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Numa reunião do conselho, convocada às pressas, os ânimos estavam exaltados, Anjo quase espumando de fúria.

Choshu, Satsuma e Tosa! Sempre os três! São cães que devem ser esmagados! Sem eles, teríamos tudo sob controle!

— É verdade — concordara Yoshi. — E repito que devemos ordenar que nossas tropas em Quioto entrem em ação, a fim de acabar com a rebelião imediatamente... a qualquer custo!

— Não. Devemos esperar, pois nossas forças ali são insuficientes. Toyama, o velho, coçara o queixo coberto por uma barba grisalha e dissera:

— Concordo com Yoshi-dono. A guerra é o único meio, e temos de declarar que Ogama de Choshu é um fora-da-lei!

— Impossível! — protestara Adachi, lamuriento, por si mesmo e pelo último ancião. — Concordamos com Anjo. Não podemos correr o risco de ofender todos os daimios, encorajando-os a se unirem contra nós.

— Temos de agir sem demora! — insistira Yoshi. — Devemos ordenar que nossas tropas retomem os portões e sufoquem a rebelião!

— Nossas forças são insuficientes — dissera Anjo, obstinado. — Vamos esperar. Este não é o momento.

— Por que não escutam meu conselho?

Àquela altura, Yoshi sentia-se tão furioso que sua raiva quase aflorara. Tratou de se controlar, com o maior esforço, sabendo que se enfurecer e perder a caligrafia seria um erro fatal, pois faria com que todos se virassem contra ele, para sempre. Não era o mais moço, o menos experiente, embora o mais qualificado, com mais influência entre os daimios, o único dos anciãos que podia, se assim desejasse, erguer seu estandarte e lançar todo o país na guerra civil, como ocorrera por séculos, antes do xógum Toranaga? Todos os outros não haviam se mostrado invejosos e desdenhosos quando ele fora designado guardião e ancião, por “solicitação” imperial, sem consultá-los, por quem manipulava o filho do céu?

— Sei que estou certo. Não estava certo em relação aos gai-jin? Pois estou certo neste caso também.

O plano que ele concebera para afastar os gai-jin e sua esquadra de Iedo, a fim de se ganhar tempo para resolver os problemas internos, tivera um êxito absoluto. Fora bastante simples.

— Com grande cerimônia e humildade simulada, demos aos gai-jin uma indenização insignificante, propusemos uma futura reunião com o conselho, que será adiada e adiada ou mesmo cancelada, talvez até encenada com fantoches, se for necessário, para se insinuar no último momento, quando a paciência deles estiver quase esgotada, que será providenciada uma reunião com o xógum, quando ele voltar... o que também pode ser adiado, renegociado, protelado, e nunca vai acontecer ou mesmo que venha a ocorrer, no futuro distante, nada produzirá que não desejarmos. Ganhamos assim uma parte do tempo de que necessitamos, e descobrimos uma maneira permanente de lidar com essa gente: usar a impaciência dos gai-jin contra eles, oferecer “promessas”, muita sopa sem peixe ou no máximo uns poucos pedaços podres, de que não precisamos nem queremos. Eles ficaram satisfeitos, sua esquadra partiu com a tempestade, talvez tenha afundado. Até agora, nenhum dos navios voltou.

O velho Toyama dissera:

— Os deuses nos ajudaram com aquela tempestade, enviando de novo seu vento divino, o vento camicase, como aconteceu contra as hordas invasoras de Kublai Khan, há muitos séculos. Quando os expulsarmos, a mesma coisa ocorrerá outra vez. Os deuses nunca nos abandonarão.

Adachi se empertigara, vaidoso.

— É verdade que executei nosso plano com perfeição. Os gai-jin se mostraram tão dóceis quanto uma cortesã de quinta classe.

— Os gai-jin são uma ferida que nunca vai curar, enquanto formos mais fracos em poderio militar e riqueza — protestara Anjo, irritado, retorcendo as mãos. — São uma ferida que não vai curar... não sem ser cauterizada, e ainda não podemos fazer isso, enquanto não tivermos meios de construir navios e fabricar canhões. Não podemos nos desviar do objetivo, e ordenar que nossas tropas retomem os portões, pelo menos por enquanto. Os Choshus não são nossos inimigos imediatos, mas, sim, os Sonno-joi e os cães shishi.

Yoshi notara o quanto Anjo mudara desde o atentado contra sua vida: mostrava-se agora muito mais irascível, obstinado, sua determinação enfraquecida, embora a influência que exercia sobre os anciãos não houvesse diminuído.

— Não concordo, mas se você acha que nossas forças são insuficientes, posso ordenar mobilização geral, acabar com os lordes exteriores e todos os que se aliarem a eles!

Toyama dissera:

— A guerra é o único caminho, Anjo-sama. Esqueça os shishi, esqueça os gai-jin, pelo menos por enquanto. Os portões... primeiro, devemos retomar nossos direitos hereditários.

Anjo proclamara:

— É o que faremos, no momento oportuno. Agora, a visita do xógum deve ser realizada de acordo com o planejado.

Apesar dos protestos adicionais de Yoshi, Anjo mais uma vez ganhara na votação, três a dois, e em particular acrescentara, insidioso:

— Como eu lhe disse, Yoshi-dono, eles sempre votarão comigo. Os shishi nunca terão êxito contra mim, nem contra você, nem contra ninguém.

— O xógum Nobusada também não terá êxito?

— Ele... ele não é um inimigo, e acata meus conselhos.

— E a princesa Yazu?

— Ela obedecerá... obedecerá a seu marido.

— Ela obedecerá a seu irmão, o imperador, até o dia de sua morte.

Yoshi ficara chocado quando Anjo dissera, com um sorriso insinuante:

— Propõe um acidente, hem?

— Não proponho nada desse tipo.

Yoshi sentira um calafrio, temeroso de que o homem estivesse se tornando perigoso demais para continuar vivo, já poderoso demais para ser neutralizado, arguto demais, contando com o apoio de um enxame de bandos à disposição, sempre prontos a se submeterem à sua vontade...

Uma silhueta se aproximou da porta, quase silenciosa. Sem sequer pensar, Yoshi estendeu a mão direita para a espada comprida, no chão, ao seu lado, embora reconhecesse a silhueta. O vulto se ajoelhou. Uma batida delicada.

— Oque é?

Ela abriu a porta, sorrindo, fez uma reverência, e esperou.

— Entre, por favor, Koiko — murmurou Yoshi, satisfeito com a visita inesperada, todos os seus demônios desaparecendo.