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— Assim, passei a fazer abortos. Interessante e fácil, todo mundo feliz, é como lavar os pratos e deixar a pia limpa. Esta era a minha classe. Eu gostava disso, gostava de praticar abortos. Não acredito que um feto de dois meses é um ser humano, portanto não há problemas aí. Eu ajudava jovens solteiras e mulheres casadas que se encontravam em dificuldade, e fazia bom dinheiro. Estava longe das linhas de frente. Quando me apanharam senti-me como um desertor que tivesse sido preso. Mas tive sorte, um amigo mexeu os pauzinhos e conseguiu safar-me, mas agora os grandes hospitais não me deixam operar. Assim, estou aqui. Dando bons conselhos novamente, dos quais ninguém quer tomar conhecimento como nos velhos tempos.

— Não estou deixando de tomar conhecimento — retrucou Johnny Fontane. — Estou pensando que decisão devo tomar.

Lucy finalmente mudou de assunto.

— Que está você fazendo em Las Vegas, Johnny? Descansando de seus pesados encargos como uma das peças importantes de Hollywood, ou trabalhando?

Johnny balançou a cabeça e respondeu:

— Mike Corleone quer me ver e falar comigo. Ele vai chegar esta noite de avião com Tom Hagen. Tom disse que eles querem ver você, Lucy. Você sabe de que se trata?

Lucy balançou a cabeça.

— Todos nós jantaremos juntos amanhã à noite. Freddie também. Penso que tem alguma coisa a ver com o hotel. O cassino tem perdido dinheiro ultimamente, o que não deve acontecer. Don Corleone quer que Mike examine a situação.

— Ouvi dizer que Mike finalmente consertou o rosto — disse Johnny.

Lucy deu uma gargalhada.

— Acho que Kay o convenceu a fazer isso. Ele não o fez quando eles se casaram. Por quê? Era tão esquisito e fazia o seu nariz ficar pingando. Ele devia ter feito antes.

Ela fez uma pausa por um momento e prosseguiu:

— Jules foi chamado pela Família Corleone para essa operação. Ele serviu de consultor e observador.

Johnny acenou com a cabeça e disse secamente:

— Eu lhe recomendei que fizesse isso.

— Oh — retrucou Lucy. — De qualquer modo, Mike disse que queria fazer alguma coisa por Jules. Esse é o motivo por que ele quer que jantemos juntos amanhã á noite.

Jules falou pensativamente:

— Ele não confia em ninguém. Avisou-me para acompanhar tudo o que os outros faziam. Foi uma operação comum, direita. Qualquer médico competente a faria.

Ouviu-se um ruído vindo do quarto de dormir do apartamento e eles olharam para o reposteiro. Nino voltara a si novamente. Johnny levantou.se e foi sentar-se na cama. Jules e Lucy foram até lá também. Nino deu-lhe um riso pálido.

— Está bem, vou deixar de ser um sujeito esperto. Sinto-me realmente repugnante. Johnny, lembra-se, há um ano atrás, o que aconteceu quando a gente estava com aquelas zinhas lá em Palm Springs? Juro que não tive ciúme do que aconteceu. Eu estava contente. Você acredita em mim, Johnny?

Johnny respondeu tranqüilizadoramente:

— Certamente, Nino, acredito em você.

Lucy e Jules olharam um para o outro. Por tudo o que tinham ouvido a respeito de Johnny Fontane parecia impossível que ele tomasse uma garota de um amigo íntimo como Nino. E por que Nino dizia que não tinha ciúme um ano depois de haver acontecido? O mesmo pensamento passou-lhe pela mente, que Nino estava bebendo para morrer romanticamente porque uma garota o deixara para ir com Johnny Fontane.

Jules experimentou Nino novamente.

— Vou arranjar uma enfermeira para passar a noite aqui com você — disse Jules. — Você tem realmente de ficar alguns dias na cama. Não estou brincando.

Nino sorriu.

— Está bem, doutor, apenas não arranje uma enfermeira bonita.

Jules telefonou para a enfermeira e depois ele e Lucy se retiraram. Johnny sentou-se numa cadeira perto da cama para esperar a enfermeira. Nino estava adormecendo novamente, com um ar de cansaço no rosto. Johnny pensou no que ele dissera, em não ter ciúme do que acontecera há mais de um ano com aquelas duas zinhas lá em Paim Springs. Nunca lhe passara pela cabeça a idéia de que Nino pudesse ter ficado com ciúme.

