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— É o que estamos querendo descobrir — disse M. —

Foram-se, sumiram, evaporaram-se. Ambos desapareceram na mesma noite, há coisa de três semanas. Deixaram o bangalô de Strangways reduzido a cinzas — rádio, códigos, arquivos. Não sobrou nada, a não ser uns destroços carbonizados. A garota deixou todas as suas coisas. Deve ter ido apenas com a roupa do corpo. Até mesmo o passaporte estava no seu quarto. É verdade que teria sido fácil para Strangways arrumar dois passaportes. Ele tinha muitos formulários em branco. Era Chefe da Fiscalização de Passaportes da ilha. São muitos os aviões em que eles poderiam ter embarcado, para a Flórida ou a América do Sul, ou qualquer outra ilha do distrito. A polícia ainda está verificando as listas de passageiros. Não se descobriu ainda nada, mas eles bem poderiam ter ficado na moita um ou dois dias, escapulindo depois. A moça talvez tenha tingido o cabelo ou coisa parecida. A vigilância dos aeroportos não é muito rigorosa naquelas paragens, não é verdade, Chefe do Pessoal?

— O senhor tem razão. — O Chefe do Pessoal parecia alimentar dúvidas. — Mas o que não posso compreender é aquele contato radiofônico. — Ele voltou-se para Bond. — Veja você: eles começaram a fazer o contato de rotina, às dezoito e trinta, hora local. Alguém — pensam na Segurança Radiofônica que foi a moça — acusou nosso WWW e de repente saiu do ar. Tentamos restabelecer o contato, mas era evidente que algo de anormal estava acontecendo, e nós interrompemos. Não houve resposta ao Chamado Azul, nem tampouco ao Vermelho. Portanto, qualquer coisa andava mal. No dia seguinte, a Terceira Seção mandou para lá o agente 258, de Washington. Nesse meio tempo, a polícia esteve investigando, e o Governador já tinha formado sua opinião e procurava abafar o caso. Tudo lhe parecia muito claro. Strangways já tivera uma ou outra complicação por causa de mulheres. Aliás, eu mesmo não posso censurá-lo: é um posto muito sossegado. Não havia muito trabalho para encher o tempo. O Governador tirou logo a conclusão mais imediata. Naturalmente, a polícia local fez o mesmo. Sexo e brigas com facões, é só o que eles compreendem. O agente 258 passou uma semana por lá e não conseguiu encontrar um único indício em contrário daquelas suposições. Ele fez o seu relatório nesta base e voltou para Washington. Desde então, a polícia tem andado investigando daqui e dacolá, sem fazer muita força e sem chegar a resultado algum. — O Chefe do Pessoal fez uma pausa. Olhou para M, como que a desculpar-se. — Sei que o senhor está inclinado a concordar com o Governador, mas aquele contato radiofônico me ficou atravessado na garganta. Não consigo ver como pode enquadrar-se no esquema de um casal em fuga. E os amigos de clube de Strangways dizem que ele estava em seu estado normal. Deixou-os no meio de um róber de bridge — era o que ele fazia, sempre que se aproximava a hora marcada. Disse-lhes que estaria de volta dentro de vinte minutos. Mandou vir bebidas para todos — mais uma vez, como sempre fazia — e saiu do clube às seis e quinze em ponto, exatamente como de costume. De repente, desaparece. Deixou mesmo o carro à porta do clube. Ora, por que daria motivo a que os parceiros de jogo se pusessem a procurar por ele, se queria fugir com a garota? Por que não partiram de manhã ou, melhor ainda, tarde da noite, depois de terem completado a comunicação por rádio e deixado suas coisas em ordem? Isso, para mim, não tem pé nem cabeça.

M grunhiu qualquer coisa ininteligível. — Pessoas... hum... apaixonadas... fazem coisas absurdas — resmungou ele. — Procedem como loucos, às vezes. E, seja como for, que outra explicação pode haver? Não há indícios de que eles tivessem sido apanhados a traição — nem existem razões para que isso acontecesse, ao menos que se saiba. É um posto sossegado. Sempre as mesmas rotinas mensais — algum revolucionário de Cuba procurando homiziar-se na ilha, escroques ingleses julgando que poderiam esconder-se em Jamaica, só porque fica tão longe de Londres. Não creio que Strangways tenha tido um só caso importante desde que 007 esteve com ele. — Dirigiu-se a Bond. — Pelo que o senhor acaba de ouvir, qual é sua opinião? Não temos muito mais para lhe contar.

Bond foi categórico: — Não posso de modo algum imaginar que Strangways fosse capaz de largar tudo dessa maneira. Admito que ele tivesse uma aventura com a garota, embora não acredite que ele misturasse o trabalho com o divertimento. Mas o Serviço Secreto era a sua própria vida. Ele nunca teria faltado às suas responsabilidades. Posso imaginá-lo entregando os seus documentos, e a moça também, e partindo com ela, depois que o senhor tivesse mandado para lá os seus substitutos. Mas não creio que fosse de seu feitio deixar tudo no ar dessa maneira. E pelo que o senhor disse da moça, penso o mesmo a respeito dela. As mulheres que ocuparam cargos de oficiais no Serviço Naval Feminino não costumam perder a cabeça.

— Obrigado, 007. — M estava controlando a voz. — Também a mim ocorreram essas considerações. Ninguém tirou conclusões apressadas sem ter pesado antes todas as possibilidades. Talvez o senhor possa sugerir outra solução.

M recostou-se na poltrona e ficou à espera de uma resposta. Pegou o cachimbo e começou a enchê-lo. Este caso o aborrecia. Não gostava de problemas pessoais, principalmente quando se apresentavam, como esse, cheios de complicações. Havia pelo mundo à fora uma infinidade de outras preocupações, aguardando que lhes dessem atenção. Fora apenas no intuito de dar a Bond um simulacro de missão, associada a um bom descanso, que ele resolvera mandá-lo a Jamaica, a fim de encerrar o caso. Pôs o cachimbo na boca e apanhou os fósforos.

— Então?

Bond não estava disposto a deixar-se desconcertar. Tinha simpatizado com Strangways e sentia-se impressionado pelas considerações do Chefe do Pessoal.

— Pois bem — disse ele. — Por exemplo, qual foi o último caso no qual Strangways estava trabalhando? Era algo que ele tivesse mencionado em relatórios, ou a Terceira Seção lhe teria dado alguma incumbência? Alguma coisa importante, nos últimos meses?

— Nada, absolutamente. — M foi peremptório. Tirou o cachimbo da boca e apontou-o para o Chefe do Pessoal. — Não é verdade?

— É verdade — confirmou o Chefe do Pessoal. — Apenas aquele diabo de negócio de pássaros.

— Ora, aquilo! — interveio M, com pouco caso. — Uma asneira do pessoal do Jardim Zoológico, ou não sei de quem. O Ministério das Colônias passou o caso para nós. Faz mais ou menos seis semanas, não?

— É isso mesmo. Mas não foi do Jardim Zoológico. Foi uma sociedade americana, a Sociedade Audubon. Protege as aves raras contra a extinção da espécie, ou qualquer coisa desse gênero. Apelaram para o nosso embaixador em Washington, e o Ministério do Exterior passou o abacaxi para o Ministério das Colônias, que o atirou em nossas mãos. Parece que essa gente das aves é muito influente nos Estados Unidos. Conseguiram até que um campo de experiências para bombas atômicas, na costa do Pacífico, fosse transferido, porque perturbava uns ninhos de aves.

M fungou.

— Um diabo de bicho chamado Grua Tussideira. Li qualquer coisa nos jornais a respeito disso.

— 0 senhor poderia contar-me mais alguma coisa? — insistiu Bond. — Que queria a Sociedade Audubon que nós fizéssemos?

M sacudiu impacientemente o cachimbo. Pegou a pasta de Strangways e jogou-a diante do Chefe do Pessoal.

— Diga-lhe tudo, Chefe do Pessoal — resmungou, com ar de cansaço. — Está tudo aqui.

O Chefe do Pessoal pegou na pasta e procurou por entre os últimos documentos. Encontrou o que queria e dobrou a pasta ao meio. Fez-se silêncio na sala enquanto ele corria os olhos por três folhas datilografadas, as quais, segundo Bond podia ver, traziam o cabeçalho azul e branco do Ministério das Colônias. Bond mantinha-se imóvel, procurando não sentir a impaciência de M prestes a explodir.

O Chefe do Pessoal fechou a pasta com um ruído seco, e disse: