a Israel? Desculpe, mas não entendo!...”
“Vocês, os cristãos, têm de perceber uma coisa”, disse
Grossman.
“Deus escolheu os judeus e fez connosco uma aliança
sagrada.
Há dois mil anos apareceu um rabino judeu chamado
Yehoshua, ou Jesus, que defendia o respeito escrupuloso
das Escrituras e da vontade soberana de Deus.
O que fizeram os seus seguidores com os ensinamentos
dele?
Deturparam-nos! Puseram-no a decretar a abrogação das
Escrituras, coisa que em vida Jesus jamais fez nem
autorizaria.
Chegaram ao cúmulo de o transformar num deus, adorando-
-o como a um ídolo pagão e violando da forma mais
desavergonhada o Shema, a declaração de que só há um
Deus, o mesmo Deus que o próprio Jesus considerava
único e que vocês transformaram numa trindade.
Como se esse ultraje não bastasse, os cristãos
apoderaram-se das nossas Escrituras e usurparam as
nossas tradições.
E o que querem fazer agora com este projecto louco?
Querem repetir tudo! Querem recriar Jesus e educá-lo de
maneira que ele apenas diga e faça o que vocês
consideram ser correcto.
Mas o que está correcto não é o que vocês pensam, é o
que Deus determinou e mandou escrever nas Escrituras,
as mesmas Escrituras que Jesus respeitava até ao último
jota!
Com a palhaçada deste projecto, pretendem apagar da
memória o facto de que Jesus era judeu e apenas judeu,
e planeiam fazer dele o cristão que ele não era.
Este projecto não passa de uma fantochada destinada a
transformar Jesus numa marioneta que irá papaguear o
que interessa a um grupo de pessoas.
Que acontecerá a Israel no meio desse processo?
Será varrido por um vendaval!
Vocês vão pôr esse novo Jesus a decretar a paz no
mundo, como se a paz se impusesse por decreto e os
problemas complexos se resolvessem por artes mágicas.
Seguindo a liderança do Jesus clonado e pacifista, o
Ocidente cristão deixará de nos apoiar e Israel ficará
à mercê do extremismo islâmico.
Por detrás das boas intenções estão desígnios que nos
arrastarão para o abismo.”
“Se pensa assim, porque não denunciou o projecto?
Porque não fez uma campanha ou recorreu aos tribunais?
Não era isso preferível a estes assassínios todos?”
Grossman soltou uma nova gargalhada sem humor.
“Fazer uma campanha? Recorrer aos tribunais?
Acha que sou parvo ou quê? Quem me ouviria?
Como decerto muito bem sabe, a maior parte das pessoas
tem uma ideia errada sobre Jesus. Os cristãos
desconhecem que Cristo não era cristão!
Se eu aparecesse em público a dizer que alguém estava a
tentar clonar Jesus para trazer a paz à Terra, haveria
protestos?
Provavelmente
suscitaria
um
aplauso
generalizado no Ocidente! Quem se iria opor a isso?
As pessoas não têm a menor ideia de quem Jesus era
realmente nem de quão ameaçador tal projecto seria!”
Abanou a cabeça.
“Não! Isto não podia ser tratado assim! Era preciso
cortar o mal pela raiz! Era preciso actuar como os
sicarii actuaram há dois mil anos!”
“Mas a alternativa foi pior”, argumentou Tomás.
“Vocês puseram-se a assassinar pessoas! Não é isso bem
mais grave?”
“Não se fazem omeletas sem partir ovos”, devolveu o
polícia. “Quando tive a informação de que este projecto
tinha sido posto em marcha, avisei os meus superiores
hierárquicos e tentei convencê-los a travar esta
loucura.
Sabe o que fizeram?
Riram-se! Riram-se na minha cara, os idiotas!
Mesmo assim arranjei maneira de informar o governo.
Sabe o que disse o primeiro-ministro de Israel?
Que se tratava de uma iniciativa positiva!”
Bateu com o indicador na testa.
“Está tudo louco! As pessoas não têm a menor noção do
que realmente significa esta ideia de clonar Jesus!
Se uma coisa dessas se concretizasse, as consequências
seriam desastrosas!”
Abanou a cabeça com veemência.
“Não! Isso eu não podia permitir! E não permiti! Do
mesmo modo que no século I os sicarii se ergueram para
defender Israel, nós erguemo-nos hoje para fazer o
mesmo. Se ninguém mais o queria fazer, nós fá-lo-íamos.
E fizemos!”
“Nós quem?”
“Nós, os sicarii renascidos.”
Tomás indicou o corpo estendido no chão.
“E ele?”
“O Lev?”, perguntou Grossman.
“Pobre diabo!” Olhou com melancolia para o cadáver.
“Conheci-o no Líbano, durante uma operação nas
montanhas contra o Hezbollah. Pertencia a uma unidade
especial do Tsahal e era um ás com as lâminas.
Uma vez infiltrou-se sozinho numa gruta e, armado
apenas com uma faca de mato, eliminou um pelotão
inteiro de mudjahedin. A guerra deixou-o afectado,
coitado. Acolhi-o sob a minha protecção, dei-lhe
orientação religiosa e fiz dele um sicarius.”
Ergueu os olhos para Tomás.
“Não sei como o senhor conseguiu matá-lo, nem isso
interessa. Deus assim o quis.”
Desviou a atenção para o equipamento instalado naquela
câmara.
“Cabe-me agora a mim pôr fim a este infeliz projecto.”
“O que vai fazer?”
“Isso é comigo.” Estendeu a mão.
“Vá lá! Entregue-me o tubo de ensaio!”
“Quem me garante que, uma vez na posse do ADN de Jesus,
o senhor não mata a Valentina na mesma e a seguir me
mata a mim?”
A atenção do polícia desviou-se para a italiana e
depois regressou ao português.
“Vamos fazer assim”, propôs. “Vou deixar aqui a nossa
beldade afastar-se. Mas você fica onde está. Quando ela
sair da minha mira, você entrega-me o tubo de ensaio.
Parece-lhe bem?”
“Que garantias tenho eu de que não me mata e depois vai
atrás da Valentina?”
A italiana, até ali imóvel com o cano da pistola
encostado à cabeça, quebrou o seu mutismo.
“Não se preocupe comigo, Tomás”, disse ela numa voz
tranquila, como se estivesse senhora da situação.
“Não se esqueça de que sou polícia e tenho treino de
combate. Se me conseguir afastar, este tipo não me
volta a ameaçar. Só aqui estou porque me apanhou de
surpresa. Garanto-lhe que ele não terá segunda
oportunidade.”
O historiador não pôde deixar de admirar a coragem e a
serenidade dela. Era extraordinário como, com uma arma
apontada à cabeça, Valentina se mantinha segura e sem
mostrar o menor vestígio de medo. Estaria a ocultar o
receio ou aquela manifestação de segurança seria
verdadeira? Fosse como fosse, o sangue-frio que exibia
não deixava de impressionar.
“Tem a certeza?”
A italiana assentiu.
“Absoluta!”, garantiu.
“Esta
câmara
está