Выбрать главу

A Fundação Arkan é uma organização que tem a paz como

lema e que se esforça por promover acções que ponham

fim à conflitualidade no nosso planeta.

O Projecto Yehoshua é uma pedra central nessa missão.

Ao trazer Jesus de regresso à Terra, iremos prestar o

melhor e mais inestimável dos serviços à humanidade.

Se contactássemos a polícia para dar essas informações,

o projecto deixaria de ser secreto e a missão ficaria

irreversivelmente comprometida.

Residia aí o cerne do nosso dilema. Deveríamos cooperar

com a polícia e arruinar o projecto ou manter-nos

silenciosos e tentar salvar um projecto que pode ser

crucial para a paz no planeta?

O que era mais importante?

Qual o nosso dever prioritário?”

“Estou a ver o conflito”, observou Tomás.

“Não se tratava realmente de uma posição fácil...”

“Nada fácil!”, sublinhou Arkan. “Depois de uma grande

discussão, concluímos que a paz no mundo estava acima

de tudo e por isso escolhemos manter o projecto em

segredo.”

Apontou para o português e para a italiana.

“Daí que, quando há dias vocês me apareceram lá na

fundação, tenha optado por me manter calado a propósito

de tudo isto. Mas o facto é que este caso me deixou com

os nervos à flor da pele e... enfim, receio ter-me

exaltado um pouco durante a nossa conversa. Espero que

me desculpem.”

O historiador trocou um sorriso cúmplice com a

inspectora da Policia Giudiziaria.

“Oh, não há problema.”

O olhar de Arkan desviou-se para o tubo de ensaio que

mantinha entre os dedos.

“Claro que agora há uma outra questão que...”

As

palavras

do

anfitrião

foram

nesse

momento

interrompidas por um grito estranho, arrancado com uma

mistura sinistra de selvajaria e loucura. Os quatro

viraram-se e viram um homem de negro aparecer com um

objecto cintilante numa das mãos.

E a morte no olhar.

LXXI

Embora parecesse um halo fantasmagórico de luz a

tremeluzir no ar, a lâmina cortou o espaço com a

precisão de uma bala e cravou-se com um ruído seco no

braço de Arkan. O presidente da fundação largou de

imediato o tubo de ensaio e soltou um urro de dor e de

terror.

Acto contínuo, o corpo de Sicarius, que vinha em voo a

empunhar a adaga, abateu-se com todo o seu peso sobre a

vítima. Desequilibrado pela dor no braço e pelo impacto

inesperado, Arkan desabou desamparado sobre o

congelador aberto e embateu com a cabeça no gelo,

perdendo a consciência.

O tubo de ensaio tombou no solo e, devido à sua

estrutura cilíndrica, começou a rolar pelo chão.

Apercebendo-se de que o objecto se escapava, o agressor

hesitou uma fracção de segundo quanto ao que fazer a

seguir. O seu primeiro instinto foi apanhar o tubo de

ensaio, a prioridade da missão, mas travou o movimento.

Antes teria de neutralizar as restantes ameaças.

A hesitação, porém, foi tudo aquilo de que Tomás

precisou para recuperar da surpresa e reagir.

O português reconheceu os movimentos do atacante; era

de certeza o homem que lhe fizera a emboscada no seu

quarto de hotel e quase o havia degolado.

Na altura apercebera-se da grande destreza e força

física do agressor, pelo que não tinha dúvidas de que

ele seria capaz de os matar aos quatro em menos de dois

minutos.

A sua única hipótese era tirar partido do desequilíbrio

momentâneo do desconhecido e não lhe dar tempo para

recuperar.

Sem perder um instante que fosse, e consciente de que a

vulnerabilidade

do

atacante

era

passageira,

o

historiador aproveitou o facto de Sicarius se encontrar

de gatas sobre o corpo inerte de Arkan para lhe

desferir um violento pontapé no rosto com a biqueira do

sapato.

“Toma!”

Atingido pelo impacto brutal do pontapé, o agressor deu

uma cabeçada para trás e rolou pelo chão.

O ataque seria suficiente para deixar qualquer um fora

de combate por alguns minutos, mas não aquele homem.

O desconhecido pôs-se de pé num salto e apalpou o rosto

dorido.

O nariz estava torto, decerto partido, e jorrava-lhe

sangue abundante pela narina esquerda. Tocou na ferida,

sentiu uma dor lancinante e olhou para o líquido

vermelho-vivo que lhe molhava a ponta dos dedos.

Atirou de imediato um olhar de morte ao homem que o

pontapeara, como se a partir desse instante aquilo já

não fosse uma mera missão, mas uma questão pessoal.

“Vais pagar caro!...”

Tomás apercebeu-se de que tinha perdido quase toda a

vantagem. Havia atingido o atacante com o máximo de

força de que era capaz e não o pusera fora de combate.

Ele ficara combalido, era certo, mas já estava de pé e,

de nariz torcido e ensanguentado, fitava-o com um ódio

indisfarçável. Não havia dúvidas de que, mesmo ferido

daquela maneira no rosto, a sua capacidade de combate

era infinitamente superior à de qualquer outra pessoa

naquela câmara.

Havia, porém, um pequeno trunfo que talvez permanecesse

do lado do português.

Tratava-se do tubo de ensaio que rolara pelo chão.

Até que ponto era o ADN de Jesus precioso para o

agressor?

Com um movimento rápido, Tomás baixou-se e apanhou o

objecto congelado. Quando se ergueu, viu o assaltante

dar um passo na sua direcção, uma expressão letal

estampada no rosto.

Talvez pegar no tubo de ensaio não tivesse sido uma

ideia

tão

boa

como

inicialmente

considerara,

raciocinou.

O homem parecia valorizar o conteúdo do invólucro acima

de tudo o mais; afinal fora Arkan, que antes o segurava

na mão, o primeiro a ser atacado. Se até àquele momento

Tomás não tinha passado de um mero obstáculo, com o

pontapé que desferira e o tubo de ensaio em que pegara

tornara-se definitivamente o alvo a abater.

O historiador sentiu a indecisão tolher os dois

polícias perante os acontecimentos inesperados que se

sucediam a velocidade estonteante, mas sabia que não

havia tempo a perder.

Grossman e Valentina não tinham visto o agressor em

acção e não podiam perceber quão perigoso ele era.

Tomás, porém, já experimentara na pele um ataque

daquele homem e tinha a perfeita noção do perigo que

todos corriam. Ao pegar no tubo de ensaio congelado

tornara-se ele próprio inadvertidamente o cordeiro

sacrificial.

Que o fosse, pensou; o importante era que Valentina se

salvasse!

“Dê-me o tubo de ensaio!”, ordenou a italiana,

estendendo-lhe a mão.

“Já!”

Isso estava fora de causa, raciocinou o português.