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— Estou, sim, obrigada, meu caro. Volte depressa. Ele beijou a mão estendida de Angelique.

— Cuide-se, madame.

A exultação fazia com que ele parecesse ainda mais infantil.

— Não se esqueça. — Angelique pedira-lhe que dissesse a Tess que esperava que pudessem um dia se encontrar como amigas. — É importante.

— Sei disso, não esquecerei, e voltarei antes do que imagina. — Para os que se encontravam nas proximidades, Gornt acrescentou, em voz mais alta: — Providenciarei para que toda a sua lista de compras seja atendida. Não se preocupe.

Uma pequena pressão final na mão de Angelique e ele saltou para o convés escorregadio, despreocupado, o último a embarcar. O contramestre tocou o apito, empurrou a alavanca para toda velocidade à popa e recuou pelas ondas crispadas. Gornt acenou e depois, sem querer ser indiscreto, entrou na cabine.

— Uma linda jovem — murmurou Hoag, pensativo.

— Tem toda razão, senhor, uma Belle para acabar com todas as Belles. Os dois ficaram observando o cais se afastar.

— Já esteve na índia alguma vez, Edward?

— Não, nunca. E você já esteve em Paris?

— Não, nunca. Mas a índia é o melhor lugar do mundo, a melhor vida no mundo para os ingleses.

Em sua imaginação, Hoag podia se ver chegando à casa da família, por trás de muros altos, tudo castanho e poeirento por fora, mas fresco e verde lá dentro, o som do chafariz se misturando com as risadas na casa principal e nos alojamentos dos criados, a cordialidade e serenidade que todos demonstravam, por causa da convicção total no nascimento, morte e renascimento, numa sucessão interminável, até que, pela misericórdia do infinito, alcançavam o nirvana, o lugar da paz celestial. Arjumand estará lá, pensou ele, e espero poder encontrar meu caminho para o nirvana também.

Seus olhos focalizaram o cais, Angelique e os outros, todas as pessoas que provavelmente nunca mais tornaria a ver. Angelique acenou agora pela última vez, depois se aproximou de Maureen Ross, que esperava sob o lampião. Espero que se tornem amigas, pensou Hoag, especulando sobre as duas. Mais um momento e elas e o cais tornaram-se parte da noite. Angelique está certa em se submeter a Tess, refletiu ele, embora não tivesse mesmo qualquer opção. Distraído, seus dedos se certificaram de que a declaração estava mesmo guardada no bolso.

Muito triste o que aconteceu com Malcolm, trágico. Pobre Malcolm, trabalhando com a maior diligência por toda a sua vida, por algo que nunca teria, algo que nunca seria. Malcolm Struan, o tai-pan que nunca foi... toda a sua vida como um homem ofuscado pela neve, no meio de uma nevasca, procurando por uma barraca branca que nunca existiu.

— Muito triste o que aconteceu com Malcolm, não acha?

Mas Gornt não se encontrava mais ao seu lado. Hoag olhou ao redor e viu que ele saíra para o convés, postara-se de costas para Iocoama e contemplava o Belle, à frente, sem chapéu, o vento agitando seus cabelos.

Por que o sorriso e o que ficou para trás?, especulou Hoag. Tão duro, mas ao mesmo tempo... Havia algo de estranho naquele jovem. Ele é um rei em ascensão ou um homem fadado ao regicídio?

A maioria das pessoas no cais já se afastara. Angelique permanecia ao lado de Maureen, perto do lampião, observando o Belle e o cúter desaparecendo. Logo ficaram sozinhas, a não ser por Chen e Vargas, conversando em voz baixa, à espera para descarregar o cúter, caso fosse necessário, e para escoltar as duas mulheres, embora ninguém tivesse lhes pedido.

— Maureen... — Angelique fitou-a. Seu sorriso adorável se evaporou, ao notar como sua nova amiga parecia infeliz. — Qual é o problema?

— Não é nada. Isto é... ora, não envolve você. Acontece que não vi Jamie durante o dia inteiro, ele esteve ocupado, e eu... tinha uma coisa importante...

As palavras definharam.

— Esperarei com você, se quiser. Ainda melhor, Maureen, por que não vem comigo? Podemos esperar na minha suíte, e observar pela janela. Avistaremos o cúter com bastante antecedência para vir recebê-lo aqui.

— Acho que... acho que é melhor esperar aqui.

Angelique pegou-a pelo braço, a mão firme.

— O que foi? Qual é o problema? Posso ajudar?

— Não... acho que não, minha cara Angelique. É que... apenas... — Maureen hesitou de novo, e depois gaguejou: — Oh, Deus, eu não queria preocupá-la com isso, mas... a amante de Jamie me procurou esta tarde.

— Da Yoshiwara?

— Isso mesmo. Ela se ajoelhou à minha frente, fez uma reverência e disse que eu não me preocupasse, pois cuidara dele muito bem e queria perguntar se, no futuro, deveria apresentar sua conta a mim todo mês ou anualmente.

Angelique ficou boquiaberta.

— Ela disse isso?

— Disse. — Maureen parecia esverdeada à luz do lampião e continuou, sempre gaguejando: — Também disse que se houvesse alguma coisa que eu quisesse saber sobre... sobre “Jami”, como o chamou, sobre seus hábitos na cama, suas po... posições e assim por diante, já que eu era virgem, e assim não poderia saber dessas coisas, teria o maior prazer em me esclarecer em detalhes, pois era uma profissional de segunda classe e prometeu me dar um livro de ilustrações, chamado “livro de travesseiro”, em que indicaria as... as especialidades dele, mas que eu não me preocupasse, porque Jami era experiente e seu... seu, ela chamou monge de um olho só, estava em perfeita ordem. Pronto, agora você já sabe de tudo!

Angelique estava espantada.

— MonDieu, minha pobre amiga, que coisa horrível! Mas... mas ela também fala inglês?

— Não, uma mistura quase incoerente de jargão e pidgin, e também algumas palavras de Jamie, mas compreendi muito bem o sentido. Parece que ela... ela é sua amásia há um ano ou mais. Era pequena, nem de longe bonita, não devia ter muito mais que um metro e meio, e eu disse... não sabia o que dizer, por isso comentei seu tamanho, como era pequena, e ela... ela riu e disse: “Vela muito grande, Jami tai-tai, entra mesma maneira, hem? Você mulher de sorte.”

— Oh, mon Dieu!

— O que vou fazer?

Angelique descobriu que sua cabeça fervilhava.

— Você poderia... não, isso não adiantaria...

— Talvez eu pudesse... não, não posso. É demais...

— E se você...

Angelique sacudiu a cabeça. Desamparada, ela olhou para a outra, nesse momento Maureen a fitou, cada uma vendo a si mesma na outra, o mesmo choque, repugnância, desprezo, a fúria estampada claramente nos dois rostos. Por um instante, ambas ficaram imóveis e depois Angelique soltou uma risadinha, no segundo seguinte Maureen fez a mesma coisa, e logo as duas desataram em gargalhadas.

Chen e Vargas olharam, o som das risadas se misturando com o barulho das ondas, que se desmanchavam na praia e batiam contra os pilares do cais. Angelique removeu as lágrimas, as primeiras lágrimas de um riso bom e saudável que derramava em muito tempo.