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— E não sou...

— Então, qual é o problema? Alguma coisa está distraindo você? Está se sentindo infeliz, deprimido...?

Meu Deus, eu não sei! Será? Será essa sensação? Talvez seja o caso. Talvez eu devesse falar sobre Alice. Será que estar apaixonado é desculpa para um comportamento irracional? Foi para Otelo, sem dúvida. Mas e para mim?

— Então... Você gostaria de conversar sobre alguma coisa?

Estou apaixonado por uma mulher linda. Mais apaixonado do que nunca. Tanto que sou incapaz de pensar em qualquer outra coisa, mas ela é inatingível. Na melhor das hipóteses, ela me acha divertido, e, na pior, repulsivo, e acho que talvez eu esteja ficando um pouco maluco...

— Não, acho que não.

— Bem, então eu não sei qual é o problema, pois o seu aproveitamento desse ano, 74%, 64%, 58% e esses 53%, sugere que você está ficando menos inteligente. O que, estranhamente, não é o objetivo de um curso superior...

25

PERGUNTA: Onde estão localizados as pontes, os fascículos arqueados, a área de Wernicke e a fissura de Rolando?

RESPOSTA: No cérebro.

É verdade. Estou ficando burro. Ou deveria dizer mais burro?

E não é só o fato de ter entrado por pouco no time do Desafio; são as aulas. Sento-me na carteira, todo entusiasmado e alerta, mas, mesmo quando o tema é algo que realmente me interessa, como poesia metafísica, o desenvolvimento do soneto ou a ascensão da classe média nos romances ingleses, percebo que, em dez minutos, estou tão perdido e confuso que, se estivesse ouvindo uma partida de futebol do rádio, daria na mesma. Entro na biblioteca da universidade, a qual quase geme em voz alta com o peso e o tamanho do conhecimento humano, e acontecem sempre as mesmas duas coisas: a) começo a pensar em sexo; b) tenho vontade de ir ao banheiro. Durmo no meio das aulas, deixo de ler um livro por estar sempre com sono, ou nem chego a entender o texto, ou não entendo as referências, fico olhando as garotas na sala de aula, e, mesmo quando entendo uma aula, não sei o que dizer a respeito, nem se concordo ou discordo do assunto. Estou tendo a oportunidade, à custa do Estado, de estudar trabalhos de arte belos, eternos e inspiradores, e minha resposta a tudo isso nunca chega a ser mais profunda do que um sinal de positivo ou negativo com o polegar. Enquanto isso, uma mocinha inteligente e de cabelos brilhantes na fileira da frente levanta a mão e diz algo como você não acha que, em termos formais, a linguagem de Ezra Pound é muito hermética e ensimesmada para ser lida em termos estruturais?, e, mesmo entendendo cada palavra, lida, formalmente, é e até hermética, não faço ideia do que querem dizer nessa ordem.

É o mesmo quando tento ler essas coisas. Tudo vira mingau na minha cabeça, fazendo com que um poema importante e profundo como Mont Blanc, de Shelley, fique, mais ou menos, assim: O Interminável Universo das Coisas/ Fluem pela mente e rolam a correnteza blá/ Agora, escuro... blá-di-dá, blá-blá-blá até desmoronar e se desintegrar. Claro que, se Shelley tivesse lançado Mont Blanc num single, eu seria capaz de recitar palavra por palavra e até dizer a posição entre os mais vendidos, mas, por ser literatura e exigir intelecto, não sei como proceder. O triste fato é que adoro Dickens, Donne, Keats, Eliot, Forster, Conrad, Fitzgerald, Kafka, Wilde, Orwell, Waugh, Marvell, Greene, Sterne, Shakespeare, Webster, Swift, Yeats, Joyce e Hardy. Adoro muito, muito mesmo. Só que eles não correspondem ao meu amor.

