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Ela ainda não estava suficientemente cansada para ir dormir, o que não era problema. Conseguir pegar no sono era uma missão simples para quem fora treinada por Andarilhas dos Sonhos Aiel. Egwene adentrou Tel’aran’rhiod

… e se viu de pé no aposento que fora seu gabinete na Pequena Torre durante um período bem curto. A mesa e as cadeiras permaneciam lá, claro. Mobília não era algo que se levasse quando se viajava com um exército. Qualquer lugar parecia vazio no Mundo dos Sonhos, mas a impressão era ainda mais forte nos lugares de fato desabitados. A Pequena Torre já parecia… oca.

De repente, Egwene percebeu que a estola da Amyrlin estava sobre seus ombros. Ela a fez desaparecer bem a tempo. No instante seguinte, Nynaeve e Elayne estavam lá, Nynaeve tão sólida quanto ela, Elayne, enevoada. Siuan se mostrara relutante em abrir mão do anel ter’angreal original, e uma ordem firme de Egwene havia sido necessária para fazê-la obedecer. Elayne trajava um vestido verde com rendas que se derramavam sobre as suas mãos e delineavam um decote estreito, ainda que assustadoramente cavado, que revelava uma faquinha que pendia de uma gargantilha de ouro bem justa, o punho aninhado entre seus seios compondo uma massa de pérolas e gotas de fogo. Aonde quer que fosse, Elayne sempre parecia aderir imediatamente à moda local. Nynaeve, como esperado, usava uma lã pesada de Dois Rios, escura e simples.

— Já encontraram? — indagou Egwene, esperançosa.

— Ainda não, mas vamos encontrar. — Elayne pareceu tão otimista que Egwene quase ficou desconcertada. Era claro seu esforço para soar daquele jeito.

— Estou certa de que não vai demorar muito — garantiu Nynaeve, soando ainda mais positiva.

As duas deviam estar empacadas. Egwene suspirou.

— Talvez vocês devessem se juntar a mim de novo. Tenho certeza de que vocês poderiam encontrar a tigela daqui a mais alguns dias, mas fico preocupada com todas aquelas histórias. — Elas eram capazes de se cuidar. Egwene sabia disso, e seriam ótimas palavras para se gravar nos túmulos das duas. Siuan disse que nenhuma das histórias que elas haviam contado era exagerada.

— Ah, não, Egwene — protestou Nynaeve. — A tigela é importante demais. Você sabe que é. Se não encontrarmos, as consequências serão terríveis.

— Além disso — acrescentou Elayne —, em que tipo de confusão podemos nos meter? Passamos todas as noites no Palácio Tarasin, caso você tenha se esquecido, e Tylin pode até não nos dar um beijo de boa-noite, mas chega perto disso. — O vestido dela estava diferente. O corte permanecia inalterado, mas o material ficara áspero e desgastado. Nynaeve trajava quase uma cópia dele, exceto por sua faca não conter mais do que nove ou dez contas de vidro no punho. Não pareciam roupas para palácio nenhum. Pior, ela estava tentando parecer inocente. Nynaeve não tinha nenhuma prática naquilo.

Egwene deixou passar. A tigela era importante, as duas eram perfeitamente capazes de cuidar de si mesmas, e ela sabia muito bem que as amigas não estavam procurando no Palácio Tarasin. Ela quase deixou passar, na verdade.

— Vocês estão usando Mat, não estão?

— Nós… — De repente, Elayne reparou no vestido e se assustou. Por algum motivo, porém, pareceu que foi a faquinha que realmente a assustou. Com os olhos se esbugalhando, ela apertou o punho, um monte de contas de vidro vermelhas e brancas bem grandes, e seu rosto se ruborizou por completo. No instante seguinte, já trajava um vestido andoriano de gola alta de seda verde.

O engraçado foi Nynaeve ter percebido o que estava usando só um piscar de olhos depois de Elayne e ter reagido exatamente da mesma maneira. Igualzinho. A exceção talvez tenha sido que, se Elayne ficou da cor de um pôr do sol, Nynaeve ficou da cor de dois. Antes até de Elayne ter se trocado, ela já estava de novo com suas lãs de Dois Rios.

Elayne pigarreou e, com a voz ofegante, disse:

— Mat é bastante útil, eu tenho certeza, mas não podemos deixar que ele nos atrapalhe, Egwene. Você sabe como ele é. Mas você pode ter certeza de que, se formos fazer algo perigoso, estaremos com ele e todos os soldados dele um do lado do outro ao nosso redor. — Nynaeve se manteve em silêncio e com uma cara azeda. Talvez estivesse se lembrando das ameaças de Mat.

— Nynaeve, você não vai pegar muito pesado com Mat, vai?

Elayne gargalhou.

— Ela não está nem falando com ele, Egwene.

— É a pura verdade — tratou de acrescentar Nynaeve. — Eu não discuti com ele nenhuma vez desde que chegamos a Ebou Dar.

Em dúvida, Egwene assentiu com a cabeça. Ela poderia resolver aquela questão, mas seria preciso… Deu uma olhadinha para baixo para se certificar de que a estola não havia reaparecido e só a viu surgir e sumir tão rápido que nem ela teria sido capaz de reconhecê-la.

— Egwene — disse Elayne —, você já conseguiu falar com as Andarilhas dos Sonhos?

— É — acrescentou Nynaeve. — Elas sabem qual é o problema?

— Já falei — suspirou Egwene. — Não sabem, não.

Tinha sido uma reunião estranha, apenas alguns dias antes, cujo início se dera quando Egwene achou os sonhos de Bair. Melaine e Bair foram encontrá-la na Pedra de Tear. Amys dissera que não a ensinaria mais, e, portanto, não foi. No começo, Egwene se sentiu pouco à vontade. Não conseguia reunir forças para contar para aquelas mulheres que era Aes Sedai, e menos ainda a Amyrlin, por medo de que elas fossem pensar que se tratava de mais uma mentira. Com certeza não precisara se preocupar com a estola aparecer de repente. E também havia a toh dela em relação a Melaine. Egwene tocou no assunto, pensando o tempo todo em quantas milhas teria que passar em cima de uma sela no dia seguinte, mas Melaine estava tão satisfeita porque teria filhas — a mulher contou, felicíssima, sobre a visão de Min — que não só foi logo anunciando que Egwene não tinha nenhuma toh em relação a ela, como disse que daria a uma das filhas o nome de Egwene. Aquele fora um pequeno momento de prazer numa noite cheia de perda de tempo e irritação.

— O que elas disseram — prosseguiu ela — foi que nunca tinham ouvido falar de ninguém tentando encontrar de novo uma coisa por necessidade depois de já tê-la encontrado. Bair achou que talvez fosse parecido com tentar comer a mesma… maçã duas vezes. — A mesma motai, fora a expressão que Bair tinha usado. Uma motai era uma espécie de larva encontrada no Deserto. Bem doce e crocante, até Egwene descobrir o que estava comendo.

— Você está dizendo que nós não podemos encontrar um jeito de voltar para o armazém? — suspirou Elayne. — Eu estava torcendo para que estivéssemos fazendo alguma coisa errada. Ah, pois bem. Nós vamos encontrar mesmo assim. — Elayne hesitou, e seu vestido tornou a mudar, embora ela não tivesse percebido. Ainda era andoriano, mas vermelho, com os Leões Brancos de Andor subindo pelas mangas e por todo o corpete. Um vestido de rainha, mesmo sem a Coroa de Rosas repousando em seus cachos louros levemente avermelhados. Mas era um vestido de rainha com corpete bem justo que talvez tivesse um decote maior do que uma rainha andoriana usaria. — Elas falaram alguma coisa sobre Rand, Egwene?

— Ele está em Cairhien, refestelando-se lá pelo Palácio do Sol, pelo que entendi. — Egwene conseguiu não se encolher toda. Nem Bair nem Melaine haviam revelado muito, mas Melaine chegara a resmungar alguma coisa sobre Aes Sedai enquanto Bair dizia que todas elas mereciam uma boa surra e que, independentemente do que Sorilea dissesse, uma surra comum devia adiantar. Egwene tinha muito medo de que Merana, de alguma forma, tivesse metido os pés pelas mãos. Pelo menos ele estava se esquivando das emissárias de Elaida. Ela não achava nem de longe que ele soubesse lidar tão bem com elas quanto achava que sabia. — Perrin está com ele. E a esposa de Perrin! Ele se casou com Faile! — Aquilo gerou exclamações. Nynaeve disse que Faile era boa demais para ele, mas o comentário foi acompanhado de um largo sorriso. Elayne falou que torcia para que os dois fossem felizes, mas, por algum motivo, soou como quem duvidava daquilo. — Loial também está lá. E Min. Só falta Mat e nós três.