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Não conseguia distinguir as bem-nascidas das mal-nascidas. Nuas, eram só crianças. Todas inocentes, todas vulneráveis, todas merecedoras de uma vida longa, de amor, de proteção. “Ali estão os teus domínios,” disse ao filho e herdeiro, “lembra-te deles, em tudo o que faças.” A minha mãe disse-me as mesmas palavras quando eu tive idade sufi ciente para abandonar as lagoas. Para um príncipe chamar as lanças é fácil, mas no fim são as crianças que pagam o preço. Para bem delas, o príncipe sábio não travará guerras até ter bons motivos, nem travará nenhuma guerra que não tenha esperança de vencer. Eu não sou nem cego nem surdo. Sei que todas vós me julgais fraco, assustado, débil. O vosso pai conhecia-me melhor. Oberyn sempre foi a víbora. Mortífero, perigoso, imprevisível. Nenhum homem se atrevia a pisá-lo. Eu era a relva. Agradável, amável, bem cheiroso, a balançar a cada brisa. Quem teme caminhar sobre a relva?

Mas é a relva que oculta a víbora dos seus inimigos, e a abriga até atacar.

O vosso pai e eu trabalhávamos mais proximamente do que vós julgais…

mas agora ele foi-se. A questão é: posso confiar nas filhas dele para me servirem no seu lugar?

Hotah estudou-as a todas, uma de cada vez. Obara, de tachões ferrugentos e couro fervido, com os seus olhos zangados e juntos e cabelo castanho de ratazana. Nymeria, lânguida, elegante, de pele cor de azeitona, com a longa trança negra atada com fi o de um tom dourado de vermelho. Tyene, de olhos azuis e loura, uma rapariga-mulher com as suas mãos suaves e pequenos risinhos.

Tyene respondeu pelas três.

— É não fazer nada que é difícil, tio. Entregai-nos uma tarefa, qualquer tarefa, e descobrireis que somos tão leais e obedientes como qualquer príncipe poderia esperar.

— É bom ouvir isso — disse o príncipe — mas as palavras são vento. Vós sois filhas do meu irmão, e amo-vos, mas aprendi que não posso confiar em vós. Quero o vosso juramento. Jurais servir-me, fazer o que eu ordenar?

— Se tiver de ser — disse a Senhora Nym.

— Então jurai-o agora, pela campa do vosso pai.

A cara de Obara escureceu.

— Se não fôsseis meu tio…

— Mas sou teu tio. E teu príncipe. Jura, ou então vai-te embora.

— Eu juro — disse Tyene. — Pela campa do meu pai.

— Eu juro — disse a Senhora Nym. — Por Oberyn Martell, a Víbora Vermelha de Dorne, e um homem melhor do que vós.

— Pois — disse Obara. — Eu também. Pelo pai. Juro.

O príncipe perdeu alguma da tensão. Hotah viu-o voltar a recostar-se na cadeira. Estendeu a mão, e a Princesa Arianne foi para junto dele para a segurar.

— Contai-lhes, pai.

O Príncipe Doran inspirou entrecortadamente.

— Dorne ainda tem amigos na corte. Amigos que nos contam coisas que não devíamos saber. Este convite que Cersei nos enviou é um estratagema. Trystane não deverá nunca chegar a Porto Real. No caminho de regresso, algures na mata de rei, o grupo de Sor Balon será atacado por fora-da-lei, e o meu filho morrerá. Sou convidado a ir à corte só para poder ser testemunha deste ataque com os meus próprios olhos, e assim absolver a rainha de todas as culpas. Oh, e esses fora-da-lei?

Estarão a gritar “Meio-homem, Meio-homem,” enquanto atacam. Sor Balon pode até ter um breve vislumbre do Duende, embora mais ninguém o veja.

Areo Hotah não teria julgado ser possível chocar as Serpentes de Areia. Ter-se-ia enganado.

— Que os Sete nos salvem — murmurou Tyene. — Trystane? Porquê?

— A mulher deve ser louca — disse Obara. — Ele não passa de um rapaz.

— Isto é monstruoso — disse a Senhora Nym. — Eu não acreditaria em tal coisa. Feita por um cavaleiro da Guarda Real, não.

— Eles juram obedecer, tal como o meu capitão jurou — disse o príncipe. — Eu também tive as minhas dúvidas, mas todas vistes como Sor Balon se mostrou relutante quando sugeri irmos por mar. Um navio teria estragado todos os preparativos da rainha.

Obara tinha a cara corada.

