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Kay riu dessa declaração de autoconfiança, era um riso com um misto engraçado de orgulho e diversão.

— Mas como pode você dizer isso? — perguntou ela. — Francamente.

Michael deu um suspiro.

— Estas são justamente as coisas sobre as quais não posso falar a você, sobre as quais não quero falar a você.

Kay permaneceu calada por muito tempo.

— Por que você quer casar comigo depois de não ter-me telefonado por todos esses meses? Sou tão boa assim na cama?

Michael acenou com a cabeça gravemente.

— Exatamente — respondeu ele. — Mas estou fazendo isso de graça, logo, por que não devo casar com você por isso? Olhe, não quero a resposta agora. Vamos continuar a nos encontrar. Você pode falar com os seus pais. Ouvi dizer que o seu pai é um homem duro à moda dele. Ouça o conselho dele.

— Você não respondeu por que quer casar comigo — insistiu Kay.

Michael tirou um lenço da gaveta da mesinha-de-cabeceira. Assoou-se nele, depois limpou o nariz.

— Você tem o melhor motivo para não casar comigo — disse ele. — Que tal ter um sujeito ao lado que está sem o nariz?

Kay voltou a insistir com impaciência:

— Vamos, falemos sério, eu lhe fiz uma pergunta.

Michael segurou o lenço na mão.

— Está bem — concordou ele — agora mesmo. Você é a única pessoa por quem sinto alguma afeição, de quem eu gosto. Não telefonei para você porque jamais me ocorreu que pudesse ainda estar interessada em mim depois de tudo o que aconteceu. É verdade, eu podia ter perseguido você, podia ter confiado em você, mas não quis fazer isso. Agora eis uma coisa que vou confidenciar a você e não quero que repita isso nem mesmo a seu pai. Se tudo correr bem, a Família Corleone ficará completamente legal daqui a cinco anos. Algumas coisas complicadas têm de ser feitas para tornar Isso possível. Este o motivo por que talvez você se tome uma viúva rica. Agora, para que quero você? Bem, porque gosto de você e quero ter uma família. Quero filhos; já é tempo. E não quero que meus filhos sejam influenciados por mim da manei ra que eu fui por meu pai. Não quero dizer que meu pai me influenciou deliberadamente. Ele nunca fez isso. Nem me queria sequer no negócio da Família. Ele queria que eu me tornasse professor ou doutor, algo como isso. Mas as coisas correram mal e eu tive de lutar pela minha família. Tive de lutar porque amo e admiro meu pai. Jamais conheci um homem mais digno de respeito. Sempre foi um bom marido, um bom pai e um bom amigo para as pessoas que não eram muito felizes na vida. Ele tem outro lado, mas isso não me interessa como seu filho. De qualquer modo, não quero que isso aconteça a meus filhos. Quero que eles sejam influenciados por você. Quero que cresçam como meninos cem por cento americanos, realmente cem por cento americanos, todos eles. Talvez eles ou os netos deles ingressem na política.

Michael arreganhou os dentes e continuou:

— Talvez um deles seja presidente dos Estados Unidos. Por que diabo não? Em meu curso de História, em Dartmouth, fizemos um levantamento dos ancestrais de todos os presidentes e descobrimos que os pais e avós de alguns tiveram a sorte de não morrer na forca. Mas arranjarei para que os meus filhos sejam doutores, músicos ou professores. Jamais entrarão no negócio da Família. Na época em que eles tiverem essa idade, já estarei aposentado. E você e eu faremos parte do grupo de membros de um clube campestre, teremos a vida boa dos americanos abastados. Qual a sua impressão sobre essa minha proposta?

— Maravilhosa — respondeu Kay. — Mas você como que saltou a parte da viúva.

— Não há muita possibilidade disso. Apenas a mencionei para dar sensação.

Michael bateu-lhe de leve no nariz com o lenço.

— Não acredito, não acredito que você seja um homem assim, você exatamente não é — disse Kay.

O rosto dela apresentava um ar perplexo. E ela continuou:

— Não consigo compreender a coisa toda, como isso poderia ser.

— Bem, não vou dar mais explicações — disse Michael delicadamente. — Você sabe, não precisa pensar em nenhuma dessas coisas, isso realmente nada tem a ver com você ou com a nossa vida juntos, se nos casarmos.

Kay balançou a cabeça.

