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— Você é uma moça muito distinta mesmo. Esqueça Mikey e procure um bom marido.

Kay não se ofendia com essa insistência e compreendia que a Sra. Corleone falasse assim porque estava preocupada e achava que ela era uma moça que se encontrava numa situação impossível.

Quando terminou o seu primeiro período escolar como professora, ela resolveu ir a Nova York comprar algumas roupas boas e ver algumas antigas colegas da faculdade. Pensou também em procurar um emprego interessante naquela cidade. Vivera como uma solteirona por quase dois anos, lendo e ensinando, recusando encontros amorosos, furtando-se mesmo a sair a passeio, embora já tivesse desistido de telefonar para Long Beach. Sabia que não podia continuar assim, que estava ficando irritadiça e infeliz. Mas acreditara que Michael lhe escreveria ou lhe enviaria algum recado. O fato de ele não ter feito isso a humilhava profundamente; sentia-se triste por ele não ter confiado nela.

Kay pegou um trem cedinho e alugou um quarto no hotel pelo meio da tarde. As suas amigas estavam trabalhando e ela não queria incomodá-las nos respectivos empregos, pretendia visitá-las à noite. E ela não tinha realmente vontade de fazer compras depois da cansativa viagem de trem. Ficou sozinha no quarto do hotel e, ao se recordar de todas as vezes que ela e Michael haviam usado quartos de hotel para encontros amorosos, foi tomada por um sentimento de desolação. Foi isso, mais do que qualquer outra coisa, que lhe deu a idéia de telefonar para a mãe de Michael em Long Beach.

O telefone foi atendido por uma voz masculina grossa com um sotaque tipicamente nova-iorquino, para ela. Kay pediu para falar com a Sra. Corleone. Houve um silêncio de alguns minutos e depois Kay ouviu a voz de sotaque italiano carregado perguntar quem era.

Kay ficou um pouco embaraçada agora.

— É Kay Adams, Sra. Corleone — respondeu ela. — Lembra-se de mim?

— Certamente, certamente, eu me lembro — retrucou a Sra. Corleone. — Por que você deixou de telefonar? Casou-se?

— Oh, não — respondeu Kay. — Tenho andado ocupada.

Ficou surpresa ao ver que a Sra. Corleone estava obviamente aborrecida por ela ter parado de telefonar.

— A senhora tem alguma notícia de Michael? Ele está bem?

Houve um silêncio do outro lado da linha e depois a voz da Sra. Corleone veio forte.

— Mikey está em casa. Ele não telefonou para você? Não viu você?

Kay sentiu uma fraqueza no estômago em conseqüência do choque e um desejo humilhante de chorar. Sua voz desafinou um pouco quando ela perguntou:

— Há quanto tempo ele está em casa?

— Seis meses — respondeu a Sra. Corleone.

— Oh, compreendo — retrucou Kay.

E realmente compreendia. Sentiu ondas quentes de vergonha ao ver que a mãe de Michael sabia que ele a estava tratando com tamanha desconsideração. E depois ficou zangada. Zangada com Michael, com a mãe dele, zangada com todos os estrangeiros italianos que não tinham sequer a cortesia de demonstrar um interesse de simples amizade, mesmo que um caso de amor estivesse terminado. Não sabia Michael que ela ainda se interessava por ele como uma pessoa amiga, mesmo que ele não a quisesse mais para companheira de cama, mesmo que não quisesse mais casar com ela? Pensava Michael que ela era uma dessas pobres e ignorantes moças italianas que cometeriam suicídio ou fariam uma cena após terem perdido a virgindade e serem abandonadas? Mas ela manteve a voz tão fria quanto possível.

— Eu compreendo, muito obrigada — disse ela. — Estou contente por que Michael se encontra novamente em casa e está bem. Queria apenas saber. Não telefonarei mais para a senhora.

A voz da Sra. Corleone veio impacientemente através do fio, como se ela não tivesse ouvido nada do que Kay dissera.

— Você precisa ver Mikey, venha aqui agora mesmo. Faça-lhe uma boa surpresa. Tome um táxi, vou dizer ao homem do portão para pagar o táxi para você. Diga ao motorista que ele vai receber o dobro do que marcar o relógio, do contrário não vai querer vir a Long Beach. Mas não pague. O empregado de meu marido que está no portão pagará a corrida.

— Não posso fazer isso, Sra. Corleone — respondeu Kay friamente. — Se Michael quisesse me ver, teria telefonado para minha casa antes disso. Certamente ele não quer reatar amizade comigo.

A voz da Sra. Corleone veio energicamente pelo fio.

— Você é uma moça muito distinta, tem pernas bonitas, mas não tem muita cabeça.

Kay conteve o riso.

— Você vem ver a mim, não Mikey — acrescentou. — Quero falar com você. Venha agora mesmo. E não pague o táxi. Estou esperando você.

O telefone deu um estalido. A Sra. Corleone desligara.

Kay podia chamar novamente e dizer que não ia, mas sabia que precisava ver Michael, falar com ele, mesmo que fosse apenas uma conversa formal. Se ele estava em casa agora, abertamente, isso queria dizer que não havia mais dificuldades, que podia viver normalmente. Ela pulou da cama e começou a se aprontar para ir vê-lo. Caprichou bastante na maquilagem e no modo de vestir-se. Quando já estava pronta para sair, olhou para sua imagem no espelho. Estaria ela com melhor aparência do que quando Michael desaparecera? Ou será que ele a acharia desgraciosamente mais velha? Sua figura se tornara mais feminina, suas cadeiras mais redondas, seus seios maiores; os italianos aparentemente gostavam disso, embora Michael sempre dissesse que gostava dela magra mesmo. Isso realmente não importava, Michael evidentemente não queria mais nada com ela, do contrário teria certamente telefonado nos seis meses em que já estava em casa.

O motorista do táxi, para o qual ela fez sinal, recusou-se a levá-la a Long Beach até que ela deu um belo sorriso, dizendo-lhe que pagaria o dobro do que marcasse o taxímetro. A viagem durou quase uma hora e a alameda de Long Beach estava mudada desde que ela a vira pela última vez. Havia grades de ferro em toda a volta e um portão de ferro obstruía a entrada da alameda. Um homem usando calças largas e um paletó branco sobre uma camisa vermelha abriu o portão, meteu a cabeça no táxi para ver quanto marcava o taxímetro e deu ao motorista algumas notas. Depois, quando Kay viu que o motorista não estava protestando e ficou satisfeito com o dinheiro que recebeu, ela saltou e caminhou pela alameda na direção da casa do centro.

A própria Sra. Corleone abriu a porta e recebeu Kay com um abraço caloroso que a surpreendeu. Depois examinou Kay, medindo-a de alto a baixo.

— Você é uma moça bonita — disse ela diretamente. — Tenho filhos estúpidos.

Ela puxou Kay para dentro da porta e levou-a para a cozinha, onde um prato de comida já estava posto na mesa e um bule de café se achava sobre o fogo.

— Michael vai chegar daqui a pouco — disse ela. — Você vai surpreendê-lo.

Sentaram-se juntas e a velha forçou Kay a comer, enquanto fazia perguntas com grande curiosidade. Estava encantada por saber que Kay era professora e que viera a Nova York visitar umas amigas e que tivesse apenas 24 anos de idade. Ela continuava a acenar com a cabeça como se todos os fatos concordassem com certas especificações particulares que ela tinha na mente. Kay estava tão nervosa que apenas respondia às perguntas, não dizendo mais nada.

Kay o viu primeiro pela janela da cozinha. Um carro parou na frente da casa, dele saltaram dois homens seguidos de Michael. Ele endireitou-se para falar com um dos outros homens. O seu perfil esquerdo ficou exposto à vista dela. Estava quebrado, amassado, era como o rosto de uma boneca que uma criança tivesse pisado de propósito. De modo curioso, para os olhos de Kay, isso não tirava a beleza dele, mas comovia-a até às lágrimas. Ela o viu levar um lenço branco á boca e ao nariz por um momento, enquanto se virava para entrar na casa.

Kay ouviu a porta se abrir e os passos dele no corredor virando para entrar na cozinha e de repente Michael estava no espaço aberto, olhando para ela e sua mãe. Michael parecia impassível e depois sorriu, sendo que a parte quebrada do seu rosto impedia a abertura normal de sua boca. E Kay, que pretendia apenas dizer: “Alô, como vai você?” da maneira mais fria possível, levantou-se bruscamente da cadeira para correr para os seus braços e enterrou o rosto no ombro dele. Michael beijou a face molhada de Kay e segurou-a até que ela terminou de chorar, e então a levou até o seu carro, enquanto ela com um lenço limpava o que restava da maquilagem de seu rosto.