Não havia tanta reverência quanto em sua própria igreja, mas estava lotada, com braseiros aqui e ali contra a umidade, e a presença de todos os que podiam andar. Os vitrais eram ricos, o altar e ornamentos mais austeros do que imaginara.
Outros pensaram em parar ali, para cumprimentá-la, ou apenas acenar com a cabeça, com graus variados de satisfação ou espanto, ansiosos em sentar ao seu lado. Mas não o fizeram, também por não desejarem interrompê-la. Gornt escolheu um banco no outro lado.
Assim, Angelique ficou sozinha, e dali a pouco o serviço começou. O primeiro hino, e ela imitou os outros, levantando-se ao mesmo tempo, sentando-se quando todos sentavam, rezando quando rezavam, mas sempre para a Virgem Maria, escutou o sermão que o reverendo Tweet gaguejou, atordoado com sua presença. Mais hinos e canto, a bandeja, um momento embaraçoso, quando ela procurou por algumas moedas, outro hino e a bênção, e depois terminou, com um suspiro audível e bem merecido.
A congregação levantou-se, enquanto o vigário se retirava para a sacristia, acompanhado pelo velho sacristão. A maioria começou a se arrastar para a saída, os paladares já prontos para o tradicional almoço de domingo, a melhor refeição da semana: rosbife, pastelão de Yorkshire, batatas assadas, para os afortunados que haviam conseguido obter uma parte do último carregamento de carne australiana conservada no gelo.
Uns poucos permaneceram para uma oração final. A de Angelique foi um pedido de perdão por ter vindo àquela igreja, mas sentia-se confiante de que Deus compreenderia que era apenas um protesto momentâneo e necessário contra o padre Leo. Todos, ao sair, observaram-na. Depois, ela juntou-se aos últimos, acenando com a cabeça e dizendo “bom dia” aos cumprimentos sussurrados.
O vigário se postara do lado de fora da porta, cumprimentando algumas pessoas, olhando furioso para outras. Quando ela apareceu, Tweet se tornou ao mesmo tempo extasiado e gago:
— Oh, miss Ange... oh, madame, como é maravilhoso vê-la aqui, seja bem-vinda à Santíssima Trindade e que possamos vê-la mais vezes... se há alguma coisa que eu possa explicar... Oh! Não? Espero que tenha gostado, volte de novo, por favor, foi maravilhoso vê-la aqui... será sempre bem-vinda...
— Obrigada, reverendo.
Angelique fez uma rápida mesura, subiu apressada pelo caminho, foi andando pelo passeio. Sir William a esperava, junto com Babcott, agasalhados como todos contra as rajadas de vento.
— É um prazer vê-la, ainda mais aqui — disse Sir William, com sinceridade. — Temos bastante orgulho da Santíssima Trindade e é bem-vinda, muito, todos nos sentimos felizes com a sua presença. O vigário se mostrou um pouco desligado hoje, sinto muito, em geral ele é muito bom, sem trovejar com o fogo eterno. Gostou do serviço?
— Foi bastante diferente, Sir William. A missa em inglês, e não em latim, foi exótica.
— Imagino que sim. Podemos acompanhá-la?
— Será um prazer.
Partiram em passos rápidos, trocando cortesias e perguntas amenas, evitando o assunto central na mente de todos. O tempo está horrível, não acha? A partida de futebol ontem à tarde foi sensacional... poderemos escoltá-la na próxima semana. Já leu os últimos jornais? Já soube que os Artistas de Iocoama farão uma apresentação de Romeu e Julieta e que a Sra. Lunkchurch consentiu gentilmente em fazer a Julieta, contracenando com o Romeu da Sra. Grimm?
— Alguma vez já foi ao teatro ou representou, madame?
— Apenas peças infantis sobre a natividade, no convento, e não muito bem... Oh!
Uma rajada de vento arrancou a cartola de Sir William, e arremessou-a girando pelo ar. Babcott mal teve tempo de segurar a sua. Angelique não foi bastante rápida e seu chapéu saiu voando, assim com vários outros ao longo do passeio, sob um coro de imprecações, lamentos, aclamações e risos. Ela juntou-se à confusão e partiu atrás do seu, mas Babcott recuperou-o, pouco antes que rolasse para a praia. A cartola de Sir William foi recolhida por Phillip Tyrer, que se aproximou apressado para entregá-la, e depois correu atrás da sua.
— Minha melhor cartola — murmurou Sir William, irritado, limpando a lama, com uma aparência suspeita de estrume.
O chapéu de Angelique estava intacto. Ela o pôs na cabeça, ajustou o alfinete para prendê-lo melhor.
— Obrigada, George. Cheguei a pensar que meu chapéu daria um mergulho.
— E eu também. Podemos ter a honra de sua companhia no almoço?
— Obrigada, mas não será possível. Ficarei em casa hoje.
Logo chegaram ao portão do prédio da Struan. Os dois homens beijaram sua mão e ela entrou.
— Uma dama adorável, uma companhia agradável — comentou Sir William.
— Concordo.
Babcott franziu o rosto, olhando para o mar. Sir William acompanhou seu olhar atento. Não havia nada de errado na baía, ao que ele pudesse perceber.
— Qual é o problema?
— A regra dela começou.
— Deus Todo-Poderoso! Já a examinou? Ou Hoag? Por que não me contou antes?
— Não a examinamos ainda. Apenas sei, isso é tudo.
— Mas como...
Ele interrompeu a frase quando MacStruan e Dmitri passaram. Murmurou “bom dia, bom dia”, impaciente, depois pegou Babcott pelo braço, e conduziu-o rua abaixo, na direção da legação.
— Como pode saber?
— Ora, sou médico. Estive com ela ontem. Ao vê-la hoje, sem o véu, tornou-se evidente. O rosto estava um pouco inchado e notei que se mostrava um pouco desajeitada quando correu atrás do chapéu.
— Não percebi nada. Tem certeza?
— Não, mas cem guinéus contra um quarto de penny dizem isso.
Sir William franziu o rosto.
— Hoag também saberá só de olhar para ela?
— Não posso garantir.
— Neste caso, não diga a ele.
— E por que não?
— Vamos deixar como uma coisa particular entre nós. É melhor assim. — Uma pausa e Sir William acrescentou, gentilmente: — Vamos deixar que Angelique jogue suas cartas como quiser. É o jogo dela, com Tess Struan, não o nosso. Deixou de ser nosso.
Quatro vigilantes do Bakufu, incluindo um sargento, passaram pelo portão da Yoshiwara. Eram como qualquer outra patrulha de samurais, exceto que os homens eram mais duros, mais brutais e mais alertas. A tarde começava. Apesar do tempo, havia o tradicional desfile de cortesãs, sem pressa, com criadas em sua esteira, de um lado para outro, exibindo seus ornamentos umas para as outras, e para os grupos de gai-jin, olhando boquiabertos, enquanto bebiam nos cafés, rindo quando o vento lançava pelo ar uma ou outra sombrinha decorativa.
De vez em quando, um vigilante abordava o porteiro de uma estalagem, o dono de uma casa de chá ou a criada de um restaurante. No mesmo instante, a pessoa fazia uma reverência, submissa, e balbuciava: