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Eles vão fazer de tudo para reduzir os danos, e aí é que você de repente volta a ser um peão no jogo. Dessa feita, porém, não se trata de sacrificar um peão do tabuleiro — trata-se de eles reduzirem esses danos de maneira decisiva e por conta própria. Portanto, você vai acabar ficando sem saída.

Pensativa, Lisbeth mordeu o lábio inferior.

[A coisa funciona assim: eles sabem que não vão conseguir manter o Zalachenko em segredo por muito mais tempo. Eu sei da história e eu sou um jornalista. Eles sabem que mais cedo ou mais tarde eu vou publicar. Agora eles estão lutando é pela sobrevida deles. Por isso os seguintes pontos estão no topo da lista de prioridades deles:

(1) Eles precisam convencer o tribunal de grande instância (ou seja, a opinião pública) de que a decisão de internar você na Sankt Stefan em 1991 foi legítima — que você estava de fato psiquicamente perturbada.

(2) Precisam separar o "caso Lisbeth Salander" do "caso Zalachenko". Eles estão tentando se colocar em condições de afirmar que "Claro, o Zalachenko era um calhorda, mas isso nada teve a ver com a decisão de internar a filha dele. Ela foi internada porque era uma doente mental — qualquer afirmação diferente disso não passa de invencionices doentias de jornalistas amargurados. Não, não apoiamos o Zalachenko em nenhum crime; isso não passa de divagação ridícula de uma adolescente doente mental".

(3) O problema, portanto, é que se você for inocentada no próximo julgamento, o tribunal terá declarado que você não é louca, o que provará que sua internação em 1991 tinha algo de suspeito. Isso quer dizer que eles precisam condená-la a todo custo a um tratamento psiquiátrico numa instituição. Se o tribunal estabelecer que você é psiquicamente perturbada, a imprensa já não vai estar tão interessada em revolver o caso Salander. A imprensa funciona assim.

Você está acompanhando?

Lisbeth meneou a cabeça para si mesma. Já havia chegado a essas conclusões havia muito tempo. O problema é que ela não sabia muito bem como solver a situação.

Lisbeth — isso é sério —, esse jogo vai se dar na imprensa e não na sala de audiências. Infelizmente, por "razões de integridade", o julgamento vai ser a portas fechadas.

No dia em que o Zalachenko foi morto, meu apartamento foi assaltado. Não houve arrombamento nem mexeram em nada — com exceção de uma coisa. O dossiê que estava na casa de campo de Bjurman e que continha o relatório de 1991 do Gunnar Bjõrck desapareceu. No mesmo dia, minha irmã foi atacada e a cópia que ela tinha foi roubada. Esse dossiê é a sua prova mais importante.

Fingi que tínhamos perdido os documentos Zalachenko. Na verdade, tenho um terceiro exemplar, que eu ia passar para o Armanskij. Fiz várias cópias, que espalhei por aí.

Nosso adversário, que reúne algumas autoridades e alguns psiquiatras, também está tratando de montar o processo, é claro, com a ajuda do procurador Richard Ekstrõm. Tenho uma fonte que fornece algumas informações sobre o que está se tramando, mas imagino que você tenha mais condições de obter informações adequadas... Se for esse o caso, não temos muito tempo.

O procurador vai tentar fazer com que você seja condenada a uma internação psiquiátrica. Para isso, conta com o auxílio do seu velho amigo Peter Teleborian.

A Annika não vai poder se lançar numa campanha de imprensa no mesmo nível que o Ministério Público, que pode deixar vazar informações como bem lhe convém. Ou seja, ela está de mãos atadas.

Já eu, não estou preso por restrições desse tipo. Posso escrever rigorosamente o que quiser — e tenho, além disso, uma revista à minha disposição.

Faltam dois detalhes importantes:

(1) Primeiro, você precisaria de alguma coisa demonstrando que o procurador Ekstrõm está colaborando com o Teleborian de maneira indevida, e sempre com o objetivo de interná-la com os loucos. Eu queria poder aparecer no horário nobre da televisão e apresentar documentos acabando com os argumentos do procurador.

