolm, o funeral, e o que Tess Struan tencionava fazer.
Sir William forçou sua mente a voltar às questões imediatas. Babcott estava dizendo a Yoshi, num japonês titubeante:
— Sim, ir Iedo, lorde Yoshi. Quando ir, por favor?
Yoshi respondeu, a voz pausada:
— Quando eu partir, doutor-sama. Obrigado. Sou responsável por você. Garantirei sua volta são e salvo. Precisará de um intérprete, não é?
— Sim, por favor, lorde Yoshi — respondeu Babcott, sem precisar. Ele olhou para Tyrer. — Você é o escolhido, Phillip.
Tyrer sorriu.
— Eu ia me oferecer como voluntário.
— Pergunte a ele por quanto tempo ficarei lá.
— Ele diz que o tempo necessário para fazer um exame.
— Então isso está acertado — interveio Sir William
— Vou deixá-los agora. Tenho uma clínica para cuidar; saberão onde me encontrar, se precisarem de mais alguma coisa.
Babcott fez uma reverência para Yoshi, que retribuiu. O médico se retirou. Escolhendo suas palavras com todo cuidado, tentando falar da maneira mais simples possível, Yoshi continuou:
— Os carregadores lá fora trouxeram caixas com moedas de prata, no valor de cem mil libras. O dinheiro é oferecido pelo xogunato como aceito total da indenização que vocês exigiram do daimio responsável. Em princípio, o xogunato considera que é essa a quantia correta. — Ele escondeu sua diversão pelo choque de Tyrer e André. — Traduza exatamente o que eu disse.
Tyrer tornou a obedecer, não exatamente palavra por palavra desta vez, mas fez um relato verossímil, ajudado aqui e ali por André. Houve um silêncio aturdido na sala.
— Sire — murmurou Tyrer —, meu superior pergunta se ele responder agora ou Yoshi-sama dizer mais?
— Mais. O xogunato adianta esse dinheiro por conta de Sanjiro de Satsuma. Ele é o único responsável. Como já expliquei antes, ele não está sujeito ao controle do xogunato... em todas as coisas. Traduza.
O que foi feito de novo. Ele viu que os dois líderes ficaram desconcertados, como previra. O que era satisfatório, mas não dissipava sua ansiedade.
— Não podemos obrigar Sanjiro de Satsuma a cancelar quaisquer ordens que ele possa ou não ter dado a seus homens sobre os gai-jin... nem mesmo a pedir desculpas... ou forçá-lo a nos reembolsar o dinheiro que estamos adiantando para resolver esse problema, sem desfechar uma guerra contra ele. Não estamos preparados para isto.
A tradução exigiu tempo para ser acurada, outra vez com a ajuda de André, consciente da tensão, e da maneira como todos se concentravam.
— Sire?
— Diga isso com precisão e cuidado: querendo ter amizade com os ing’erish e os furansu, o xogunato resolveu o que o xogunato pode resolver... sem entrarem guerra.
Yoshi inclinou-se para trás, especulando se a isca seria bastante suculenta. Seus últimos comentários foram recebidos em silêncio. Ele notou que Sir William mantinha-se impassível agora, exceto por um grunhido quase inaudível. Mas Seratard balançou a cabeça e olhou para André.
Exultante por dentro, Sir William esperou que Yoshi continuasse. Como isso não acontecesse, ele disse:
— Phillip, pergunte a lorde Yoshi se ele quer continuar ou se posso responder agora.
— Ele diz que não deseja continuar, no momento.
Sir William limpou a garganta e falou com altivez... para consternação de Tyrer:
— Lorde Yoshi, em nome do governo de sua majestade e do governo francês, permita que eu lhe agradeça e ao xogunato pela solução de parte do problema entre nós. Agradecemos pessoalmente, desejando tornar nossa presença aqui feliz e lucrativa para seu país, o xogunato e nós mesmos. Este gesto, sem dúvida, inicia uma nova era de compreensão entre nossos países... e os outros representados no Japão.
Ele esperou enquanto sua declaração era traduzida, com Tyrer e André se desculpando e suplicando a indulgência de Yoshi, pondo a mensagem em termos mais simples, embora da forma mais acurada possível. Quando eles acabaram, Sir William acrescentou:
— Com a permissão dele, eu gostaria de fazer uma pequena pausa. Phillip, ou André, peçam a ele que me desculpe, tudo isso, e expliquem que minha bexiga precisa ser aliviada. É meu resfriado.
Os dois intérpretes apressaram-se em traduzir.
— Claro — respondeu Yoshi, no mesmo instante, mas sem acreditar.
Sir William levantou-se, e Seratard também pediu licença para se retirar. No corredor, a caminho do banheiro, que nenhum dos dois precisava, Sir William sussurrou, excitado:
— Por Deus, Henri, você o interpretou como eu? Ele está dizendo que nós mesmos podemos ajustar as contas com Sanjiro!
Seratard também se sentia exultante.
— É uma inversão completa da política deles, de que tudo deve passar pelo Bakufu e xogunato. Mon Dieu, ele está nos dando carta branca?
— Pas ce crétin — disse Sir William, passando a falar em francês, sem percebê-lo. — Se podemos ir para cima de Sanjiro, é um precedente para atacarmos qualquer outro daimio... como o patife do estreito de Shimonoseki. Mas qual é a compensação que o demônio vai querer, hem?
Ele assoou o nariz, ruidoso, antes de acrescentar: