Ulrika Vanger era a mãe de Henrik e parecia ter um estatuto semelhante ao de uma rainha-mãe. Ulrika morava na casa Vanger e não tinha nenhuma informação para dar. Fora deitar-se cedo na véspera e fazia dias não via Harriet. Na verdade, ela só insistira em falar com o inspetor Morell para expressar sua opinião de que a polícia devia agir imediatamente.
Harald Vanger era o irmão de Henrik e o número dois na lista dos membros influentes da família. Ele explicava que tinha visto Harriet muito rapidamente quando ela voltou do desfile em Hedestad, mas que não a vira desde que o acidente ocorrera na ponte e não sabia onde ela se encontrava no momento.
Greger Vanger, irmão de Henrik e Harald, declarava que vira a jovem desaparecida quando ela tinha ido ao escritório de Henrik pedir para conversar com o tio-avô após sua ida a Hedestad, na manhã de sábado. Greger acrescentava que não dirigira a ela senão um bom-dia. Não sabia onde ela podia estar, mas achava que decerto fora à casa de alguma colega sem avisar ninguém e que seguramente não tardaria a voltar. Não soube responder à pergunta de como, então, ela teria deixado a ilha.
Martin Vanger fora interrogado às pressas. Aluno do último ano num colégio de Uppsala, morava nessa cidade na casa de Harald Vanger. Como não houve lugar para ele no carro de Harald, viera de trem a Hedeby. Chegou tão tarde que ficou preso do outro lado da ponte e só pôde chegar à ilha tarde da noite, de barco. Fora interrogado na esperança de que a irmã pudesse ter se aberto com ele e talvez confessado a intenção de fugir. A pergunta fora recebida com protestos da mãe de Harriet, mas o inspetor Morell julgou naquele instante que uma fuga representava antes uma esperança. Martin, porém, não falava com a irmã desde as últimas férias e não tinha nenhuma informação importante a dar.
Anita Vanger, a filha de Harald, era apresentada, de maneira errônea, como "prima" de Harriet— na realidade, Harriet era filha do primo de Anita. Estava no primeiro ano da faculdade em Estocolmo e passara o verão em Hedeby. Tinha quase a mesma idade que Harriet e as duas eram muito amigas. Ela declarava que chegara à ilha com o pai no sábado, que se alegrara em poder rever Harriet, mas que não tivera tempo para isso. Anita dizia-se inquieta porque não era próprio de Harriet desaparecer sem dizer nada à família. Nisso concordava tanto com Henrik quanto com Isabella Vanger.
Enquanto interrogava os membros da família, o inspetor Morell ordenara aos agentes de polícia Magnusson e Bergman — a patrulha 014! — que organizassem uma primeira busca antes do anoitecer. A ponte continuava fechada, era difícil trazer reforços do continente; o primeiro grupo de busca foi formado por cerca de trinta pessoas disponíveis, homens e mulheres de idades variadas. Até o final da tarde foram examinadas as cabanas desabitadas no porto de recreio, as praias do promontório e as margens do canal, a parte arborizada perto do povoado e também o monte Sul, acima do porto de recreio, isso depois de alguém sugerir que Harriet talvez tivesse subido lá para obter uma boa visão geral do acidente na ponte. Patrulhas foram igualmente enviadas a Östergarden e ao chalé de Gottfried do outro lado da ilha, para onde Harriet ia de vez em quando.
No entanto as buscas não deram em nada e foram interrompidas com a noite já avançada, por volta das dez horas. Na madrugada, a temperatura caíra a zero grau.
Durante a tarde, o inspetor Morell instalara seu QG numa sala que Henrik Vanger pusera à sua disposição no andar térreo da casa Vanger. Ele tomou uma série de providências.
Acompanhado de Isabella Vanger, inspecionou o quarto de Harriet para tentar descobrir se faltava alguma coisa, roupas, uma sacola ou algo semelhante que pudesse indicar que Harriet fugira, Isabella, pouco prestativa, não parecia ter a menor idéia do guarda-roupa da filha. Ela geralmente veste jeans, mas são todos parecidos. A bolsa de Harriet foi encontrada em cima da escrivaninha. Continha sua carteira de identidade, um porta-moedas com nove coroas e cinquenta centavos, um pente, um espelhinho e um lenço. Após a inspeção, o quarto de Harriet foi lacrado.