(2) Para poder sustentar uma guerra na imprensa contra a Sapo, preciso discutir em público coisas que você provavelmente considera de sua esfera privada. Desejar o anonimato a esta altura é meio que pedir demais, levando-se em conta tudo que foi dito na imprensa a seu respeito desde a Páscoa. Preciso ter condições de construir na mídia uma imagem sua inteiramente nova — mesmo que a seu ver isso represente uma agressão à sua intimidade —, e de preferência com o seu aval. Você entende o que eu quero dizer?]

Ela abriu a pasta [Tavola-Biruta]. Continha vinte e seis arquivos de tamanhos variados.

14.  QUARTA-FEIRA 18 DE MAIO

Rosa Figuerola se levantou às cinco da manhã na quarta-feira e fez um rápido jogging antes de tomar um banho e vestir uma calça jeans preta, uma regata branca e uma jaqueta leve de linho cinza. Preparou sanduíches e encheu uma garrafa térmica de café. Também vestiu o cinturão e tirou sua Sig Sauer do armário de armas. Pouco depois das seis horas, saiu no seu Saab 9-5 branco e foi até a Vittangigatan em Vâllingby.

Gõran Mârtensson morava no segundo e último andar de um prediozinho do subúrbio. Na terça-feira, ela levantara tudo o que conseguira sobre ele nos arquivos públicos. Era solteiro, o que não queria dizer que não morasse com alguém. Não havia nada sobre ele na Receita, ele não possuía nenhuma fortuna e seu nível de vida não parecia extravagante. Raramente faltava por motivo de saúde.

O único aspecto que poderia parecer digno de atenção era ele ter licença para dezesseis armas de fogo, sendo três espingardas de caça e pistolas de diferentes tipos. Ele ter porte de armas obviamente não constituía um crime, mas Rosa Figuerola nutria uma bem fundada desconfiança por pessoas que possuíam grande quantidade de armas.

O Volvo com a placa com as iniciais KAB estava num estacionamento a cerca de quarenta metros da praça em que Rosa Figuerola parou o carro. Ela serviu de meio copo de café preto e comeu um sanduíche de queijo e salada Depois descascou uma laranja e chupou demoradamente seus gomos.

Durante a visita matinal, Lisbeth Salander não estava em boa forma, sentia uma dor de cabeça terrível. Pediu um Alvedon, que lhe deram sem discutir.

Uma hora depois, a dor de cabeça tinha piorado. Tocou a campainha para chamar a enfermeira e pediu mais um Alvedon, que não fez efeito. Lá pelo meio-dia, Lisbeth estava com tanta dor de cabeça que a enfermeira chamou a Dra. Endrin, a qual, após um rápido exame, prescreveu analgésicos potentes.

Lisbeth deixou os comprimidos debaixo da língua e cuspiu-os fora assim que ficou sozinha.

Por volta das duas da tarde, começou a vomitar. Os vômitos recomeçaram por volta das três horas.

Por volta das quatro horas, chegou o Dr. Anders Jonasson, pouco antes de a Dra. Helena Endrin ir embora. Conversaram rapidamente.

— Ela está com náuseas e uma dor de cabeça muito forte. Receitei Dexofen. Não entendo o que está acontecendo... Ela vinha evoluindo tão bem nas últimas semanas. Pode ser algum tipo de gripe...

— Ela está com febre? — perguntou o Dr. Jonasson.

— Não, estava com 37,2 há uma hora. A pressão está normal.

— Certo. Vou ficar de olho nela esta noite.

— O problema é que estou saindo de férias por três semanas — disse Endrin. — Você ou o Svantesson é que vão ter que cuidar dela. Mas o Svantesson não acompanhou o caso direito...

— Certo. Passo a ser o médico responsável por ela enquanto você estiver fora.

— Maravilha. Se houver alguma crise e você precisar de ajuda, não hesite em me ligar.

Foram juntos visitar Lisbeth. Ela estava na cama, com o cobertor puxado até o nariz, e parecia péssima. Anders Jonasson pôs a mão em sua testa e verificou que estava úmida.