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— Agora, ouça-me — pediu ele — se você tivesse tido uma educação moderna decente, com uma cultura familiar que fizesse parte do século XX, seu problema teria sido resolvido há anos. Agora deixe-me dizer qual é o seu problema: não é ser feia, nem ter uma pele ruim e nem ser estrábica, de modo que a cirurgia plástica de fato não resolva. Seu problema é como se você tivesse uma verruga ou sinal no queixo, ou uma orelha de forma defeituosa. Pare de pensar nisso em termos sexuais. Tire da cabeça a idéia de que você tem uma boceta larga, da qual nenhum homem pode gostar, porque não dá ao seu pênis a fricção necessária, O que você tem é uma deformação pélvica a que nós cirurgiões chamamos de fraqueza da bacia pélvica. Geralmente vem depois do parto, mas pode ser simplesmente má estrutura óssea. Ë uma anormalidade comum, e muitas mulheres levam uma vida miserável por causa dela, quando uma operação poderia corrigi-la. Algumas mulheres chegam ao suicídio por causa disso. Nunca imaginei que você tivesse essa anormalidade, porque tem um corpo muito bonito. Pensei que fosse um caso psicológico, já que conheço a sua história com Sonny e você me contou bastantes vezes. Deixe-me submeter você a um exame físico completo e lhe direi exatamente o trabalho que terá de ser feito. Agora vá tomar um banho de chuveiro.

Lucy foi tomar seu banho de chuveiro. Pacientemente, sob os protestos dela, Jules fê-la deitar-se na cama, com as pernas escarrapachadas. Em seu apartamento, ele tinha uma bolsa de médico, a qual estava aberta. Havia também uma pequena mesa com tampo de vidro, ao lado da cama, sobre a qual se encontravam outros instrumentos. Agora, era exclusivamente médico, examinando-a, enfiando-lhe os dedos na vagina e movendo-os em torno. Lucy estava começando a sentir-se humilhada, quando ele a beijou no umbigo.

— Foi a primeira vez que fiz meu trabalho com prazer — disse Jules distraído.

Em seguida, virou-a de bruços e introduziu-lhe um dedo no reto, apalpando em torno, e com a outra mão, acariciava-lhe meigamente o pescoço. Quando acabou, virou-a novamente de barriga para cima e beijou-a carinhosamente na boca.

— Meu bem — falou ele — vou construir uma coisa inteiramente nova lá embaixo, e depois vou prová-la pessoalmente. Será um trabalho médico. Espero poder escrever um estudo sobre ele para as revistas especializadas.

Jules fez tudo com uma afeição bem-humorada, gostava tanto dela, que Lucy perdeu o acanhamento e o embaraço. Ele tirou um compêndio de medicina da estante, para mostrar-lhe um caso igual ao seu e o processo operatório para corrigi-lo. Lucy demonstrou bastante interesse pelo assunto.

— É um caso de saúde também — disse Jules. — Se você não o corrigir agora, mais tarde vai ter um bocado de complicação com todo o seu sistema de tubulação. A estrutura vai-se tomando cada vez mais fraca, a menos que seja corrigida por meio de operação. Ë uma vergonha inominável que a pudicícia antiquada impeça que muitos médicos diagnostiquem e corrijam adequadamente a situação, e que inúmeras mulheres se queixem disso.

— Não fale mais no assunto, por favor, não fale mais nisso — pediu Lucy.

Jules compreendeu que ela ainda estava, até certo ponto, envergonhada do seu segredo, embaraçada pelo seu “feio defeito”. Embora para a sua mente afeiçoada à medicina isso parecesse o cúmulo da idiotice, ele foi bastante sensível para identificar tal coisa nela. Também o pôs no caminho certo para fazê-la sentir-se melhor.

— Está bem, conheço o seu segredo, assim vou agora contar o meu — disse ele. — Você sempre me pergunta o que estou fazendo aqui nesta cidade, um dos mais jovens e mais brilhantes cirurgiões do Leste.

