Выбрать главу

— Tomo Watanabe, servidor subalterno, segunda classe — disse ele, fingindo uma humildade que não sentia.

Sua posição era a mais insignificante, na extremidade, as roupas menos requintadas que as dos outros. Todos os guardas haviam sido ordenados, sob pena de punição, a tratá-lo como o menos importante ali.

Ele se acomodou, sentindo a maior estranheza. Como são feios estes inimigos pensou, como são ridículos e cômicos, com seus chapéus enormes, botas esquisitas e trajes pretos e pesados... não é de admirar que sejam tão malcheirosos!

Sir William começou, com todo cuidado e simplicidade:

— Um inglês foi assassinado por samurais de Satsuma...

Por volta das cinco horas, os ânimos europeus estavam em frangalhos, os japoneses ainda polidos, sorridentes, mantendo uma fachada imperturbável. Em uma dúzia de modos diferentes, seus porta-vozes alegaram que... sentimos muito mas não temos jurisdição sobre Satsuma, nem conhecimento dos assassinos, nem qualquer meio de encontrá-los, mas foi de fato lamentável, não sabiam como providenciar reparações, embora em algumas circunstâncias as reparações fossem devidas, o xógum não se encontrava disponível no momento, mas teria o maior prazer em lhes conceder uma audiência assim que voltasse, embora não num futuro previsível, mas vamos solicitar imediatamente que marque um dia exato, só que não pode ser este mês, porque não sabemos com certeza seu atual paradeiro, mas seria o mais breve possível, a próxima reunião e todas as reuniões subsequentes não devem ser em Iedo, mas sim em Kanagawa, sentimos muito, mas não este mês, talvez no próximo, sentimos muito, mas não temos autoridade...

Cada questão tinha de ser traduzida do inglês para o holandês e o japonês — e as frases nesta última língua eram longamente discutidas entre eles —, e as respostas traduzidas para o holandês e depois para o inglês, com uma inevitável homília, e sempre com pedidos polidos de explicações sobre os pontos mais triviais.

Yoshi achou que todo o procedimento era muito interessante, pois nunca antes estivera diante de tantos gai-jin reunidos, nem comparecera a uma reunião em que eram tão desiguais, surpreendentemente, discutiam assuntos políticos, em vez de escutarem e obedecerem.

Três dos outros quatro eram de fato servidores do Bakufu, embora subalternos. Todos haviam se apresentado com nomes falsos, um costume normal quando se lidava com estrangeiros. O impostor, que secretamente falava inglês, sentava ao lado de Yoshi. Seu nome era Misamoto. Yoshi lhe ordenara que não se esquecesse de nada, que informasse discretamente qualquer coisa importante que não tivesse sido traduzida com precisão, mas afora isso se mantivesse de boca fechada. Era um criminoso sob sentença de morte.

Quando Yoshi mandara buscá-lo, dois dias antes, Misamoto no mesmo instante se prostrara diante dele, tremendo de medo.

— Levante-se e sente ali.

Yoshi apontara com o leque para a beira da plataforma de tatame em que sentava. Misamoto obedecera. Era um homem pequeno, de olhos rasgados, cabelos e barba compridos e grisalhos, o suor escorrendo pelo rosto, as roupas ordinárias, quase em farrapos, as mãos calosas, a pele da cor de mel escuro.

— Vai me contar a verdade. Seus interrogadores informam que fala inglês, fala mesmo?

— Sim, lorde.

— Nasceu em Anjiro, em Izu, e esteve na terra chamada América?

— Sim, lorde.

— Quanto tempo passou lá?

— Quase quatro anos, lorde.

— Em que lugar da América?

— San Francisco, Lorde.

— O que é San Francisco?

— Uma cidade grande, lorde.

— Só lá?

— Sim, lorde.

Yoshi estudara-o, precisando de informações, e depressa. Percebera que o homem se sentia desesperado em agradar, mas ao mesmo tempo apavorado, com ele e com os guardas que o haviam trazido, empurrando sua cabeça para o chão. Por isso, decidira tentar um esquema diferente. Dispensara os guardas, levantara-se, fora se encostar no peitoril da janela, olhando para a cidade.

— Conte-me depressa, com suas próprias palavras, o que lhe aconteceu.

— Eu era pescador na aldeia de Anjiro, em Izu, lorde, onde nasci, há trinta e três anos. — Misamoto falara sem hesitar, deixando patente que já relatara a história uma centena de vezes antes. — Há nove anos, estava pescando, junto com outros cinco, em meu barco, a algumas ri da praia. Fomos apanhados por uma súbita tempestade, que foi se tornando cada vez mais forte, e fomos soprados pelo vento, durante trinta dias ou mais, para leste, pelo grande mar, centenas de ri, talvez mil, lorde. Durante esse tempo, três dos meus companheiros caíram no mar. Depois o mar se acalmou, mas nossas velas haviam sido rasgadas, não havia comida, nem água. Tentamos pescar, mas nada conseguimos pegar, não havia água para beber... Um de nós enlouqueceu, pulou na água, começou a nadar para uma ilha que pensava ter visto e logo se afogou. Não vimos terra nem navio, só água. Muitos dias depois, o outro homem, meu amigo Ishii, morreu, e eu fiquei sozinho. Até que um dia pensei que tinha morrido, porque vi aquele navio estranho, que navegava sem velas, e parecia estar pegando fogo, mas era apenas um vapor de roda, americano, indo de Hong Kong para San Francisco. Eles me salvaram, me deram comida e me trataram, como se fosse um deles... fiquei aterrorizado, lorde, mas partilharam comigo sua comida e sua água, e me deram roupas...

— Esse navio americano levou você para esse lugar San qualquer coisa? O que aconteceu depois?

Misamoto contara como fora levado à casa do irmão do capitão, um negociante de velas de navio, para aprender a língua, fazendo pequenos trabalhos, até as autoridades decidirem o que fazer com ele. Vivera com a família por cerca de três anos, trabalhando na loja e no porto. Um dia fora levado à presença de uma importante autoridade, um homem chamado Natow, que o interrogara, e depois dissera que seria enviado com o navio de guerra Missouri para Shimoda, a fim de servir como intérprete para o cônsul Townsend Harris, que já se encontrava no Japão, negociando um tratado. A esta altura, ele usava roupas ocidentais e aprendera alguns dos costumes ocidentais.

— Aceitei com a maior satisfação, Sire, certo de que poderia ser útil aqui, em particular para o Bakufu. No nono dia do oitavo mês do ano de 1.857, pela contagem deles, há cinco anos, Sire, chegamos a Shimoda, em Izu, não muito longe da minha aldeia natal, que fica ao norte de lá. No momento em que desembarquei, obtive permissão para me ausentar por um dia, e parti no mesmo instante, lorde, a fim de me apresentar à casa da guarda mais próxima, ou encontrar a autoridade do Bakufu mais próxima, pensando que seria bem recebido, por causa dos conhecimentos que adquirira... Mas os guardas da barreira não...