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O papel de Heskow era, porém, convencê-los a aceitar a missão.

― O Dom está retirado há três anos ― disse. ― Toda a gente que conhecia está na cadeia. O poder dele foi-se. O único que podia causar problemas é o Timonna Portella, e esse garanto eu. O prêmio é um milhão de dólares. Metade depois do serviço e a outra metade passado um ano. Mas, durante esse ano, terão de manter-se quietos e calados. Está tudo combinado. Tudo o que têm de fazer é disparar.

― Um milhão de dólares ― murmurou Stace. ― É uma porção de massa.

― O meu cliente sabe que liquidar Don Aprile não é brincadeira ― continuou Heskow. ― Por isso quer o melhor. Atiradores frios, gente que saiba conservar a boca fechada, com boa cabeça. E vocês os dois são pura e simplesmente o melhor.

― Não há por aí muitos tipos dispostos a correr um risco destes ― comentou Franky.

― Pois não ― corroborou Stace. ― É uma coisa com que um tipo vai ter de viver o resto da vida. Há de haver sempre alguém atrás dele, além da bófia e dos “fedes”.

― Juro-lhes, a polícia não vai esforçar-se muito ― afirmou Heskow. Quanto ao FBI, nem sequer se vai meter.

― E os velhos amigos do Don? ― perguntou Stace.

― Os mortos não têm amigos. ― Heskow fez uma curta pausa. ― Quando o Don se retirou, cortou todos os laços. Não têm nada com que se preocupar.

― É curioso ― disse Franky, dirigindo-se a Stace. ― Em todos os nossos trabalhos, dizem-nos sempre que não temos nada com que nos preocupar porque não são eles que têm de disparar. John, és um velho amigo. Confiamos em ti. Mas, e se estás enganado? Qualquer pessoa pode enganar-se. E se o Don ainda tem velhos amigos? Sabes como é que ele funciona. Sem piedade. Um tipo não é simplesmente morto, é crucificado. Primeiro, passa um bom par de horas no inferno. Além disso, as nossas famílias estão à mercê dele. O que quer dizer o teu filho. Não poderá jogar na NBA se estiver enterrado. Talvez devêssemos saber quem está a pagar por esta coisa.

Heskow inclinou-se para a frente. A pele normalmente pálida do rosto pusera-se-lhe vermelha, como se estivesse a corar.

― Não posso dizer-lhes. Estão fartos de saber. Sou apenas o intermediário. E já pensei em todas essas coisas. Acham que sou estúpido? Quem não sabe quem é o Don? Mas neste momento está indefeso. Tenho garantias ao mais alto nível. A policia limitar-se-á a fingir que investiga. O FBI não pode dar-se ao luxo de investigar. E os chefões da Máfia não intervirão. É à prova de fogo.

― Nunca sonhei que Don Aprile pudesse vir a ser um dos meus alvos ― disse Franky, sonhadoramente. A façanha apelava-lhe ao ego. Matar um homem tão temido e respeitado no seu mundo.

― Franky, isto não é um jogo de basquete ― avisou Stace. ― Se perdermos, não trocamos apertos de mão e saímos do campo.

― Stace, é um milhão de dólares ― retorquiu Franky ― E o John nunca nos meteu numa fria. Vamos alinhar.

Stace sentiu a excitação a crescer dentro de si. Que diabo. Ele e Franky sabiam perfeitamente cuidar de si mesmos. Ao fim e ao cabo, sempre era um milhão de dólares. Para dizer a verdade, Stace era mais mercenário do que Franky, mais voltado para o negócio, e aquilo do milhão decidiu-o.

― OK. ― disse. ― Alinhamos. Mas que Deus se amerceie das nossas almas se estivermos enganados.

Quando era garoto, costumava ajudar à missa.

― E se o Don está a ser vigiado pelo FBI? ― perguntou Franky. ― Vamos ter de preocupar-nos com isso?

― Não ― respondeu Heskow. ― Quando todos os amigos foram presos, o Don reformou-se como um cavalheiro. O FBI apreciou o gesto. Deixam-no em paz. Posso garantir-lhes isto. Agora deixem-me explicar-lhes a coisa.

Demorou mais de meia hora a expor o plano com todo o pormenor. Finalmente, Stace perguntou:

― Quando?

― Domingo de manhã. Ficam aqui os primeiros dois dias. Depois, um jato particular leva-os até Newark.

― Precisamos de um condutor muito bom ― disse Stace. ― Excepcional.

― Eu conduzo ― informou Heskow, e acrescentou, quase apologeticamente. ― É um bolo muito grande.

Durante o resto da semana, Heskow serviu de ama-seca aos gêmeos, preparando-lhes as refeições, e fazendo-lhes recados. Não era um homem facilmente impressionável, mas por vezes os Sturzo punham-lhe um estranho frio no coração. Eram como víboras, com as cabeças sempre alerta, e no entanto simpáticos, ao ponto de o ajudarem a cuidar das flores nos viveiros.

Antes do jantar, os irmãos jogavam um pouco de basquetebol um-para-um, e Heskow ficava a ver, fascinado, como os seus corpos deslizavam à volta um do outro, como cobras. Franky era mais rápido e um lançador temível. Stace não era tão bom, mas era mais esperto. Franky poderia ter chegado à NBA, pensou Heskow. Mas aquilo não era um jogo de basquete. Numa crise a sério, teria de ser Stace. Stace seria o atirador principal.

Capítulo 2

O grande blitz dos anos 90 do FBI contra as famílias da Máfia de Nova Iorque deixara apenas dois sobreviventes. Don Raymonde Aprile, o maior e mais temido, não foi tocado. O outro, Don Timmona Portella, que era quase seu igual em poder mas muito inferior como homem, escapou pelo que pareceu pura sorte.

O futuro era, porém, perfeitamente claro. As leis Rico de 1970, tão pouco democráticas na sua estruturação, o zelo das equipes especiais do FBI e o fim da crença na omertà entre os soldados da Máfia americana convenceram Don Raymonde Aprile de que era tempo de retirar-se graciosamente do palco.

O Don governara a sua família durante trinta anos e era agora uma lenda. Educado na Sicília, nada tinha das falsas idéias e da pomposa arrogância dos chefes da Máfia nascidos na América. Era, na realidade, uma revivescência dos velhos sicilianos do século XIII, que governavam cidades e aldeias com o seu carisma, o seu sentido da honra e o julgamento mortal e inapelável de qualquer potencial inimigo. Provara, além disso, possuir também o gênio estratégico desses antigos heróis.

Agora, com sessenta e dois anos, tinha a vida em ordem. Desembaraçara-se dos seus inimigos e cumprira os seus deveres como amigo e como pai. Podia gozar a velhice de consciência tranqüila, afastar-se-ia das desarmonias do seu mundo e assumir o papel bem mais adequado de banqueiro e pilar da sociedade.

Os três filhos estavam confortavelmente instalados em carreiras respeitáveis. O mais velho, Valerius, agora com trinta e sete anos, casado e pai de dois filhos, era coronel no Exército dos Estados Unidos e professor em West Point. A sua carreira fora determinada pela timidez que o afligia em criança: o Don inscrevera-o como cadete naquela mesma prestigiada Academia Militar para corrigir esta falha de caráter.

O segundo, Marcantonio, com apenas trinta e cinco anos era, sem dúvida em conseqüência de alguma misteriosa transformação genética, diretor executivo de uma rede de televisão nacional.

Fôra um rapazinho introvertido, que vivia num mundo de faz-de-conta, e o Don sempre pensara que nunca conseguiria ser bem sucedido em qualquer empreendimento sério. E agora o seu nome aparecia com freqüência nos jornais, aureolado com a fama de ser uma espécie de visionário criativo. O que agradava ao Dom mas não o convencia. Ao fim e ao cabo, era ele o pai do rapaz. Quem poderia conhecê-lo melhor?