Ele zombou de algumas reportagens jornalísticas sobre a sua pessoa. E continuou:

— A verdade é que sou um especialista em abortos, o que em si mesmo não é tão mau, pois faz parte da profissão médica; mas fui apanhado. Eu tinha um amigo, um médico chamado Kennedy, fomos internos juntos, e ele é um sujeito realmente direito, mas disse que me ajudaria. Sei que Tom Hagen disse a ele que, se precisasse de ajuda alguma vez em qualquer coisa, a Família Corleone se sentia devedora dele. Assim, ele falou com Hagen. O que sei é que as acusações foram retiradas, mas a Associação Médica e a sociedade do Leste me puseram na lista negra. Assim, a Família Corleone conseguiu-me este emprego aqui. Tiro uma boa “nota”. Faço um trabalho que tem de ser feito. Essas garotas do show estão sempre sendo emprenhadas, e fazê-las abortar é a coisa mais fácil do mundo quando elas me procuram imediatamente. Faço-lhes uma curetagem como qualquer mulher raspa uma frigideira. Freddie Corleone é um verdadeiro terror. Pela minha conta, ele já emprenhou umas quinze garotas desde que estou aqui. Estou pensando seriamente em manter com ele uma conversa de pai para filho sobre sexo. Especialmente porque já tive de tratá-lo três vezes de gonorréia e uma de sífilis. Freddie é do tipo que não gosta de usar qualquer preventivo ou proteção.

Jules parou de falar. Havia sido deliberadamente indiscreto, coisa que ele nunca fora, para que Lucy soubesse que outras pessoas, inclusive alguém que ela conhecia e temia como Freddie Corleone, tinham também segredos vergonhosos.

— Pense nisso como um pedaço de elástico no seu corpo que perdeu a elasticidade — disse Jules. — Cortando um pedacinho, ele se torna mais apertado, mais vigoroso.

— Vou pensar nisso — respondeu Lucy, mas tinha certeza de que realizaria aquilo, tinha confiança em Jules Depois ela pensou em outra coisa. — Quanto custará?

Jules franziu as sobrancelhas.

— Não tenho aqui a aparelhagem necessária para uma operação como essa e não sou especialista no assunto. Mas tenho um amigo em Los Angeles que é um bamba no assunto e tem a aparelhagem do melhor hospital. De fato, ele aperta todas as estrelas do cinema, quando essas senhoras descobrem que ter o rosto e os seios erguidos não é o suficiente para fazer um homem amá-las. Ele me deve alguns favores, de modo que não custará nada. Eu faço os abortos das clientes dele. Escute, se não fosse contra a ética eu lhe daria o nome de algumas artistas extremamente sensuais do cinema que fizeram a operação.

Ela ficou imediatamente curiosa.

— Oh, vamos, diga — pediu ela. — Diga.

Seria um delicioso assunto de conversação e uma das coisas que agradavam a Jules era que assim ela pudesse mostrar seu pendor feminino pelo mexerico sem que ele risse daquilo.

— Eu lhe contarei se você jantar comigo e passar a noite em minha companhia — respondeu Jules. — Temos um bocado de tempo perdido para recuperar por causa de sua idiotice.

Lucy sentiu uma imensa satisfação por ele ser assim tão generoso e re trucou:

— Você não precisa dormir comigo, sabe que não sentirá prazer da maneira como estou agora.

Jules explodiu na gargalhada.

— Sua boba, sua grande boba. Você nunca ouviu falar em outro modo de fazer amor, muito mais antigo, muito mais civilizado? Será que você é assim tão inocente?

— Oh, isso? — respondeu ela.

— Oh, isso? — remedou ele. — Garotas distintas não fazem isso, homens viris não fazem isso. Mesmo no ano de 1948. Bem, querida, posso levar você à casa de uma velhinha exatamente aqui em Lãs Vegas que era a caftina mais moça do bordel mais popular nos velhos tempos do Oeste, lá por 1880, penso eu. Ela gosta de falar nos velhos tempos. Você sabe o que ela me disse? Que aqueles pistoleiros, aqueles cowboys másculos, viris, de tiro certeiro pediam às garotas que lhes proporcionassem um “gozo à francesa”, o que nós médicos chamamos felação, o que você chama, “oh, isso?” Você pensou alguma vez em fazer “oh, isso?” com o seu querido Sonny?

Pela primeira vez, ela realmente o surpreendeu. Virou-se para Jules com o que ele poderia pensar apenas que fosse o sorriso da Mona Lisa (seu espírito científico imediatamente voando até a tangente, poderia ser essa a solução desse mistério que já dura séculos?) e respondeu calmamente: