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― Esse problema é com o Ministério Público ― declarou o diretor. ― A nós compete-nos meter o pé na porta. Depois, é pôr mil advogados a espionar o passado. Temos boas possibilidades de encontrar qualquer coisa que os tribunais aceitem.

― A respeito da minha conta secreta nas ilhas Caymans, onde o Portella deposita o dinheiro ― disse Cilke. ― Penso que seria melhor levantar algum, para ele pensar que estou a gastá-lo.

― Eu trato disso ― concordou o diretor. ― Digo-lhe uma coisa, o seu Timmona é um mãos-largas.

― Está verdadeiramente convencido de que me comprou ― respondeu Cilke, sorrindo.

― Tenha cuidado ― aconselhou o diretor. ― Não lhe dê pé para fazer de si um verdadeiro associado, o cúmplice de um crime.

― Compreendo ― respondeu Cilke, e pensou que era bem mais fácil de dizer do que fazer.

― E não corra riscos desnecessários ― continuou o diretor. ― Lembre-se, os homens dav droga da América do Sul e da Sicília estão ligados ao Portella, e essa gente não brinca.

― Devo mantê-lo informado todos os dias oralmente ou por escrito? ― perguntou Cilke.

― Nem uma coisa nem outra ― retorquiu o diretor. ― Tenho confiança absoluta na sua integridade. E, além disso, não quero ter de mentir a uma qualquer comissão de inquérito do Congresso. Para tornar-se um dos meus adjuntos, vai ter de resolver estes assuntos ― disse, e ficou à espera, expectante.

Cilke nunca se atrevia sequer a pensar os seus verdadeiros pensamentos na presença do diretor, como se o homem pudesse ler-lhe a mente. Apesar disso, sentiu um lampejo de rebelião. Quem porra julgava o diretor que era? A merda da União Americana de Liberdades Civis? Com os seus memorandos a destacar que a Máfia não era italiana, que os muçulmanos não eram terroristas, que os negros não eram a classe criminosa. Quem porra pensava ele que cometia os crimes nas ruas?

No entanto, limitou-se a dizer calmamente:

― Senhor, se quiser a minha demissão, já tenho tempo de serviço suficiente para uma reforma antecipada.

― Não ― disse o diretor. ― Responda à minha pergunta. É capaz de pôr fim a esses relacionamentos?

― Dei ao Bureau. os nomes de todos os meus informadores ― afirmou Cilke. ― Quanto a cortar curvas, é uma questão de interpretação. Quanto a ter amigos na policia local, ando a fazer relações públicas por conta do Bureau.

― Os seus resultados falam por si. Vamos experimentar mais um ano. Continuemos. ― Fez uma longa pausa e suspirou. Depois perguntou, quase impacientemente. ― Em sua opinião, temos o suficiente para acusar de perjúrio os administradores das tabaqueiras?

― Sem qualquer problema ― respondeu Cilke, e perguntou a si mesmo por que diabo se teria o diretor dado ao trabalho de perguntar. Tinha em seu poder o processo completo.

― Mas pode tratar-se de convicções pessoais ― insistiu o diretor. ― Nas sondagens que mostram que metade do povo americano concorda com eles.

― Não é relevante para o caso ― afirmou Cilke. ― As pessoas que responderam às sondagens não cometeram perjúrio em testemunhos perante o Congresso. Temos gravações e documentos internos que provam sem margem para dúvidas que os administradores das tabaqueiras mentiram conscientemente. Conspiraram.

― Tem razão ― admitiu o diretor, com um suspiro. ― Mas o promotor chegou a um acordo. Não haverá acusações criminais, nem penas de prisão. Pagarão multas de centenas de bilhões de dólares. Portanto, encerre essa investigação. Saiu das nossas mãos.

― Ótimo ― disse Cilke. ― Tenho muitos outros casos em que ocupar o pessoal.

― Fico contente. Vou, aliás, torná-lo ainda mais feliz. Essa história de transferência de tecnologia ilegal para a China... Uma acusação extremamente grave.

― Não há alternativa. As empresas em causa violaram deliberadamente uma lei federal com o intuito de obter lucros e puseram em causa a segurança dos Estados Unidos. Há conspiração.

― Temo-los na mão ― concordou o diretor ―, mas bem sabe que “conspiração” passou a servir para tudo e para nada. Toda a gente conspira. É outro caso que pode encerrar e poupar pessoal.

― Está a dizer-me que também chegaram a um acordo neste caso? ― exclamou Cilke, incrédulo.

O diretor recostou-se na cadeira e franziu o sobrolho face à insolência implícita na pergunta. Mas resolveu deixar passar.

― Cilke, você é o melhor operacional do Bureau. Mas não tem ponta de sentido político. Ouça o que vou dizer-lhe, e nunca o esqueça: não se pode mandar cinco bilionários para a prisão. Pelo menos numa democracia.

― E fica assim?

― As sanções financeiras serão pesadíssimas ― disse o diretor. ― Agora, duas outras coisas, uma delas muito confidencial. Vamos trocar um prisioneiro federal por um dos nossos informadores que foi feito refém na Colômbia, um trunfo muito importante na nossa luta contra a droga É um caso que conhece. ― Referia-se a um caso passado quatro anos antes, em que um traficante de droga se apossara de cinco reféns, uma mulher e quatro crianças. Matara-os, e matara também um agente do FBI. Fôra condenado a prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional. ― Lembro-me de que exigiu veementemente a pena de morte ― continuou o diretor. ― Agora vamos soltá-lo, e sei perfeitamente que isso o choca. Lembre-se, toda esta história é secreta, mas os jornais vão inevitavelmente desenterrá-la e o escândalo será enorme. Não quero o mais pequeno comentário seu nem da sua delegação. Estamos entendidos?

― Não podemos consentir que seja quem for mate os nossos agentes e se fique a rir ― respondeu Cilke, em voz surda.

― Essa atitude é inaceitável da parte de um funcionário federal.

Cilke tentou disfarçar a sua fúria. ― Então todos os nossos agentes estarão em perigo ― disse. É assim que a coisa funciona nas ruas. O agente foi morto quando tentava salvar os reféns. Foi uma execução a sangue-frio. Libertar o assassino é um insulto à vida desse homem.

― Não pode haver uma mentalidade de vendetta no Bureau, Kurt. ― O diretor queria mostrar-se conciliatório. ― Caso contrário, não seremos melhores do que eles. Vejamos, o que é que tem a respeito desses dentistas que emigraram?

Nesse momento, Cilke compreendeu que não podia continuar a confiar no diretor.

― Nada de novo ― mentiu. Decidira que, a partir daquele instante, deixaria de fazer parte dos compromissos políticos do Bureau. Doravante, jogaria sozinho.

― Bom, agora que tem gente suficiente disponível, dedique-se a isso. E depois de caçar o Timmona Portella, gostaria de trazê-lo para aqui como um dos meus adjuntos.

― Obrigado ― disse Cilke ―, mas decidi que, depois de arrumar esta questão do Portella, vou pedir a reforma.

O diretor soltou um profundo suspiro.

― Reconsidere. Sei que todas estes acordos o perturbam profundamente. Mas lembre-se disto: o Bureau não é apenas responsável por proteger a sociedade contra aqueles que infringem a lei; temos também de tomar medidas que, a longo prazo, beneficiam a sociedade no seu todo.

― Lembro-me disso desde os meus tempos de escola ― respondeu Cilke. ― Os fins justificam os meios.

O diretor encolheu os ombros.