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Sentiu as mãos terrivelmente vazias.

A Escuridão… A Escuridão…

A Escuridão parecia não ter fim. Estava mergulhando em um abismo infinito. Caindo, caindo, caindo na noite, na noite sem fim, no negro que tudo devora…

Respire fundo. Procure se controlar.

E se os danos mentais forem permanentes?

Procure se controlar, repetiu para si mesmo. Nada vai acontecer. Você tem que agüentar apenas mais onze minutos, na pior das hipóteses. Talvez sejam apenas seis ou sete. Os sóis estão brilhando lá fora. Seis ou sete minutos e nunca mais você terá que suportar a Escuridão, mesmo que viva mil anos.

A Escuridão…

Oh, meu Deus, a Escuridão…

Calma. Calma. Você é um homem muito estável, Sheerin. Tem uma mente excepcionalmente equilibrada. Estava no seu juízo perfeito quando entrou nesta coisa e vai estar no seu juízo perfeito quando sair.

Tic. Tic. Tic. A cada segundo, você está mais próximo da saída. Está mesmo? Pode ser que este passeio jamais termine. Eu poderia ficar aqui para sempre. Tic. Tic. Tic. Estou andando? Quanto tempo me resta? Cinco minutos? Cinco segundos? Ou ainda estou no primeiro minuto? Tic. Tic.

Por que eles não me deixam sair? Não veem que estou sofrendo? Eles não querem deixar você sair. Nunca mais vão deixar você sair. Eles vão…

De repente, uma dor lancinante entre os olhos. Uma explosão de agonia dentro da cabeça.

Que foi isso? Luz!

Será possível? Sim. Sim.

Graças a Deus. É luz, sim! Graças a Deus!

Tinha chegado ao final do Túnel! Estava voltando à estação! Só podia ser isto. Sim. Sim. O coração, que havia disparado, começava a voltar ao normal. Os olhos, agora adaptados à volta das condições normais, se focalizaram em coisas familiares, em coisas abençoadas, nas pilastras, na plataforma, na pequena janela da cabine de controle…

Cubello e Kelaritan estavam olhando para ele.

Agora, sentia vergonha da própria covardia. Aja normalmente, Sheerin. Afinal, não foi tão mau assim. Você está bem. Não está deitado no fundo do vagão, chorando e chupando o dedo. Foi duro, foi aterrorizante, mas não afetou você… não foi nada que você não pudesse agüentar…

— Tudo bem. Estenda sua mão, doutor. Assim… assim… Puseram-no de pé e puxaram-no para fora do carro. Sheerin respirou fundo. Passou a mão na testa, para tirar o suor.

— Acho que perdi o controle remoto — murmurou.

— Como está se sentindo? — perguntou Kelaritan. Como foi?

Sheerin cambaleou. O diretor do hospital segurou-o pelo braço, tentando ampará-lo, mas Sheerin o empurrou, indignado. Não ia deixar que pensassem que uns poucos minutos dentro do Túnel o haviam feito perder a compostura.

Entretanto, não podia negar que tinha sido afetado. Por mais que se esforçasse, era impossível esconder o fato. Nem mesmo de si próprio. De repente, deu-se conta de que nenhuma força do mundo o faria entrar de novo naquele Túnel.

— Doutor? Doutor?

— Está… tudo… bem — murmurou, com voz pastosa.

— Ele disse que está tudo bem — falou o advogado. Recuem. Deixem-no respirar.

— As pernas dele estão tremendo — protestou Kelaritan. — Ele pode cair.

— Não! — exclamou Sheerin. — Não se preocupe! Está tudo bem!

Cambaleou, recuperou o equilíbrio, cambaleou de novo. Estava banhado de suor. Olhando por cima do ombro, viu a boca do Túnel e estremeceu. Dando as costas para aquela caverna negra, levantou os ombros, como se quisesse esconder o rosto entre eles.

— Doutor? — disse Kelaritan, indeciso.

Não adiantava fingir. Era tolice, aquela tentativa inútil e teimosa de bancar o herói. Que pensassem que era um covarde. Que pensassem o que quisessem. Aqueles quinze minutos tinham sido o pior pesadelo de sua vida. O impacto ainda estava penetrando, penetrando, penetrando.