Morell interrogou outras pessoas, tanto membros da família quanto empregados. Todos os interrogatórios foram minuciosamente registrados.
Como os participantes da primeira batida iam voltando aos poucos e sem informações proveitosas, o inspetor decidiu realizar buscas mais sistemáticas. No começo da noite, reforços foram chamados; Morell entrou em contato, entre outros, com o presidente do clube de orientação de Hedestad, pedindo-lhe que convocasse seus membros para uma batida. Por volta da meia-noite, responderam-lhe que cinquenta e três atletas ativos, sobretudo da categoria júnior, estariam na casa Vanger às sete da manhã do dia seguinte. A contribuição de Henrik Vanger fora convocar, pura e simplesmente, toda a equipe da manhã da fábrica de papel Vanger local, cinquenta homens, além de providenciar bebida e comida para todo esse pessoal.
Mikael Blomkvist não teve nenhuma dificuldade em imaginar as cenas que devem ter se passado na casa Vanger durante aqueles dias repletos de acontecimentos. Estava claro que o acidente na ponte contribuíra para a confusão das primeiras horas, seja complicando a possibilidade de obter reforços eficazes, seja porque todos achavam que dois acontecimentos tão dramáticos ocorridos no mesmo lugar e na mesma hora tinham necessariamente uma ligação. Depois que retiraram o caminhão-tanque da ponte, contra todas as probabilidades, o inspetor Morell fora certificar-se pessoalmente de que Harriet não se achava sob os destroços. Foi a única ação irracional que Mikael identificou nos procedimentos do inspetor, pois a jovem desaparecida fora comprovadamente vista na ilha depois de ocorrido o desastre. No entanto, sem que pudesse explicar a si mesmo por quê, o responsável pelas investigações não conseguia tirar da cabeça a idéia de que um dos acontecimentos havia, de algum modo, provocado o outro.
As primeiras vinte e quatro horas viram minguar as esperanças de um desfecho rápido e feliz do caso, substituídas gradualmente por duas especulações. Apesar das dificuldades evidentes de poder abandonar a ilha sem ser vista, Morell não queria excluir a possibilidade de Harriet ter fugido. Decidiu ampliar as buscas e ordenou que os policiais da patrulha em Hedestad ficassem de olhos abertos. Também passou a um colega da divisão criminal a tarefa de interrogar motoristas de ônibus e o pessoal da ferrovia, para o caso de alguém a ter visto.
Quanto mais respostas negativas chegavam, mais parecia provável que Harriet fora vítima de um acidente. Essa hipótese passou a dominar a organização das buscas nos dias seguintes.
Dois dias depois do desaparecimento, uma grande batida foi realizada, e, de acordo com a avaliação de Mikael Blomkvist, com a maior competência. Policiais e bombeiros com experiência em casos semelhantes comandaram as buscas. Embora houvesse algumas áreas de difícil acesso, a superfície era limitada e a ilha inteira foi submetida a uma operação pente-fino. Um barco da polícia e dois de recreio, voluntários, sondaram da melhor maneira possível as águas ao redor da ilha.
No dia seguinte, as buscas foram retomadas com uma equipe reduzida. Dessa vez, patrulhas foram enviadas a uma segunda batida nos pontos de acesso mais difícil, bem como numa área chamada "A Fortificação" — um conjunto de bunkers abandonados que a defesa costeira havia montado durante a Segunda Guerra. Assim foram examinados nesse dia todos os pequenos redutos, poços, grutas, depósitos e porões do povoado.
Podia-se ler uma certa frustração numa nota de serviço que anunciava a interrupção das buscas no terceiro dia após o desaparecimento. Naturalmente Gustav Morell ainda não tinha consciência disto, mas naquele instante, na realidade, ele havia atingido o ponto culminante de suas buscas, o qual jamais ultrapassaria. Mergulhado na maior perplexidade, não sabia como recomendar a próxima etapa lógica ou um local onde as buscas devessem recomeçar. Harriet Vanger aparentemente sumira no ar, e o calvário de Henrik Vanger, que haveria de prosseguir por quarenta anos, estava apenas começando.