Há cerca de um ano, Johnny Fontane estava sentado no luxuoso escritório da companhia cinematográfica que dirigia, e se sentia entediado como nunca se sentira na vida. O que era de admirar, pois o primeiro filme que produzira, tendo ele próprio como galã e Nino num papel destacado, estava fazendo montanhas de dinheiro. Tudo funcionara bem. Todos desempenharam bem sua tarefa. O filme fora produzido abaixo do orçamento prefixado. Todo mundo ia ganhar uma fortuna com ele, e Jack Woltz estava perdendo dez anos de sua vida. Agora Johnny tinha mais dois filmes em produção, sendo que ele teria o principal papel num deles e Nino no outro. Nino era grande na tela como um desses jovens galãs encantadores, fascinantes, que as mulheres gostavam de acariciar entre os seios. Pobre menino perdido! Tudo o que tocava transformava-se em dinheiro, que entrava a rodo. O Padrinho ganhava a sua percentagem através do banco, e isso fazia Johnny sentir-se bem. Ele justificara a fé do Padrinho. Mas no momento aquilo não estava ajudando muito.

E agora. que ele era um vitorioso produtor cinematográfico independente, tinha tanto poder, talvez mais do que tivera como cantor. Mulheres bonitas caíam em cima dele tal como antes, embora por um motivo mais comercial. Ele possuía o seu próprio avião, vivia até mais perdulariamente, com os rendimentos especiais que um homem de negócios tem que os artistas não possuem. Então, que diabo o estava aborrecendo?

Johnny sabia o que era. A parte frontal da cabeça lhe doía, as passagens nasais lhe doíam, a sua garganta comichava. O único meio pelo qual ele podia coçar e aliviar essa comichão era cantando, e ele tinha medo até de cantar. Telefonara para Jules Sega! a respeito, perguntando quando poderia tentar cantar, e Jules respondera que a qualquer momento que tivesse vontade. Assim, ele tentara, e a voz soara tão áspera e horrorosa que desistira. E a sua garganta doeria como o diabo no dia seguinte, doeria de modo diferente daquele como antes de serem tiradas as verrugas. Doeria mais, queimaria. Johnny tinha medo de continuar a cantar, medo de perder a voz para sempre ou de arruiná-la.

E se ele não podia cantar, que diabo valia o resto? O resto era merda. Cantar era a única coisa que ele sabia. Talvez soubesse mais sobre canto e seu tipo de música do que qualquer outra pessoa no mundo. Ele era muito bom, agora compreendia isso. Todos esses anos fizeram dele um verdadeiro profissional. Ninguém precisava dizer-lhe o que era certo ou errado, ele não tinha de perguntar a ninguém. Ele sabia. Que desperdício, que maldito desperdício.

Era sexta-feira, e resolvera passar o fim de semana com Virginia e as meninas. Telefonara para ela, como sempre fazia, para preveni-la de sua visita. Na verdade, para dar-lhe a oportunidade de dizer “não”. Ela nunca dizia “não”. Nem uma só vez em todos esses anos em que estavam divorciados. Por que ela jamais diria “não” a um encontro das suas filhas com o pai.

Que mulher!, pensava Johnny. Ele dera sorte com Virginia. E embora soubesse que gostava mais dela do que de outra mulher, sabia que era impossível, para eles, viverem sexualmente juntos. Talvez quando tivessem 65 anos de idade, quando as pessoas geralmente se aposentam, eles se aposentassem juntos.

Mas a realidade destruiu esses belos pensamentos, quando ele chegou na casa da ex-esposa e verificou que Virginia estava um pouco rabugenta e as duas meninas não se sentiam loucas para vê-lo, porque tinham prometido passar o fim de semana com algumas amigas numa fazenda da Califórnia onde poderiam andar a cavalo.

Ele disse a Virginia que mandasse as meninas para a fazenda e deu-lhes um beijo de despedida com um sorriso de satisfação. Johnny as compreendia bem. Que criança não gostaria mais de andar a cavalo numa fazenda do que ficar junto de um pai rabugento que escolhia seus próprios momentos de ser pai? Ele falou para Virginia:

— Vou tomar uns tragos e depois me arranco também.