— Albert é um bom sujeito, não acha? — murmurou ele, distraído. — Eu disse que poderíamos nos atrasar um pouco.
Se dependesse dele, não iria ao clube, apenas pediria a um dos escriturários que lhe fizesse um sanduíche ou encomendasse um pouco da comida chinesa que os dois mandavam vir todos os dias da cidade dos bêbados. Meia hora depois, Jamie largou a pena e disse, joviaclass="underline"
— Vamos?
— Hum, hum...
— Qual é o problema?
— É que eu esperava que pudéssemos almoçar a sós, pois temos muito o que conversar... obviamente, não houve tempo ontem à noite. Foi uma bela festa, não é?
— Foi, sim. Os dançarinos cossacos eram espetaculares. E teremos muito tempo para conversar. Desculpe, mas achei que não era importante.
— Angelique também foi espetacular, assim como muitos de seus amigos, entre os quais Marlowe e Pallidar!
Maureen riu, descontraída. Aliviado, ele baixou a guarda, pegou o chapéu e o casaco, abriu a porta.
— Fico contente que tenha gostado.
— Você saiu ontem à noite, depois que nos despedimos.
Jamie tornou a levantar a guarda, baixo demais para evitar o rubor de culpa
— Ahn... é verdade.
— Bati na sua porta, mas não houve resposta... queria apenas conversar, não me sentia cansada. Você disse que estava cansado.
— E estava mesmo, mas depois o cansaço desapareceu. Vamos embora?
— Claro. Estou com fome.
Saíram para o passeio. Não havia muitas pessoas ali. O dia não era dos melhores, o mar encapelado, o vento forte.
— Não é tão ruim quanto Glasgow nesta época do ano — comentou Maureen alegre, passando o braço pelo dele.
— Tem razão. O frio não vai durar. Muito em breve chegará uma das melhores épocas do ano. A primavera e o outono são maravilhosos aqui.
Ele respirava melhor, agora que o assunto ficara para trás. Mas Maureen indagou, sempre joviaclass="underline"
— Você foi à Yoshiwara?
Um alfinete de gelo saltou de seus testículos para o coração e voltou. Mil respostas afloraram, a melhor das quais era: se eu quiser ir à Yoshiwara, por Deus, irei quando me aprouver. Não somos casados e mesmo que eu fosse... e lhe diria que não queria casar, pelo menos ainda não, não agora que o novo negócio tem possibilidades. Confiante, Jamie abriu a boca para dizer tudo isso, mas por alguma razão a voz saiu estrangulada e hesitante:
— Eu... hum... fui, sim, mas...
— Divertiu-se?
— Escute, Maureen, há algumas coisas...
— Já sei sobre a Yoshiwara, meu caro, e sobre os homens — disse ela, gentilmente. — Divertiu-se?
Jamie parou, abalado pela voz gentil e o comportamento afáveclass="underline"
— Hum... acho que sim... mas deve compreender, Mau...
— Faz frio demais para a gente parar, Jamie. — Ela tornou a pegar o braço dele, forçou-o a continuar a andar. — Muito bem, você se divertiu. Por que não me contou? E por que inventar a mentira de que se sentia cansado?
— Porque... — Outra vez uma dúzia de respostas, mas sua boca emitiu apenas: — Porque é óbvio. Eu não queria...
Jamie não podia dizer: Eu não queria magoá-la, porque tinha um encontro marcado, queria me encontrar com Nemi, mas ao mesmo tempo não queria, também não queria que você soubesse dela, e a verdade é que me senti horrível.
Quando entrara na pequena casa, encontrara Nemi vestindo o seu melhor quimono de dormir, o santuário dos dois impecável, comidas e saquê à espera, ela rindo e feliz, muito atenciosa.
— Ei, Jamie-san, bom ver você! Ouvir boa notícia do barco. Você casar dama da Scut’rand, hem?
Ele ficara Atônito pela rapidez com que a notícia circulara.
— Como soube?
