Ah, uma recompensa mínima: o nome dele sussurrado, em tom gutural, e os lábios do homem beijando seu pescoço. Ela relaxara, encostara os lábios no mamilo de Tyrer. Agora, é apenas uma questão de tempo para explodir sua virgindade para o céu, e depois poderei pedir um saquê, dormir até o amanhecer esquecer que estou com quarenta e três anos, sem filhos, e apenas recordar que Raiko-san me salvou da casa de sexta classe a que fora relegada por minha idade e falta de beleza.
Sem nada para fazer, Tyrer observava os samurais na praça diante da legação, o sol quase encostando no horizonte, a mente absorvida em Ako, e duas noites mais tarde, Hamako.
E depois... Ela.
Fujiko. Na noite antes da última.
Sentiu que endurecia, e ajeitou essa parte do corpo de maneira mais confortável, sabendo que agora se encontrava inexoravelmente enleado naquele mundo, o mundo flutuante, onde a vida era apenas para o momento, como André lhe dissera, para o prazer, à deriva, sem qualquer preocupação, como uma flor na correnteza de um rio sereno.
— Nem sempre é calmo assim, Phillip. Como Fujiko é?
— Ahn... quer dizer que não a conhece? Nunca a viu?
— Não. Só fui informado por Raiko-san de que era o tipo de garota que você poderia apreciar, com ênfase no “dicionário de cama”. Como ela foi?
Tyrer soltara uma risada, para encobrir seu profundo constrangimento e inquietação, diante de uma pergunta tão pessoal, tão direta. Mas André lhe proporcionara tanto que ele resolvera ser “francês”, absolutamente franco. Por isso, pusera de lado as apreensões, o sentimento arraigado de que um cavalheiro não deveria discutir nem revelar tais informações pessoais.
— Ela... é mais jovem do que eu, pequena, talvez mesmo diminuta, não é bonita, não em nossos termos, mas espantosamente atraente. Creio que a entendi dizer que era nova ali.
— Estou querendo saber como ela foi na cama. Melhor do que as outras?
— Hum... não há como comparar.
— Ela foi mais vigorosa? Mais sensual?
— Hum.. .foi, sim. Vestida ou despida, incrível. Especial. Mais uma vez, devo dizer que não tenho palavras para agradecer por tudo o que fez por mim.
— De rien, mon vieux.
— É verdade. Na próxima vez... na próxima vez você vai conhecê-la.
— Mon Dieu, não, essa é a regra. Nunca apresente sua “especial” a ninguém, muito menos a um amigo. Não se esqueça de uma coisa: até que a instale em sua própria casa, com você pagando todas as contas, ela é disponível a qualquer um que tenha dinheiro... se ela quiser, é claro.
— Eu tinha esquecido — murmurara Tyrer, escondendo a verdade.
— Mesmo que se torne teúda e manteúda, ela ainda pode ter um amante secreto. Quem pode saber?
— Tem razão. Mais angústia.
— Não se apaixone, meu amigo, não por uma cortesã. Considere-as pelo que são, mulheres do prazer. Desfrute-as, goste delas, mas não as ame... e nunca deixe que se apaixonem por você...
Tyrer estremecera, odiando a verdade, odiando a idéia de Fujiko ir para acama com outro homem, como fizera com ele, odiando que fosse por dinheiro, odiando a ânsia que sentia entre as pernas. Por Deus, ela era mesmo especial, adorável, uma doce tagarela, gentil, tão jovem, há bem pouco tempo na casa. Devo sustentá-la? Não devo, mas posso? Tenho certeza que André montou uma casa, com sua amiga especial, embora nada comente a respeito, nem eu perguntaria. Oh, Deus, quanto custaria? Só pode ser mais do que tenho condições de gastar...
Não pense sobre isso agora! Nem nela.
Com um esforço, ele concentrou sua atenção no jardim lá embaixo, mas a ânsia persistiu. Parte do destacamento de Highlanders entrava em formação em torno do mastro, o corneteiro e quatro tambores, para o abaixamento da bandeira. Rotina. Os jardineiros se concentravam junto aos portões, para serem contados, e depois dispensados. Deixaram a legação, passaram entre os samurais e desapareceram. Rotina. Sentinelas fecharam e trancaram os portões de ferro. Rotina. Os tambores e a corneta soaram, enquanto a bandeira inglesa era lentamente abaixada... nenhum sol se põe sobre a bandeira britânica, essa era a lei no mundo inteiro. Rotina. A maioria dos samurais começou a se retirar, deixando apenas uma força simbólica para a noite. Rotina.
Tyrer estremeceu.
Se tudo é rotina, por que me sinto tão nervoso?
Os jardineiros da legação entraram em sua choupana-dormitório, que ficava no outro lado do templo budista. Nenhum deles enfrentou o olhar de Hiraga. Todos haviam sido advertidos de que suas vidas, assim como as vidas de todas as suas gerações, dependiam da segurança de Hiraga.
— Tomem cuidado ao falar com estranhos — dissera-lhes Hiraga. — Se o Bakufu descobrir que me deram abrigo, terão a mesma recompensa, só que serão crucificados, em vez de terem uma morte lenta.
Apesar de todos os protestos submissos de que ele se encontrava a salvo, de que podia confiar neles, Hiraga sabia que nunca deveria se sentir seguro. Desde a eniboscada contra Anjo, dez dias antes, passara a maior parte do tempo no refúgio em Kanagawa, a estalagem das Flores da Meia-Noite. O fracasso do ataque, com a morte de todos os seus companheiros, à exceção de um, era karma, nada mais.
Recebera no dia anterior uma carta de Katsumata, o líder clandestino dos shishi de Satsuma, que agora se encontrava em Quioto: Urgente: dentro de poucas semanas, o xógum Nobusada criará um precedente, ao vir para cá numa visita oficial ao imperador. Todos os shishi devem se concentrar aqui imediatamente fim de planejar como interceptá-lo e, depois, nos apoderarmos dos portões do palácio. Katsumata assinara com seu codinome: Corvo.
Hiraga discutira o que fazer com Ori e depois decidira retornar a Iedo, decidido a agir sozinho para destruir a legação britânica, furioso porque o Conselho dos Anciãos parecia ter sido enganado e neutralizado pelos gai-jin.
— Quioto pode esperar, Ori. Temos de atacar os gai-jin. Devemos enfurecê-los, até que bombardeiem Iedo. Outros podem cuidar do xógum e de Quioto.
Ele gostaria de levar Ori, mas o companheiro estava impotente, o ferimento pior, sem qualquer ajuda médica.