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— Você não falou que era urgente. Estou razoavelmente ocupado.

— Eu não falei que era urgente. Falei que era para você buscar o Johannes Frisk e vir até a minha sala. Eu disse "agora mesmo", o que queria dizer imediatamente, e não hoje à noite ou na semana que vem, ou quando fosse conveniente para você tirar a bunda da cadeira.

— Ei, eu estou achando...

— Feche a porta.

Ela esperou Lukas Holm fechar a porta atrás de si. Erika o observou em silêncio. Ele era, sem dúvida, um chefe de Atualidades particularmente competente, cujo papel era cuidar para que as páginas do SMP sempre trouxessem bons textos, compreensíveis e organizados no espaço definido durante a reunião da manhã. Lukas Holm, de fato, fazia diariamente malabarismo com uma quantidade gigantesca de tarefas. E fazia isso sem deixar cair nenhuma bola.

O problema é que ele ignorava sistematicamente as decisões de Erika Berger. Por quase duas semanas, ela tentara achar um jeito de conseguir trabalhar com ele. Argumentara com cordialidade, experimentara ordens diretas, o estimulara a pensar de forma diferente e, no geral, fizera de tudo para ele entender qual a concepção que ela tinha do jornal.

Nada disso funcionara.

Um texto recusado por ela à tarde aparecia no jornal à noitinha, quando ela voltava para casa. E que excluímos um texto e ficamos com uma lacuna que tínhamos que preencher de qualquer maneira, ele dizia.

O título escolhido por Erika de repente era rejeitado e substituído por outro bem diferente. Nem sempre era ruim, mas isso acontecia sem que ela fosse consultada. Acontecia, inclusive, de maneira provocativa e ostensiva.

Sempre se tratava de ninharias. A reunião da redação prevista para as catorze horas era adiantada para as 13h50 de uma hora para outra, sem que ela fosse informada, a maioria das decisões já estava tomada quando ela por fim chegava. Oh, me desculpe... esqueci completamente de te avisar.

Era muito difícil para Erika Berger entender por que Lukas Holm assumia essa atitude em relação a ela, mas o fato é que as conversas cordiais e as reprimendas discretas não funcionavam. Até então, achara melhor não discutir o problema na presença de outros colaboradores da redação, procurando limitar sua irritação às conversas pessoais e confidenciais. Nada surtira efeito, de modo que chegara a hora de se expressar mais claramente, dessa vez na presença do colaborador Johannes Frisk, garantia de que o teor da conversa se espalharia por toda a redação.

— A primeira coisa que eu disse quando comecei a trabalhar aqui foi que tenho um particular interesse por tudo o que diz respeito a Lisbeth Salander. Expliquei que queria ser informada de todos os artigos que estivessem previstos e que queria olhar e aprovar tudo o que fosse ser publicado. Já lembrei você disso pelo menos uma dúzia de vezes, sendo que a última vez foi na reunião da redação de sexta-feira passada. Que parte dessa instrução você não entendeu?

— Todos os textos previstos ou já na fase de redação estão nas pautas diárias na intranet. Eles são sistematicamente enviados para o seu computador. Você é informada o tempo todo.

— Balela. Quando recebi o SMP na minha caixa de correspondência hoje de manhã, encontrei três colunas sobre a Salander e o acompanhamento do caso de Stallarholmen no espaço nobre de Atualidades.

— Era o texto da Margareta Orring. Ela é frila e só mandou o texto ontem lá pelas sete da noite.

— A Margareta Orring ligou para oferecer o artigo ontem às onze da manhã. Você aceitou e encomendou o trabalho por volta das onze e meia. E não disse uma palavra sobre assunto na reunião das duas da tarde.

— Mas ele consta na pauta do dia.

— Ah, é? Na pauta do dia consta o seguinte: "Margareta Orring, entrevista com a procuradora Martina Fransson. Cf. apreensão de entorpecentes em Sõdertãlje".

— O assunto de base era uma entrevista com a Martina Fransson a respeito de uma apreensão de esteroides anabolizantes, que resultou na prisão de um membro do MC Svavelsjõ.

— Tá bom! E na pauta do dia não aparece uma palavra sobre o MC Svavelsjõ nem sobre o fato de que o artigo iria se articular em torno de Magge Lundin e Stallarholmen e, portanto, em torno de Lisbeth Salander.

— Imagino que a coisa tenha se definido no decorrer da entrevista...

— Lukas, não sei qual o motivo, mas você está mentindo para mim enquanto olha nos meus olhos. Eu falei com a Margareta Orring, que escreveu o texto. Ela lhe explicou muito claramente qual era o assunto central da entrevista.

— Sinto muito, mas acho que não entendi que ela ia focar na Salander. Acontece que recebi o texto muito tarde, já de noite. O que eu devia fazer? Jogar tudo fora? E um bom texto, esse da Orring.

— Nesse ponto nós concordamos. E um texto excelente. E chegamos à sua terceira mentira em mais ou menos três minutos. Porque a Orring entregou o texto às três e vinte da tarde, ou seja, muito antes das seis horas, quando eu saí.

— Berger, eu não estou gostando do seu tom.

— Ótimo. Então posso dizer que eu também não gosto do seu tom, nem dos seus pretextos, nem das suas mentiras.

— Quem ouve até pode achar que eu estou armando algum tipo de conspiração contra você.

— Você ainda não respondeu a minha pergunta. E agora mais esta: hoje chega à minha mesa este texto do Johannes Frisk. Não lembro de termos falado sobre ele na reunião das duas horas. Como pode um dos nossos jornalistas ter passado o dia trabalhando sobre a Salander sem que eu estivesse á par?

johannes Frisk se remexeu na cadeira. Teve o bom senso de permanecer calado.

— Mas afinal... a gente está produzindo um jornal. Deve haver centenas de textos que você não conhece. Aqui no SMP a gente tem uma rotina, e cabe a cada um se adaptar a ela. Não tenho nem tempo nem condições de me deter em certos textos específicos.

— Eu não lhe pedi que se detivesse em certos textos específicos. Eu exigi, primeiro, ser informada de tudo o que diz respeito ao caso Salander e, segundo, poder endossar tudo o que fosse publicado sobre o assunto. Então vou repetir a pergunta: que parte dessa instrução você não entendeu?

Lukas Holm suspirou e exibiu uma expressão atormentada.

— Está bem — disse Erika Berger. — Então vou ser mais clara ainda. Não tenho a intenção de ficar discutindo. Vamos ver se você entende a seguinte mensagem. Se essa situação se repetir, tiro você da editoria de Atualidades. Vai ser o maior bafafá, e depois disso você vai ficar redigindo a página Família, ou Lazer, ou algo assim. Não posso ficar com um editor de Atualidades em quem não confio, ou com quem não posso trabalhar, e que passa o tempo todo boicotando as minhas decisões. Está entendido?

Lukas Holm fez um gesto de mãos para expressar como achava um delírio as acusações de Erika Berger.

— Entendeu? Ou não?

— Estou escutando.

— Eu perguntei se você entendeu ou não.

— Você acha mesmo que vai se safar desse jeito? Esse jornal só sai porque eu e outras peças desta engrenagem nos matamos de trabalhar. O conselho administrativo vai...

— O conselho vai fazer o que eu mandar. Estou aqui para renovar o jornal. Tenho uma missão expressa, que a gente negociou juntos com o maior cuidado e que me dá o direito de fazer mudanças de peso na redação no nível das chefias. Posso me desfazer do supérfluo e contratar sangue novo quando eu quiser. E, Holm, para mim você está começando a parecer cada vez mais supérfluo.

Ela se calou. Holm cruzou o olhar com o seu. Parecia furioso.

— É só isso — disse Erika Berger. — Sugiro que você reflita seriamente no que acabamos de falar.

— Não tenho a intenção...

— Só depende de você. É só. Pode se retirar.

Ele deu meia-volta e saiu do aquário. Ela o viu atravessar o formigueiro da redação e desaparecer na sala dos funcionários. Johannes Frisk se levantou para ir atrás dele.

— Você fica, Johannes. Sente-se.