Quando isso começou? Por que nada está acontecendo como deveria? Afinal, o cérebro é um músculo, e pensei que um músculo bem exercitado entraria no ritmo, se tornaria um punho de proteína eletricamente carregado e bem-azeitado. Mas sinto a cabeça cheia de matéria quente e úmida, cinzenta, gordurosa e inútil, o tipo da coisa que você encontra embrulhada num saco plástico dentro de um frango de supermercado. Na realidade, agora que parei para pensar, nem tenho certeza de que o cérebro é um músculo. É um órgão? Um tecido? Uma glândula? O meu cérebro, sem dúvida, parece uma glândula.

E, nessa noite, essa atividade glandular está no auge, no treino para o Desafio no apartamento de Patrick. É o primeiro do ano, e, apenas a um mês da nossa primeira aparição na televisão, Patrick está particularmente nervoso e prestes a introduzir um novo e excitante elemento nos procedimentos. Ele passou as férias de Natal construindo campainhas — quatro aparelhos movidos à pilha feitos de luzes de natal e botões parafusados em quadrados de madeiras do tamanho de um LP pintados com esmalte vermelho. E está orgulhoso dessa inovação, pois eu mal tenho tempo de dizer olá e feliz Ano-novo para Lucy Chang, ou perguntar a Alice como foi a audição, e já estamos no sofá com as campainhas nos joelhos. Patrick se acomoda numa cadeira de escritório com um grande fichário 4 por 6, ajusta a postura e começa...

— Então, sua pergunta inicial valendo 10 pontos: qual primeiro-ministro britânico do século XVIII foi apelidado de o Grande Camponês?

Aperto o botão.

— Gladstone? — sugiro.

— Não — responde Patrick. — Alguém mais?

— Pitt, o Ancião? — arrisca Alice.

— Resposta certa. São cinco pontos a menos, Brian. Eu disse século XVIII, não disse?

— Sim, disse...

— E Gladstone foi no século dezeno...

— É, eu sei...

— Ok. Qual dos países a seguir não tem costa marítima? Nigéria, Mali, Chade ou Sudão?

Acho que essa eu sei... Aperto o botão e digo...

— Sudão!

— Não — replica Patrick.

Lucy Chang diz:

— Todos, menos o Sudão?

— Correto. São 10 pontos a menos, Brian. Ok, o nervo vestibular, o tensor do tímpano, a âmbula, o utrículo e o sáculo são partes de que órgão?

Não faço ideia, mas percebo que apertei o botão assim mesmo.

— Brian? — resmunga Patrick.

— Desculpa... Apertei por engano...

— Então, são 15 pontos a menos...

— Eu sei. Foi um engano... Meu dedo escorregou...

— Qual é a resposta, Lucy?

— O ouvido?

— Exatamente, o ouvido! O que você está cursando, Lucy?

— Medicina.

— E o que você está cursando, Brian?

— Literatura inglesa...

— Exatamente. Literatura inglesa. E não acha que, talvez, Lucy esteja mais qualificada para responder...?

— Sem dúvida, mas já disse que meu dedo escorregou. Esses botões são muito sensíveis ao toque...

— Então, a culpa é dos meus botões?

— Bem...

— Você não acha que os botões de verdade vão ser sensíveis ao toque também?

— Tenho certeza que sim, Patrick...

— Eu já estive diante desses botões uma vez, e posso dizer que é preciso ter muita, muita certeza da resposta antes de apertar...

— Será que a gente pode seguir adiante? — pergunta Alice, aborrecida. — Preciso estar em outro lugar às 21h30...

— Onde? — pergunto, de repente ansioso.

— Vou encontrar uma pessoa. Algum problema? — responde ela. Lucy e Patrick trocam um olhar.

— Claro que não. Só pensei que íamos bebericar alguma coisa depois...

— Hoje não vai dar. Tenho a segunda fase do teste da Hedda Gabler. — Consigo me conter um pouco, mas, sem querer, aperto o botão.