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erguendo de novo o punho para preparar mais um murro no

mesmo sítio.

“Onde está?”

O primeiro soco fora tão doloroso que estava fora de

questão manter a recusa de responder.

Tomás indicou com um ligeiro movimento de cabeça o

corredor de onde viera.

“Lá atrás”, murmurou, ofegante e dorido.

“Escondi-o lá atrás.”

O agressor fixou os olhos no fundo do corredor.

“Macaco esperto”, murmurou.

Pegou na sua vítima pelo tecido do escafandro e forçou-

a a pôr-se de pé.

“Levanta-te! Leva-me até lá e mostra-me onde o

escondeste!”

Segurando Tomás pela parte de trás do escafandro, de

modo a garantir que ele não lhe fugiria, Sicarius

empurrou-o ao longo do corredor pelo caminho de

regresso.

O historiador cambaleou sob o efeito do pontapé e do

murro que o haviam atingido na face, mas conseguiu

manter-se de pé e, embora aos tropeções, começou a

andar.

Tentou ver o percurso diante dele, mas apercebeu-se de

que apenas o olho direito funcionava normalmente.

Fechou-o por momentos, para determinar a capacidade de

visão com o esquerdo. Apenas enxergou uma mancha

indistinta e constatou que esse olho mal se abria.

Estava decerto inchado, mas um receio maior toldou-lhe

o espírito.

Tê-lo-ia perdido?

Era difícil saber, mas o facto é que as pancadas haviam

sido muito violentas. Lembrou-se das palavras do

assaltante, que citara as Escrituras.

Os versículos de Levítico falavam em ‘olho por olho,

dente por dente’; naquele caso tinha antes sido nariz

por olho.

“Mais depressa!”, ordenou Sicarius, empurrando-o.

“Onde está o tubo de ensaio?”

Tomás precisava de um novo plano, e depressa. Mas o que

poderia fazer? Como poderia improvisar uma fuga

naquelas condições, cego do olho esquerdo e prisioneiro

de um guerreiro implacável? Haveria alguma maneira de

dar a volta à situação? Se ao menos tivesse uma arma!

Mas não. Apenas dispunha das mãos e elas eram o menor

dos receios do seu agressor. Não havia murro que lhe

pudesse dar que o pusesse knock-out. Tomás sabia-o e o

assaltante também. Talvez conseguisse desferir um soco

de surpresa, mas depois sujeitar-se-ia à retaliação.

Enquanto considerava as alternativas e tentava

desesperadamente congeminar um novo plano, chegaram ao

local onde o historiador havia escondido a amostra

congelada.

Ali estava, sobre uma prateleira, a estrutura metálica

com os diversos tubos de ensaio.

Um deles era o que continha o ADN de Jesus.

Deveria parar e entregar-lhe a amostra? Ou seria melhor

continuar?

Mas o que ganharia com isso quando o seu agressor se

apercebesse de que estava a fazer-se de parvo?

O hematoma no malar e o inchaço no olho esquerdo

aguentariam mais alguma pancada?

“É aqui”, anunciou com voz baixa, em rendição.

Apontou a estrutura metálica com os tubos de ensaio e

suspirou, claramente derrotado.

“É um destes.”

A atenção de Sicarius desviou-se para a fileira de

tubos de ensaio pendurados na estrutura.

“Qual deles?”

Tomás voltou-se, aparentemente para indicar a amostra

correcta, mas desferiu de repente um soco com a mão

direita em cheio no nariz do assaltante.

Em circunstâncias normais levaria de imediato com a

resposta, provavelmente mortífera.

Mas aquelas circunstâncias não eram normais, e o

português sabia-o bem. É que o nariz de Sicarius estava

partido, o que o tornava especialmente sensível ao mais

pequeno toque, quanto mais a um murro.

E que murro! Por baixo da luva do escafandro, a mão

direita de Tomás estava envolta em ligaduras. Tinham

sido colocadas no hospital de Jerusalém para proteger a

palma da mão da ferida feita quando agarrara a adaga do

assaltante durante a agressão no quarto do hotel. Com

as ligaduras a envolverem a mão, o punho do historiador

tornou-se especialmente duro e perigoso; era como se

tivesse uma socadeira metálica escondida na luva.

O impacto do punho endurecido pelas ligaduras revelou-

-se, por isso, brutal, sobretudo considerando que o

soco atingira o nariz partido. Sicarius caiu para trás,

estendeu-se no chão, as mãos agarradas ao rosto ferido,

o corpo a contrair-se de dor.

“Aaaaah!”, gritou.

Fez um esforço hercúleo e, apesar do sofrimento, voltou

a erguer-se, embora com equilíbrio instável e os olhos

cerrados.

“Vou matar-te, cão!”

A ideia de Tomás era deixar o seu agressor estendido e

fugir dali, mas o homem revelava uma resistência

espantosa e já se pusera de pé. Dentro de alguns

instantes teria a dor sob controlo e, quando isso

sucedesse, não haveria modo de o travar.

O historiador sabia-se perdido.

Era uma questão de segundos.

Sentiu-se tentado a correr dali para fora, mas

instintivamente percebeu que a fuga apenas adiaria o

inevitável. Quando recuperasse, o assaltante iria no

seu encalço e dessa vez nada o deteria. A situação

tinha de ser resolvida nesse momento, enquanto o homem

permanecia atordoado pela dor. Não haveria uma nova

oportunidade.

O português pegou num tubo de ensaio vazio e, com uma

palmada desferida pela mão protegida pelas ligaduras,

partiu-o em duas partes.

Pegou no tubo e contemplou-lhe as bordas estilhaçadas

de vidro. Tornara-se uma verdadeira lâmina.

Sem perder tempo, e consciente de que naquele momento

jogava a própria vida numa derradeira cartada, voltou-

se para o agressor e, com toda a força, espetou-lhe o

tubo de ensaio estilhaçado na garganta.

Os jactos de sangue jorraram em golfadas do pescoço de

Sicarius. A garganta do assaltante emitiu um som

ensopado, como se os canais de respiração fossem

invadidos pelo líquido vermelho.

O homem voltou a cair, contorcendo-se num esforço

desesperado

para

respirar,

dando

pontapés

desencontrados nos móveis que emparedavam o corredor.

Ao fim de alguns segundos os estertores tornaram-se

espaçados e, após um derradeiro espasmo das pernas, o

sangue deixou de esguichar para o chão e o corpo ficou

imóvel.

Tomás deixou-se tombar de joelhos, exausto devido ao

esforço.

Acabara de matar um homem.

Era

a

primeira

vez

que

o

fazia

e

virou-se

introspectivamente para ele próprio, tentado perceber o

que sentia.

Nada. Matara um homem e não sentia nada.

Era estranho, mas o que fizera não o incomodava. Talvez

fosse por causa do cansaço e das dores no rosto

esmurrado e na mão direita que esmurrara. Ou talvez

fosse por saber que acabava de vingar a sua amiga