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— Vocês enlouqueceram — declarara McFay a alguns, no clube, durante a noite passada. — O pobre coitado se acha num estado lamentável.

O Dr. Babcott garantira:

— Ele vai estar de pé e andando muito antes do que você imagina.

— Já posso ouvir os sinos nupciais! — exclamara alguém.

— Drinques por conta da casa! — gritara outro, expansivo. — Temos um casamento aqui, nosso primeiro casamento!

— Já tivemos muitos casamentos, Charlie. Esqueceu as nossas musumes?

— Ora, pelo amor de Deus! Elas não contam. Estou me referindo a um verdadeiro casamento na igreja... um batizado cristão...

— Por Jeová, insinua por acaso que já tem alguma coisa no forno?

— O rumor é de que os dois se comportavam como pombinhos no navio, ao virem para cá... não que eu o culpe por isso...

— Mas eles nem mesmo estavam noivos nessa ocasião! Diga isso de novo, insultando a honra da moça, e vai pagar caro!

McFay suspirara. Uns poucos murros embriagados, garrafas quebradas e os dois homens foram expulsos, para voltar rastejando, uma hora depois, com uma recepção estrondosa. Ao retornar ao prédio, ele resolvera dar uma olhada, antes de ir para a cama. Malcolm dormia, e Angelique cochilava numa cadeira, ao lado da cama. Acordara-a, gentilmente, e murmurara:

— É melhor ir dormir um pouco, Srta. Angelique. Ele não vai acordar agora.

— Tem razão, Jamie. Obrigada.

McFay observara-a se espreguiçar, como uma jovem felina satisfeita, os cabelos espalhando-se sobre os ombros nus, o vestido de cintura alta e folgado, caindo em dobras, no estilo que a imperatriz Josephine tanto apreciava, cinqüenta anos antes, e que o pessoal da haute couture parisiense tentava agora reintroduzir. Toda ela vibrava com uma força vital que atraía os homens. O quarto dele ficava mais adiante. Durante longo tempo não conseguiu dormir.

O suor aflorou em Struan. Era imenso o esforço para usar o urinol, com pouco resultado por toda a dor, nada de fezes, e apenas um pouco de urina, misturada com sangue.

— Agora, Jamie, pode me dizer qual é a má notícia?

— Deve compreender...

— Pelo amor de Deus, Jamie, diga logo!

— Seu pai faleceu há nove dias, no mesmo dia em que o navio de correspondência deixou Hong Kong, vindo direto para cá, sem passar por Xangai. O funeral seria três dias depois. Sua mãe pede-me para providenciar seu retorno imediato. Nosso navio de correspondência, que levou notícias suas, não vai chegar a Hong Kong antes de quatro ou cinco dias, no mínimo. Sinto muito.

Struan só ouvira a primeira frase. A notícia não era inesperada, mas ainda assim foi um golpe tão violento quanto o ferimento que recebera no flanco.

Sentia-se ao mesmo tempo muito contente e muito feliz, excitado porque finalmente poderia dirigir de fato a companhia, uma função para a qual fora preparado durante toda a sua vida. Há anos que a companhia vinha se esvaindo, há anos que era sustentada pela mãe, que persuadia, adulava, orientava e ajudava o pai, nos momentos difíceis. Tais momentos eram constantes, devido em grande parte à bebida, o medicamento que o pai usava para atenuar as dores de cabeça e os acessos da doença do Happy Valley, a malária, a febre misteriosa e mortal que dizimara a população inicial de Hong Kong, mas agora, às vezes, era contida pelo extrato de uma casca de árvore, o quinino.

Não posso me lembrar de um único ano em que o pai não tenha ficado de cama pelo menos duas vezes, com as tremedeiras, por um mês ou mais, a mente vagueando por dias a fio. Nem mesmo as infusões da casca de cinchona, de valor inestimável, que o avô trouxe do Peru, conseguiram curá-lo, embora impedissem que a febre o matasse, assim como a quase todos os outros. Mas não salvaram a pobre Mary, com apenas quatro anos de idade na ocasião, quando eu tinha sete. Nunca mais esqueci sua morte, seu significado, a fragilidade da vida.

Ele soltou um suspiro profundo. Graças a Deus que nada afetava a mãe, nem a praga, nem a febre, nem a idade, nem o infortúnio, ainda uma jovem, com menos de trinta e oito anos, ainda esguia, depois de sete filhos, um suporte de aço para todos nós, capaz de se sobrepor a todos os desastres, todas as tempestades, até mesmo ao ódio e hostilidade amargos e perpétuos entre ela e o pai, Tyler Brock, que ele apodreça no inferno... nem mesmo a tragédia do ano passado, quando os gêmeos queridos, Rob e Dunross, morreram afogados em Shek-O, onde fica nossa casa de veraneio. E agora o pobre pai. Tantas mortes...

Tai-pan. Agora sou o Tai-pan da Casa Nobre.

— O que foi mesmo que disse, Jamie?

— Apenas disse que sinto muito, tai-pan. Trouxe uma carta de sua mãe. Com algum esforço, Struan pegou o envelope.

— Qual é o meio mais rápido para eu voltar a Hong Kong?

— Pelo Sea Cloud, mas só deve aparecer aqui dentro de duas ou três semanas. Os únicos navios mercantes que temos no porto neste momento são lentos, e nenhum deve seguir para Hong Kong em menos de uma semana. O navio de correspondência seria o meio mais rápido. Pode partir de imediato, mas terá de passar por Xangai na viagem de volta.

Depois de ontem, a perspectiva de uma viagem de onze dias, com o mar encapelado, como era mais do que provável, talvez mesmo com um tufão, horrorizava Malcolm. Mesmo assim, ele disse:

— Fale com o capitão. Convença-o a seguir direto para Hong Kong. O que mais tem na correspondência?

— Ainda não examinei tudo, mas aqui...

Bastante preocupado com a súbita palidez de Struan, McFay estendeu o Hong Kong Observer.

— Receio que só haja más notícias. A guerra civil americana está se tornando cada vez mais acirrada, oscilando para um lado e outro, com dezenas de milhares de mortes... batalhas em Shiloh, Fair Oaks, dezenas de lugares, outra em Buli Run com o exército da União derrotado, dizimado. A guerra mudou para sempre, com os novos fuzis de carregar pela culatra, metralhadoras, canhões estriados. O preço do algodão disparou, com o bloqueio da União ao sul. Outro pânico nas bolsas de valores de Londres e Paris... rumores de uma iminente invasão da França pela Prússia. Desde que o príncipe consorte morreu, em dezembro, a rainha Victoria ainda não apareceu em público... corre o rumor de que definha para a morte Retiramos nossas forças do México e agora parece evidente que o doido do Napoleão III está determinado a converter o país num domínio francês. Fome e distúrbios por toda a Europa. — McFay hesitou. — Quer que eu providencie alguma coisa?