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— Enquanto eu for guardião, haverei de defendê-lo e protegê-lo, Sire. — Yoshi olhou para a moça, tão frágil e delicada, por fora. — E à sua família.

Ela não fitou os seus olhos. Nem precisava. Ambos sabiam que a guerra fora declarada.

— Ficamos contentes por sua proteção, Toranaga-sama.

— Eu não estou! — gritou Nobusada, a voz estridente. — Você era meu rival. Agora não é nada! Dentro de dois anos, completarei dezoito anos, passarei a reinar sozinho, e você...

Ele apontou um dedo trêmulo para o rosto impassível de Yoshi, deixando todos estarrecidos... menos a moça.

— A menos que você aprenda a obedecer, eu... vou bani-lo para a Ilha do fiorte, para sempre! E nós vamos para Quioto!

Nobusada virou-se abruptamente. Um dos guardas se apressou em abrir a porta. Todos fizeram uma reverência, enquanto ele saía, apressado. A esposa saiu atrás, depois os outros. Assim que ficaram a sós outra vez, Anjo removeu o suor do pescoço.

— Ela... ela é a fonte de toda a agitação dele... do seu “brilho” — comentou ele, amargurado.— Desde que chegou aqui que o jovem tolo vem se comportando com mais estupidez do que o normal, e não porque esteja cego de tanto fornicar.

Yoshi disfarçou seu espanto por Anjo ter feito em voz alta um comentário tão óbvio, embora perigoso.

— Chá?

Anjo acenou com a cabeça, distraído, outra vez com inveja da força e elegância de Yoshi. Nobusada não é tão tolo assim em algumas coisas, refletiu ele. Concordo em relação a você; quanto mais cedo for afastado, melhor, você e Sanjiro, os dois são problemas. O conselho seria capaz de votar para restringir seus poderes como guardião ou mesmo bani-lo? É verdade que você leva à loucura aquele tolo rapaz cada vez que se encontram... e a moça também. Se não fosse por você, eu poderia controlar aquela cadela, sendo ou não meia-irmã do imperador. E pensar que não apenas fui a favor do casamento, mas também executei o estratagema do Tairo Li, apesar da oposição do próprio imperador à união. Não recusamos sua primeira e relutante oferta, a filha de trinta anos, e depois a filha de um ano, até que ele acabou concordando, sob pressão, em entregar a meia-irmã?

Claro que a ligação de Nobusada com a família imperial nos fortalece, contra Sanjiro e os lordes de fora, contra Yoshi e os que queriam que ele fosse designado xógum. E a ligação será todo-poderosa depois que ela tiver um filho... o que vai abrandá-la, drenar seu veneno. A gravidez já está atrasada. O médico do rapaz vai aumentar a dose de ginsengue, ou dar algumas pílulas especiais para aumentar seu desempenho, pois é terrível ser tão flácido na sua idade. Isso mesmo, quanto mais cedo ela estiver esperando uma criança, melhor. Ele terminou de tomar o chá. — Eu o verei na reunião amanhã.

Os dois fizeram uma reverência superficial. Yoshi saiu e foi para as ameias, Precisando de ar fresco e tempo para pensar. Podia avistar lá embaixo as fortificações de pedra, com três círculos de fossos, as defesas inexpugnáveis, pontes levadiças, muralhas monstruosas. Dentro do castelo, havia alojamentos para cinqüenta mil samurais e dez mil cavalos, além de aposentos espaçosos e palácios Para os eleitos, as famílias leais — mas apenas as famílias do clã Toranaga dentro do fosso interno — e jardins por toda parte. Na torre central, por cima e abaixo dele, ficavam as áreas mais seguras, um santuário interior do xógum reinante, sua família, cortesãos e servidores. E as salas do tesouro. Como guardião, Yoshi residia ali, indesejável, marginalizado, mas também seguro, com seus próprios guardas.

Além do fosso externo, ficava o primeiro círculo protetor dos palácios dos daimios. Eram residências enormes, suntuosas. Vinham em seguida círculos de residências cada vez menores, uma para cada daimio da terra. Todas haviam sido localizadas pessoalmente pelo xógum Toranaga, e construídas de acordo com a lei nova que ele promulgara, de sankin-kotai, residência alternativa.

— A sankin-kotai exige que todos os daimios construam imediatamente — dissera Toranaga — e mantenham para sempre uma “residência adequada” sob as muralhas do meu castelo, nas posições exatas que determinei, onde devem viver com suas famílias e uns poucos servidores. Cada palácio deve ser suntuoso, e sem defesas. Um ano em três, o daimio terá permissão, e será obrigado, a retornar a seu feudo e ali ficar com seus servidores, mas sem a esposa, consortes, mãe, pai ou filhos, ou filhos dos filhos, ou quaisquer membros da família imediata... a ordem em que os daimios partem ou permanecem também será regulada de forma precisa, de acordo com a seguinte lista e escala...

A palavra “refém” nunca fora mencionada, embora fosse um costume antigo a permanência de reféns, ordenados ou oferecidos, como uma garantia de obediência. O próprio Toranaga fora refém, quando criança, do ditador Goroda; sua própria família fora refém do sucessor de Goroda, Nakamura, seu aliado e suserano; e ele, o último e maior de todos, decidira apenas ampliar o costume, na sankin-kotai, para manter os outros sob o seu domínio.

“Ao mesmo tempo”, escrevera Toranaga em seu legado, um documento particular a que só tinham acesso uns poucos descendentes seletos, “os xóguns subsequentes devem encorajar todos os daimios a construir com extravagância, viver no luxo, se vestir com opulência e receber de maneira suntuosa, o meio mais rápido de despojá-los da receita anual de koku de seus feudos, que pertence apenas ao daimio envolvido, pelo costume imutável. Assim, todos estarão em breve crivados de dívidas, cada vez mais dependentes de nós e também, o que é ainda mais importante, sem dentes, enquanto continuamos a ser parcimoniosos, e nos abstemos de extravagâncias.

“Ainda assim, alguns feudos — Satsuma, Mori, Tosa, Kii, por exemplo — são tão ricos que terão, mesmo com essas extravagâncias, um excedente perigoso. Por isso, de vez em quando, o xógum reinante convidará o daimio a presenteá-lo com umas poucas léguas de uma nova estrada ou um palácio ou um jardim ou um centro de prazeres ou um templo, em quantidades, períodos e freqüências que serão fixados no documento seguinte...”

— Muito esperto e previdente — murmurou Yoshi para si mesmo. Cada daimio num mar de seda, impotente para se rebelar. Mas tudo arruinado pela estupidez de Anjo.

O primeiro dos “pedidos” do imperador que Sanjiro levara ao conselho — antes que Yoshi se tornasse um membro — fora o de abolir esse costume antigo. Os daimios e os outros tergiversaram, argumentaram, mas acabaram concordando. Quase que da noite para o dia, os círculos de palácios foram esvaziados de todas as esposas, consortes, filhos, parentes e guerreiros. Com o passar do tempo, tornaram-se uma terra de ninguém, com apenas uns poucos servidores simbólicos.

Nosso meio de repressão mais importante desapareceu para sempre, pensou Yoshi, amargurado. Como Anjo pode ter sido tão inepto?