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Rayder liderara o povo livre contra a Muralha, os seus seguidores condu­ziam grandes rebanhos de ovelhas e cabras e suínos, mas agora os únicos animais que estavam à vista eram os mamutes. Não duvidava de que, se não fosse a ferocidade dos gigantes, esses também teriam sido mortos. Havia muita carne presa aos ossos de um mamute.

Jon também viu sinais de doença. Isso inquietou-o mais do que podia expressar. Se o bando de Tormund estava faminto e doente, como estariam os milhares que tinham seguido a Mãe Toupeira para Larduro? Cotter Pyke deve chegar a eles em breve. Se os ventos forem favoráveis, a sua frota pode perfeitamente estar neste momento de regresso a Atalaialeste, com todos os membros do povo livre que conseguiu amontoar a bordo.

—   Como vos saístes com Tormund? — perguntou Val.

—   Perguntai-me daqui a um ano. A parte difícil ainda me espera. A parte onde convenço os meus a comer a refeição que cozinhei para eles. Temo que nenhum vá gostar do sabor.

—   Deixai-me ajudar.

—   Já ajudastes. Trouxestes-me Tormund.

—   Posso fazer mais.

E porque não?, pensou Jon. Estão todos convencidos de que ela é uma princesa. Val tinha um aspeto adequado ao papel, e montava como se ti­vesse nascido em cima de um cavalo. Uma princesa guerreira, decidiu, não uma qualquer criaturinha elegante que se mantém no topo de unia torre, escovando o cabelo e esperando que um cavaleiro a salve.

—   Tenho de informar a rainha sobre este acordo — disse. — Podeis vir conhecê-la se encontrardes em vós o que é preciso para dobrar um jo­elho. — Não seria nada bom ofender Sua Graça antes mesmo de abrir a boca.

—   Posso rir-me enquanto ajoelho?

—  Não, não podeis. Isto não é um jogo. Um rio de sangue corre entre os nossos povos, antigo, profundo e vermelho. Stannis Baratheon é um dos poucos que são favoráveis a deixar entrar selvagens no reino. Preciso do apoio da sua rainha para aquilo que fiz.

O sorriso brincalhão de Val morreu.

—   Tendes a minha palavra, Lorde Snow. Serei para a vossa rainha uma princesa selvagem como deve ser.

Ela não é minha rainha, podia ele ter dito. Em boa verdade, o dia da sua partida não pode chegar depressa demais para mim. E, se os deuses forem bons, levará Melisandre consigo.

Seguiram o resto do dia montados em silêncio, com o Fantasma aos saltos logo atrás. O corvo de Mormont seguiu-os até ao portão, após o que bateu as asas para o alto enquanto o resto do grupo desmontava. O Cavalo seguiu à frente com um archote para iluminar o caminho através do túnel gelado.

Uma pequena multidão de irmãos negros aguardava junto do por­tão quando Jon e os companheiros emergiram a sul da Muralha. Ulmer da Mata de Rei encontrava-se entre eles, e foi o velho arqueiro que avançou para falar pelos outros.

—   Se aprouver ao senhor, os rapazes estavam curiosos. Vai ser a paz, senhor? Ou sangue e ferro?

—   Paz — respondeu Jon Snow. — Daqui a três dias, Tormund Ter­ror dos Gigantes levará o seu povo a atravessar a Muralha. Como amigos, não como inimigos. Alguns podem mesmo ampliar as nossas fileiras, como irmãos. Caber-nos-á a nós fazer com que se sintam bem-vindos. Agora regressai aos vossos deveres. — Jon entregou as rédeas do cavalo ao Ce­tim. — Tenho de falar com a Rainha Selyse. — Sua Graça encararia como desfeita se ele não fosse imediatamente ter com ela. — Depois, terei cartas a escrever. Leva pergaminho, penas e um pote de preto de meistre para os meus aposentos. Depois chama Marsh, Yarwyck, o Septão Cellador e Clydas. — Cellador estaria meio bêbado, e Clydas era fraco substituto para um verdadeiro meistre, mas eram o que tinha. Até que Sam regresse. — Os nortenhos também. O Flint e o Norrey. Couros, tu também lá devias estar.

—  O Hobb está a fazer empadões de cebola — disse o Cetim. — Devo pedir que se juntem todos a vós para o jantar?

Jon refletiu.