— Foi uma experiência… perturbadora — declarou. — Muito desagradável.

— Mas o senhor se saiu muito bem, não é verdade? — disse o advogado, em tom ansioso. — Ficou um pouco abalado, é claro. Quem não ficaria, depois de passar quinze minutos na Escuridão? Mas não aconteceu nada demais. Como sabíamos que não iria acontecer. São poucas, muito poucas as pessoas que sofrem qualquer tipo de…

— Não é verdade — interrompeu Sheerin. O rosto do advogado era como uma górgona sorridente. Como o rosto de um demônio. Não agüentava olhar para ele. Mas uma boa dose de verdade seria suficiente para exorcizar o demônio. Não havia a menor necessidade de ser diplomático, pensou Sheerin. Não quando estava conversando com demônios.

— É impossível alguém andar naquela coisa sem correr um sério perigo. Agora tenho certeza disto. Mesmo as pessoas mais equilibradas são submetidas a uma tensão terrível, e as mais fracas simplesmente desmoronam. Se abrirem de novo aquele brinquedo, todos os hospícios das quatro províncias estarão lotados em menos de seis meses.

— Pelo contrário, doutor…

— Não me venha com “pelo contrário”! Já entrou no Túnel, Cubello? Não, acho que não. Pois eu entrei. Vocês estão pagando por minha opinião profissional. Pois vão tê-la agora mesmo. O Túnel é extremamente perigoso. É uma simples questão de natureza humana. A Escuridão é mais do que qualquer um de nós consegue suportar, e isto não vai mudar nunca, pelo menos enquanto tivermos um sol brilhando no céu. Fechem de uma vez por todas o Túnel, Cubello! Em nome do bom senso, homem, fechem o Túnel! Acabem com ele!

7

Depois de estacionar a motoneta no terreno da faculdade, bem sob a cúpula do Observatório, Beenay, a passos largos, tomou o caminho que levava à entrada principal do edifício. Quando começou a subir os amplos degraus de pedra que conduziam ao saguão, teve um sobressalto ao ouvir alguém chamá-lo pelo nome.

— Beenay! Que bom que você apareceu!

O astrônomo levantou os olhos. A silhueta alta, maciça, de seu amigo Theremon 762, do jornal Crônica, se recortava contra a grande porta do Observatório.

— Theremon? Estava à minha procura?

— Estava. Mas disseram-me que você só iria chegar daqui a algumas horas. No momento em que eu estava indo embora, encontro você. Que sorte!

Beenay galgou os últimos degraus, e os dois trocaram um rápido abraço. Ele conhecia o jornalista há três ou quatro anos, desde que Theremon estivera no Observatório para entrevistar algum cientista, qualquer cientista, a respeito do último manifesto dos Apóstolos do Fogo. Aos poucos, ele e Theremon haviam se tornado amigos íntimos, embora Theremon fosse cinco anos mais velho e viesse de um meio mais livre, mais eclético. Beenay gostava da ideia de ter um amigo que não estivesse envolvido na política universitária, e Theremon estava radiante por conhecer alguém que não estava absolutamente interessado em usar de sua influência considerável nos meios jornalísticos.

— Algum problema? — perguntou Beenay.

— Nenhum. Eu apenas gostaria que você representasse de novo o papel de Voz da Ciência. Mondior fez outro de seus famosos discursos na linha de “Arrependam-se, o fim do mundo está próximo!” Agora ele diz que está pronto para revelar a hora exata em que o mundo será destruído. Caso você esteja interessado, isso vai acontecer no ano que vem, no dia 19 de Theptar.

— Que maluco! E perda de tempo publicar as coisas que ele diz. Por que será que as pessoas levam os Apóstolos tão a sério?

Theremon deu de ombros.

— A verdade é que as pessoas acreditam nos Apóstolos. Muita gente, Beenay. E se Mondior diz que o fim está próximo, preciso de alguém que se levante e diga: “Não é verdade, irmãos e irmãs! Não temam! Está tudo bem!” Ou coisas parecidas. Posso contar com você, não posso, Beenay?