Выбрать главу

— Entendo o que quer dizer. Também refleti sobre isso até ficar doente. E ao mesmo tempo tenho certeza de que deixamos escapar alguma coisa. Não existe crime perfeito.

— Mas nem somos capazes de afirmar que houve realmente um crime. Henrik Vanger suspirou e fez um gesto vago com a mão.

— Continue — disse. — Vá até o fim.

— Não vai adiantar nada.

— Talvez. Mas não desista. Mikael suspirou.

— Os números de telefone — acabou dizendo.

— Sim.

— Eles significam necessariamente alguma coisa.

— Sim.

— Foram anotados com alguma intenção.

— Sim.

— Mas não sabemos interpretá-los.

— Não.

— Ou os interpretamos mal.

— Exatamente.

— Não são números de telefone. Querem dizer alguma outra coisa.

— Talvez.

Mikael suspirou novamente e voltou para casa a fim de continuar a ler.

O dr. Nils Bjurman deu um suspiro de alívio quando Lisbeth Salander lhe telefonou para explicar que precisava de mais dinheiro. Ela não comparecera ao último encontro marcado alegando que precisava trabalhar, e uma pequena inquietação começara a perturbá-lo. Estaria lidando com uma criança-problema intratável? Ao cancelar o encontro marcado, ela ficara impedida de receber a mesada e cedo ou tarde seria obrigada a entrar em contato. Ele se preocupava também com a possibilidade de ela ter aberto a boca para alguém.

Seu breve telefonema para dizer que precisava de dinheiro confirmou de maneira satisfatória que a situação estava sob controle. Mas essa menina precisava ser domada — concluiu Nils Bjurman. Ia ter que aprender quem é que decidia, somente então poderia haver uma relação mais construtiva. Foi o que o levou a indicar, desta vez, que se vissem em sua casa, perto da Odenplan, e não no escritório. Ao ouvir essa exigência, Lisbeth Salander ficou um bom momento calada na outra ponta da linha — essa tonta tem dificuldade de entender — antes de aceitar.

O plano de Lisbeth era se encontrar com ele no escritório, como da outra vez. Agora seria obrigada a vê-lo em território desconhecido. O encontro foi marcado para sexta-feira à noite. Ele lhe passou a senha de entrada e às oito e meia ela tocou a campainha, meia hora depois do combinado. Foi o tempo que ela precisou para, na obscuridade do hall do edifício, revisar uma última vez seu plano, considerar alternativas, blindar-se e reunir a coragem necessária.

Por volta das oito da noite, Mikael desligou o computador e agasalhou-se para sair. Deixou a luz acesa na saleta de trabalho. O céu estava estrelado e a temperatura em torno de zero grau. Subiu a encosta com passos ligeiros, passou em frente à casa de Henrik Vanger, na estrada em direção a Östergarden. Logo depois da casa de Henrik, pegou uma bifurcação à esquerda e seguiu por um caminho que costeava a praia. As bóias luminosas piscavam na água e as luzes de Hedestad cintilavam na noite. Era bonito. Ele tinha necessidade de ar fresco, mas queria sobretudo evitar os olhos inquisidores de Isabella Vanger. Junto à casa de Martin Vanger, voltou para a estrada e chegou à casa de Cecilia pouco depois das oito e meia. Logo subiram para o quarto dela.

Viam-se uma ou duas vezes por semana. Cecilia tornara-se não apenas sua amante naquele fim de mundo mas também a pessoa com quem começava a se abrir. Discutia muito mais sobre Harriet Vanger com ela do que com Henrik.

O plano começou a fracassar quase imediatamente.

O dr. Nils Bjurman vestia um robe ao abrir a porta do apartamento. Ficara nervoso com o atraso dela e fez-lhe um sinal para que entrasse. Ela vestia jeans preto, uma camiseta preta e sua indefectível jaqueta de couro. Botas pretas, uma pequena mochila nas costas, com alças a tiracolo sobre o peito.

— Não sabe ler as horas? — perguntou Bjurman, irritado.

Salander não disse nada. Olhou ao redor. O apartamento era o que havia imaginado depois de examinar a planta nos arquivos municipais. Os móveis eram de madeira clara.

— Entre — disse Bjurman num tom mais amável. Pôs o braço sobre os ombros dela e a guiou através de um pequeno vestíbulo. Não vale a pena perder tempo com conversa. Abriu a porta de um quarto. Não havia nenhuma dúvida sobre os favores que esperava de Lisbeth Salander.

Ela deu uma rápida olhada na peça. Quarto de solteiro. Cama de casal com uma cabeceira alta de aço inox. Uma cômoda também fazia às vezes de mesa-de-cabeceira. Luzes indiretas. Um espelho ao longo da parede. Uma poltrona de vime e uma mesa baixa no canto, junto à porta. Ele pegou sua mão e a conduziu até a cama.

— Conte-me por que precisa de dinheiro desta vez. Mais equipamentos para o computador?

— Para comprar comida — ela respondeu.

— Claro. Eu sou mesmo um estúpido. Mas você faltou ao nosso último encontro. — Pôs a mão sob o queixo dela e ergueu-lhe o rosto para que seus olhos se encontrassem. — Como vai? Ela encolheu os ombros.

— Refletiu sobre o que falei outro dia?

— O quê?

— Lisbeth, não se faça de mais boba ainda. Quero que você e eu sejamos bons amigos e que nos ajudemos.

Ela não respondeu. O dr. Bjurman resistiu ao impulso de dar-lhe uma bofetada para despertá-la.

— Gostou da brincadeira de gente adulta que fizemos da outra vez?

— Não.

Ele ergueu as sobrancelhas.

— Lisbeth, não seja idiota.

— Preciso de dinheiro para comprar comida.

— É exatamente do que falamos na última vez. Basta ser gentil comigo que serei gentil com você. Mas se insistir em me contrariar... — Apertou-lhe com mais força o queixo e ela se soltou.

— Quero meu dinheiro. O que está querendo que eu faça?

— Sabe muito bem o que eu quero. — Pegou-a pelo ombro e jogou-a sobre a cama.

— Espere — disse rápido Lisbeth.

Dirigiu a ele um olhar resignado, depois balançou secamente a cabeça. Tirou a jaqueta de couro e olhou ao redor. Jogou a jaqueta em cima da poltrona de vime, pôs a mochila em cima da mesinha e deu alguns passos hesitantes em direção à cama. Então se deteve, tomada de uma apreensão súbita. Bjurman se aproximou.

— Espere — disse ela outra vez, como se tentasse fazê-lo ser razoável. — Não quero ser obrigada a te chupar toda vez que preciso de dinheiro.

O rosto de Bjurman mudou de expressão. De repente, esbofeteou-a com a palma da mão. Salander arregalou os olhos, mas, antes que tivesse tempo de reagir, ele a pegou pelo ombro e a pôs de bruços na cama. Ela ficou sem ação diante dessa violência repentina. Como tentasse se virar, ele a comprimiu contra a cama e sentou-se sobre ela com os joelhos abertos.

Assim como da outra vez, ela foi uma presa fácil para ele do ponto de vista puramente físico. Sua única possibilidade de resistir seria enfiar-lhe as unhas nos olhos ou usar uma arma. Mas o plano que previra fracassara. Merda, pensou Lisbeth Salander quando ele lhe arrancou a camiseta. Com uma lucidez aterradora, se deu conta de como havia sido ingênua.

Ouviu-o abrir uma gaveta da cômoda ao lado da cama, depois um ruído de metal. De início não entendeu o que estava acontecendo, até ver a argola fechar-se em volta de seu punho. Ele ergueu o braço dela, passou as algemas em volta de um dos pilares da cabeceira da cama e prendeu sua outra mão. Num abrir e fechar de olhos, arrancou-lhe as botas e o jeans. Por fim retirou-lhe a calcinha, que brandiu no ar.

— Vai aprender a confiar em mim, Lisbeth — disse. — Vou ensinar a você as regras desse jogo de adultos. Se não cooperar comigo, será punida. Se for gentil, seremos amigos.

E sentou-se novamente de joelhos abertos em cima dela.

— Então não gosta de sexo anal... — falou.

Lisbeth Salander abriu a boca para gritar. Ele a pegou pelos cabelos e enfiou-lhe a calcinha na boca. Ela sentiu que ele punha alguma coisa em volta de seus tornozelos, que abria suas pernas e as atava de modo a deixá-la totalmente vulnerável. Ela o ouvia andar pelo cômodo, mas não podia vê-lo. Os minutos passaram. Ela mal conseguia respirar. Por fim sentiu uma dor horrível quando ele brutalmente lhe enfiou alguma coisa no ânus.