—   Não. Pede-lhes para se juntarem a mim no topo da Muralha ao pôr-do-sol. — Virou-se para Val. — Senhora. Comigo, por favor.

—   O corvo manda, a cativa tem de obedecer. — O seu tom de voz era brincalhão. — Esta vossa rainha deve ser feroz, se as pernas de homens feitos cedem debaixo dos seus corpos quando se encontram com ela. Deve­ria ter-me vestido de cota de malha em vez de lã e peles? Esta roupa foi-me dada por Dalla, preferia não a encher de manchas de sangue.

—  Se as palavras fizessem sangrar, talvez tivésseis motivo para temer. Julgo que a vossa roupa está suficientemente a salvo, senhora.

Abriram caminho até à Torre do Rei, por caminhos acabados de lim­par à pazada, entre montes de neve suja.

—   Ouvi dizer que a vossa rainha tem uma grande barba escura.

Jon sabia que não devia sorrir, mas sorriu.

—   É só um bigode. Muito ralo. Conseguem-se contar os pelos.

—   Que desapontamento.

Apesar de toda a conversa sobre querer ser senhora dos seus domí­nios, Selyse Baratheon não parecia ter grande pressa de trocar o conforto de Castelo Negro pelas sombras de Fortenoite. Mantinha guardas, claro;

quatro homens à porta, dois do lado de fora, nos degraus, dois do lado de dentro, junto do braseiro. A comandá-los estava Sor Patrek da Montanha Real, vestido com o seu traje de cavaleiro branco, azul e prateado, e com uma sementeira de estrelas de cinco pontas no manto. Quando foi apresen­tado a Val, o cavaleiro caiu sobre um joelho para lhe beijar a luva.

—   Ainda sois mais adorável do que me foi dito, princesa — declarou.

—   A rainha falou-me muito da vossa beleza.

—  Que estranho, se ela nunca me viu. — Val deu uma palmadinha na cabeça de Sor Patrek. — Vá, upa, upa, sor ajoelhador. Para cima, para cima.

—   Parecia estar a falar com um cão.

Foi com grande dificuldade que Jon evitou rir-se. Com uma expres­são pétrea, disse ao cavaleiro que pediam uma audiência com a rainha. Sor Patrek mandou um dos guardas precipitar-se escada acima, a fim de inqui­rir se Sua Graça os receberia.

—   Mas o lobo fica aqui — insistiu Sor Patrek.

Jon já o esperava. O lobo gigante deixava a Rainha Selyse ansiosa, quase tanto como Wun Weg Wun Dar Wun.

—   Fantasma, fica.

Foram encontrar Sua Graça a coser junto da lareira, enquanto o seu bobo dançava em redor, ao som de música que só ele conseguia ouvir, fa­zendo repicar os badalos que trazia presos às hastes.

—    O corvo, o corvo — gritou o Cara-Malhada quando viu Jon. — Debaixo do mar os corvos são brancos como neve, eu sei, eu sei, hei, hei, hei. — A Princesa Shireen estava enrolada sobre si própria num banco de janela, com o capuz erguido para esconder o pior da escamagris que lhe desfigurara a cara.

Não havia sinal da Senhora Melisandre. Por isso, Jon sentiu-se grato. Mais cedo ou mais tarde teria de encarar a sacerdotisa vermelha, mas pre­feria que não fosse na presença da rainha.

—   Vossa Graça — Caiu sobre um joelho. Val imitou-o.

A Rainha Selyse pôs de parte a costura.

—   Podeis erguer-vos.

—  Se aprouver a Vossa Graça, posso apresentar-vos a Senhora Val? A irmã Dalla foi...

—   ... mãe daquele bebé chorão que nos mantém acordados à noite. Eu sei quem ela é, Lorde Snow. — A rainha fungou. — Sois afortunado por cia ter regressado para junto de nós antes do rei meu esposo, caso contrário as coisas poderiam ter corrido mal para o vosso lado. Muito mal mesmo.

—   Sois vós a princesa selvagem? — perguntou Shireen a Val.

—   Há quem me chame isso — disse Val. — A minha irmã foi mulher de Mance Rayder, o Rei-para-lá-da-Muralha. Morreu a dar-lhe um filho.

—   Eu também sou uma princesa — anunciou Shireen — mas nunca tive uma irmã. Em tempos tive um primo, antes de ele embarcar. Era só um bastardo, mas eu gostava dele.