— Toda Yoshiwara saber! Importante, neh? — Nemi se mostrava esfuziante. Dois dias eu ir Casa Grande conhecer breve oku-san.
— HEM?
— Importante, Jami-san. Quando casamento? Importante, para oku-san, nee goh-san amiga, neh?
— Você ficou doida? — explodira ele.
Nemi não entendera.
— Doida, Jami-san? Oku-san pagar agora. Oku-san pagar, Jami-san, Iyé? Importante oku-san nee...
— Não é assim que as coisas são feitas, pelo amor de Deus!
— Não compreender... importante Nemi ir oku-san...
— Você está doida!
— Não compreender...
Ela se mostrara assustada com a atitude belicosa de Jamie e concluíra que a fuga era a melhor defesa para aquele comportamento incrível... mas a fuga em lágrimas, é claro.
Nemi saíra antes que ele pudesse detê-la, a mama-san não conseguira convencê-la a voltar e por isso, furioso, ele fora para casa e quase não dormira. Deus Todo-Poderoso, Nemi indo ao prédio da Struan para se encontrar com Maureen? E Maureen pagando a Nemi no futuro? Importante amante e esposa serem boas amigas? Deus do céu! Devo ter entendido mal.
Não, seu idiota, não entendeu errado. Foi isso mesmo o que ela disse.
Acabara indo para o escritório. Antes do amanhecer. Pensara no caso durante toda a manhã e descobria agora que tinha duas mulheres para enfrentar.
— Escute, Maureen, desculpe ter mentido — balbuciou ele. — Mas... não sei o que mais dizer.
— Não se preocupe, pois essas coisas acontecem.
Maureen sorriu.
— Hem? Não está aporrinha... desculpe, não está zangada?
— Não, meu caro, não desta vez... não até termos uma conversinha.
Não havia ameaça na voz ou atitude de Maureen, pelo menos que ele pudesse perceber, e ela continuava a segurar seu braço com a maior ternura; mesmo assim, todo o seu ser interior bradava perigo, pelo amor de Deus, controle a língua, não diga nada.
— Conversinha? — ele se ouviu indagar.
— Isso mesmo.
Houve um silêncio ensurdecedor, apesar do barulho do vento nos telhados e calhas, os sinos de igreja, os apitos dos navios no porto, os cachorros latindo. Controle a língua, dois podem entrar nessa negociação, Jamie advertiu a si mesmo.
— E o que isso significa?
Maureen tateava o caminho com cuidado, gostando do aprendizado — e do ensinamento — do processo. Era apenas a primeira de uma sucessão intermináve1 de confrontações.
— Todos os homens são horríveis, Maureen — declarara sua mãe, em outros conselhos. — Alguns são piores do que outros, mas todos são mentirosos embora uma esposa esperta sempre seja capaz de perceber as mentiras de seu homem. No começo, os maridos são doces, deixam a mulher nas nuvens, com seu amor e carinhos, pequenas gentilezas. No começo. Depois chegam as crianças é preciso cuidar da casa, a maioria sempre sem dinheiro suficiente. A esta altura você se sente propensa a se largar, nas roupas, nos cabelos, na sua pessoa. É muito difícil, com as crianças, a falta de sono, um cansaço mortal. Não demora muito para que seu homem vire as costas na cama, desate a roncar... o que não é tão incômodo assim, se você aprende a fechar os ouvidos. E depois eles passam a procurar outras mulheres... mas não se preocupe, é uma coisa temporária, não dura muito, e se você for uma esposa esperta, o homem sempre volta, pois você sempre tem as crianças e tem Deus. Lembre-se de que não é fácil ganhar o pão de cada dia, como ele deve se lembrar também que não é fácil criar as crianças e manter a casa em ordem. Só que eles nunca se lembram disso. Seu pai não foi diferente, com suas mulheres ou mulher na índia, mas ele está em casa agora, e seu problema é outro. Eu já deveria saber que ele era casado com o regimento quando casamos. Pelo menos esse Jamie não é do exército, pois é muito difícil para uma esposa competir contra isso.