— Como pode você querer casar comigo, como pode você insinuar que gosta de mim, você nunca me disse isso, mas acaba de dizer que gosta de seu pai, você nunca disse que gostava de mim, como pode gostar de mim, se desconfia tanto de mim que não pode contar-me as coisas mais importantes de sua vida? Como pode querer ter uma esposa na qual não pode confiar? O seu pai confia na sua mãe. Eu sei disso.

— É verdade — respondeu Michael. — Mas isso não quer dizer que ele conta tudo a ela. E, você sabe, ele tem razão para confiar nela. Não porque eles se casaram e ela é mulher dele. Mas ela lhe deu quatro filhos nos tempos em que não era tão seguro ter filhos. Ela cuidou dele e o protegeu quando os outros atiravam nele. Ela acreditava nele. Ele foi sempre a pessoa a quem ela dedicou a maior lealdade durante quarenta anos. Depois de você fazer isso, talvez eu lhe conte algumas coisas que você realmente não quer ouvir.

— Teremos de viver na alameda? — perguntou Kay.

Michael acenou a cabeça afirmativamente.

— Teremos a nossa própria casa, não será assim tão ruim. Meus pais não se meterão. Teremos a nossa própria vida. Mas até que se acerte tudo, tenho de viver na alameda.

— Porque é perigoso, para você, viver fora dela — retrucou Kay.

Pela primeira vez desde que o conhecia, ela viu Michael zangado. Era uma zanga fria que não foi externada por qualquer gesto ou alteração da voz. Era uma frieza que se desprendia dele como a morte, e Kay sabia que era essa frieza que a faria decidir-se a não se casar com ele se ela assim decidisse.

— A complicação toda vem dessa porcaria que se vê no cinema e nos jornais — afirmou Michael. — Você tem uma idéia errada do meu pai e da Família Corleone. Vou dar a última explicação e esta será realmente a última. Meu pai é um homem de negócios que procura ganhar dinheiro para prover a subsistência da mulher e dos filhos ë daqueles amigos de que ele possa precisar algum dia numa hora de dificuldade. Ele não aceita as regras da sociedade em que vivemos porque tais regras o condenariam a uma vida inadequada para um homem como ele, um homem de extraordinária força de caráter. O que você precisa compreender é que ele se considera igual a todos esses grandes homens como presidentes, primeiros-ministros, juizes da Corte Suprema e governadores dos Estados. Ele se recusa a aceirtar a vontade deles acima da dele própria. Ele se recusa a viver pelas regras estabelecidas pelos outros, regras que o condenam a uma vida frustrada. Mas o objetivo supremo de meu pai é entrar nessa sociedade com certo poder, já que a sociedade não protege realmente os seus próprios membros, que não possuem poder individual. Enquanto isso, ele opera com base num código de ética que considera muito superior às estruturas legais da sociedade.

— Mas isso é ridículo — retrucou Kay, incredulamente. — Que aconteceria se todo mundo sentisse a mesma coisa? Como poderia funcionar a sociedade Voltaríamos aos tempos dos homens das cavernas. Mike, você não acredita no que está dizendo, acredita?

Michael arreganhou os dentes para ela

— Estou apenas lhe dizendo em que meu pai acredita. Quero apenas que você compreenda que, seja lá o que ele for, ele não é responsável, ou pelo menos não na sociedade que ele criou. Meu pai não é um gangster maluco armado de metralhadora como parece que você pensa. Ele é um homem responsável à sua própria moda.

— E em que você acredita? — perguntou Kay calmamente.

Michael deu de ombros.

— Acredito em minha família — respondeu. — Acredito em você e na familia que podemos ter. Não confio que a sociedade nos proteja, não tenho a intenção de colocar o meu destino nas mãos de homens cuja única qualificação consiste em procurar convencer um grupo de pessoas a votar neles. Mas isso é por enquanto. A época de meu pai já passou. As coisas que ele fez não podem mais ser feitas, a menos que se corra um bocado de risco. Quer gostemos disso ou não, a Família Corleone tem de se juntar a essa sociedade. Mas quando o fizer, quero que nos juntemos a ela com uma grande parte de nosso próprio poder; isto é, dinheiro e propriedade de outros valores. Eu gostaria de garantir meus filhos tanto quanto possível antes que eles se juntem a esse destino geral.