— Devolvei-me a lança, tio. Cersei enviou-nos uma cabeça. Devíamos enviar-lhe de volta um saco delas.

O Príncipe Doran ergueu uma mão. Tinha os nós dos dedos tão escuros como bagas e quase do mesmo tamanho.

— Sor Balon é um hóspede sob o meu teto. Comeu do meu pão e do meu sal. Não lhe farei mal. Não. Viajaremos até aos Jardins de Água, onde ele ouvirá a história de Myrcella e de onde enviará um corvo à sua rainha.

A rapariga vai pedir-lhe para dar caça ao homem que lhe fez mal. Se for o homem que julgo que é, Swann não será capaz de recusar. Obara, tu vais levá-lo ao Alto Ermitério para enfrentar o Estrela Negra no seu covil. Ainda não chegou o momento de Dorne desafiar abertamente o Trono de Ferro, portanto temos de devolver Myrcella à mãe, mas eu não a acompanharei.

Essa tarefa será tua, Nymeria. Os Lannister não gostarão da ideia, tal como não gostaram quando lhes enviei Oberyn, mas não se atrevem a recusar.

Precisamos de uma voz no conselho, de um ouvido na corte. Mas tem cuidado. Porto Real é um ninho de cobras.

A Senhora Nym sorriu.

— Ora, tio, eu adoro cobras.

— Então e eu? — perguntou Tyene.

— A tua mãe era uma septã. Oberyn disse-me uma vez que ela te lia excertos da Estrela de Sete Pontas desde o berço. Quero-te também em Porto Real, mas na outra colina. As Espadas e as Estrelas foram formadas de novo, e este novo Alto Septão não é a marioneta que os outros eram. Tenta aproximar-te dele.

— E porque não? O branco combina bem com as minhas cores. Pareço tão… pura.

— Ótimo — disse o príncipe — ótimo. — Hesitou. — Se… se certas coisas se concretizarem, mandar-vos-ei dizer a todas. As coisas podem mudar rapidamente no jogo dos tronos.

— Eu sei que não nos deixareis ficar mal, primas. — Aryanne foi ter com elas, uma de cada vez, pegou-lhes nas mãos, beijou-as levemente nos lábios. — Obara, tão feroz. Nymeria, minha irmã. Tyene, querida. Amo-vos a todas. O sol de Dorne vai convosco.

— Insubmissos, não curvados, não quebrados — disseram as Serpentes de Areia, juntas.

A Princesa Arianne deixou-se ficar quando as primas se foram embora. Areo Hotah também ficou, como lhe competia.

— São filhas do seu pai — disse o príncipe.

A princesinha sorriu.

— Três Oberyns, com mamas.

O Príncipe Doran riu-se. Passara-se tanto tempo desde a última vez que Hotah o ouvira rir que quase se esquecera de como soava.

— Ainda digo que devia ser eu a ir para Porto Real em vez da Senhora Nym — disse Arianne.

— É demasiado perigoso. És a minha herdeira, o futuro de Dorne. O teu lugar é a meu lado. Muito em breve terás outra tarefa a cumprir.

— Aquela última parte, sobre a mensagem. Recebestes notícias?

O Príncipe Doran partilhou com ela o seu sorriso secreto.

— De Lys. Uma grande frota fez lá escala para se abastecer de água.

Navios volantenos, na maioria, transportando um exército. Não há notícia de quem eram, ou de para onde se dirigiam. Falou-se de elefantes.

— De dragões não?

— Elefantes. Mas é bastante simples esconder um dragão jovem no porão de uma grande coca. É no mar que Daenerys é mais vulnerável. Se fosse a ela, manter-me-ia escondido, e às minhas intenções, o máximo possível, para poder apanhar Porto Real desprevenido.

— Achais que Quentyn está com eles?

— Pode estar. Ou não. Saberemos pelo local onde desembarcam, se o seu destino for realmente Westeros. Quentyn trá-la-á pelo Sangueverde, se puder. Mas de nada serve falar do assunto. Beija-me. Partimos para os Jardins de Água à primeira luz da aurora.

Então talvez partamos pelo meio-dia, pensou Hotah.

Mais tarde, depois de Arianne se ir embora, pousou o machado e carregou o Príncipe Doran para a cama.

— Até a Montanha esmagar o crânio do meu irmão, nenhum dornês tinha morrido nesta Guerra dos Cinco Reis — murmurou o príncipe suavemente, enquanto Hotah lhe punha uma manta em cima. — Diz-me, capitão, isso é a minha vergonha ou a minha glória?