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Bond resmungou alto. Como a sua carne já esfolada poderia resistir àquilo? Como poderia proteger a pele contra o metal? Mas não havia solução satisfatória. Ou voltaria, ou continuaria ali parado ou, afinal, avançaria. Não havia outra decisão a tomar. Aliás, Bond começava a encontrar algum consolo em suas reflexões. Com efeito, não seria o calor que haveria de matá-lo, mas alguma mutilação. O metal aquecido não seria o seu campo de sacrifício — apenas mais uma prova para medir-lhe a resistência.

Bond pensou na jovem e no que ela estaria sofrendo. Oh, sim, para a frente com aquilo. Agora, vejamos...

Bond apanhou a faca e cortou toda a parte da frente da camisa, fazendo com ela várias faixas. A única esperança estaria em dar alguma proteção às partes de seu corpo que mais sofreriam a ação do calor, isto é, os pés e as mãos. Seus joelhos e cotovelos teriam de resistir apenas com a proteção normal da fina camada de roupa. E, assim, dispôs-se à luta, amaldiçoando-a.

Agora estava pronto. Um, dois, três...

Bond dobrou o ângulo do túnel e lançou-se contra o foco de calor.

Mantenha a barriga nua distante do chão! Contraia os ombros! Mãos, joelhos, pés; mãos. joelhos, pés. Mais depressa! Mais depressa! Sempre mais depressa, de modo que cada toque contra o chão seja rapidamente seguido por outro.

Os joelhos é que mais estavam sofrendo, agüentando a maior parte do peso do corpo. Agora, as mãos envoltas em panos estavam começando a chamuscar. Acendeu-se uma fagulha, e logo outra, e em seguida surgiram chamas, quando as fagulhas começaram a se deslocar. A fumaça que saía daquele envoltório de pano de suas mãos fazia que os seus olhos ardessem penosamente. Por Deus, ele não agüentaria mais! Não havia mais ar. Seus pulmões estavam a ponto de estourar. Agora as suas duas mãos estavam lançando fagulhas para os lados. O tecido devia estar quase acabado; então a carne começaria a queimar. Bond deu um guinada e seu ombro ferido tocou no metal. Um grito de dor ecoou no túnel, logo seguido de outros gritos proferidos regularmente, quando suas mãos, pés ou joelhos tocavam no metal escaldante. Agora ele estava liquidado. Era o fim. Mais alguns segundos e iria cair de borco, morrendo literalmente queimado. Não! Devia opor um supremo esforço de reação, ainda que aos berros, até que toda a carne tivesse sido queimada até os ossos. A pele dos joelhos já devia ter sido completamente destruída. Mais um pouco e as palmas de suas mãos estariam tocando no metal. Apenas o suor que corria de seus braços poderia manter úmido o pano de suas mãos. Grite, grite, grite! Isto aliviará a dor.” Isto dirá que você está vivo. Continue! Continue! Não pode durar muito mais. Não é aqui que você deverá morrer. Não fraqueje! Você não pode!

A mão direita de Bond tocou em alguma coisa que cedeu. Logo sentiu uma corrente de ar frio. A outra mão bateu então em sua cabeça. Ouviu-se um débil ruído. Bond sentiu a orla inferior de um anteparo de amianto, articulado na parte superior do tubo, e que agora se arrastava em suas costas. Tinha vencido aquela prova. Ouviu o barulho daquele anteparo fechando-se novamente, depois de ter dado passagem a todo o seu corpo. Suas mãos estavam agora encostadas numa sólida parede. Com os dedos, apalpou à direita e à esquerda. Era um desvio em ângulo reto. Seu corpo seguiu cegamente volta do desvio e o ar frio parecia penetrar em seus pulmões como lâminas de aço geladas. Prudentemente, encostou os dedos no metal. Estava frio! Com um gemido Bond caiu sobre o rosto e ficou quieto.

Algum tempo depois, a dor tornou a reavivá-lo. Bond voltou-se dolentemente, de costas. Vagamente notou uma vigia de vidro acima de sua cabeça, e vagamente percebeu aquele mesmo par de olhos a fitá-lo. Depois, deixou novamente que as ondas de trevas o submergissem.

Aos poucos, na escuridão, as bolhas feitas em toda a pele e os pés e ombros queimados começaram a endurecer. O suor tinha-se secado no corpo e nos farrapos da roupa, enquanto o ar penetrara nos pulmões superaquecidos, começando o seu insidioso trabalho. Mas o coração continuava batendo, forte e regularmente, por dentro da torturada carcaça, e os poderes mágicos do oxigênio levaram nova vida para dentro das artérias e veias, recarregando os nervos.

Depois de um tempo que lhe pareceu infinito, Bond despertou. Estremeceu, e, ao encontrarem-se os seus olhos com o outro par que o espreitava, por trás do vidro, a dor se apoderou dele e sacudiu-o como se fosse um rato. Esperou que aquela descarga de dor o matasse. Tentou novamente, e novamente, até que conseguiu aquilatar toda a força do adversário. Em seguida, para esconder-se da testemunha, voltou-se sobre o estômago e resistiu a toda a dor que vinha de dentro de si próprio. Continuou em expectativa, explorando o corpo para verificar-lhe as reações, pondo à prova a força de decisão que ainda tivesse restado nas baterias. Quanto mais poderia ainda agüentar? Os lábios de Bond desprenderam-se dos dentes e ele rosnou na escuridão. Era um som animal. Tinha chegado ao fim de suas reações humanas à dor e à adversidade. O Dr. No o tinha encurralado. Mas ainda restavam reservas de desespero animal e, num animal forte, essas reservas são consideráveis.

Lentamente, em verdadeira agonia, Bond deslizou mais alguns metros para fora do campo visual daqueles olhos e procurou o seu isqueiro, acendendo-o. À sua frente via apenas uma lua cheia negra, a boca circular que o levaria ao estômago da morte. Bond guardou o isqueiro, respirou profundamente e pôs-se sobre os joelhos e mãos. A dor não foi maior, apenas diferente. Lentamente, com movimentos duramente articulados, avançou.

O tecido de algodão de seus joelhos e de seus cotovelos tinha sido completamente queimado. Entorpecidamente, seu cérebro foi registrando a umidade à medida que suas bolhas se abriam contra o metal frio. Enquanto se movia, ia simultaneamente flexionando os dedos e os pés, sentindo-lhes a dor. Lentamente foi sabendo o que poderia fazer, o que doeria menos. Esta dor é suportável, refletiu ele consigo mesmo. Se eu tivesse sofrido um desastre de avião, eles diagnosticariam apenas contusões e queimaduras superficiais. Teria alta do hospital dentro de alguns dias. Não há nada de sério comigo. Sou um sobrevivente de desastre. Dói, mas não é nada. Pense nos pedaços de carnes dos outros passageiros. Dê-se por feliz. Tire isso de sua cabeça. Mas, por trás de todas essa reflexões, estava o pensamento de que, em verdade, ele ainda não experimentara o desastre, — que ainda estava a caminho dele, com sua resistência e sua capacidade muito reduzidas. Quando chegaria ele? Que caráter teria? E quanto mais ainda seria ele amolecido antes de chegar à arena do sacrifício?

à frente, na escuridão, aqueles pequeninos pontos vermelhos bem poderiam ser uma alucinação, manchas rubras diante de seus olhos, causadas pela exaustão. Bond parou e apertou os olhos. Balançou a cabeça. Não, aqueles pontinhos vermelhos ainda estavam lá. Vagarosamente, arrastou-se para mais perto deles. Agora não havia dúvida de que eles se estavam movendo. Bond deteve-se novamente. Alem das batidas de seu coração, ouvia uma espécie de murmúrio suave e delicado. Aqueles pontinhos do tamanho de uma cabeça de alfinete tinham aumentado. Agora haveria vinte ou trinta, deslocando-se para a frente e para trás, alguns rapidamente, outros mais vagarosamente, em todo o círculo negro que o esperava à frente. Susteve o fôlego, assim que conseguiu acender o isqueiro. Os pontinhos vermelhos tinham desaparecido. Substituindo-os, ele viu a um metro de distância, à sua frente, uma tela muito fina, quase da finura de musselina, bloqueando o túnel.

Bond continuou deslocando-se por centímetros, para diante, com o isqueiro aceso à frente. Aquilo era uma espécie de gaiola, com pequeninos animais no seu interior. Podia ouvir aqueles diminutos seres fugindo à luz. A um pé apenas da tela apagou a luz e esperou que seus olhos se acostumassem à escuridão. Enquanto esperava, escutando, pôde ouvir novamente os pequeninos animais aproximarem-se dele, e, gradualmente, aquela floresta de pequeninos pontinhos vermelhos começou a se juntar, fitando-o através da tela.