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— Por quê? — perguntou Erika Berger.

— O conselho nunca vai aceitar isso. Vai contra o bom-senso.

— Vamos retomar do início — sugeriu Erika Berger. — Fui contratada Para fazer o SMP voltar a ser rentável. Para conseguir isso, preciso ter condições de trabalhar, não é?

— É, mas...

— Não posso produzir o conteúdo de um jornal diário num passe de Mágica, torcendo para tudo dar certo trancada naquele aquário.

— Você não entende nada da realidade econômica.

— Pode até ser. Mas sei fazer um jornal. E a realidade é que de quinze anos para cá o número de funcionários do SMP sofreu uma redução de cento e dezoito pessoas. Até entendo que a metade era de designers gráficos que foram substituídos pelos avanços tecnológicos etc. e tal, mas o número de jornalistas que produzem texto sofreu uma redução de quarenta e oito pessoas nesse período.

— Foram cortes necessários. Sem eles, o jornal já teria deixado de existir há muito tempo.

— Vejamos o que é necessário e o que não é. Nesses três últimos anos, dezoito cargos de jornalistas foram eliminados. Além disso, hoje, nove cargos estão vagos e parcialmente cobertos por freelancers. A seção de Esportes tem um déficit enorme de pessoal. Deveria haver lá nove funcionários e, por mais de um ano, dois cargos ficaram sem ser preenchidos.

— Trata-se de economia. Simples assim.

— Três cargos não preenchidos na Cultura. Um cargo na editoria de Economia. A editoria de Direito não existe na prática, mas... temos ali um redator--chefe que quando necessário apela para os jornalistas da Geral. E tem muito mais, e pior. O SMP não faz nenhuma cobertura digna desse nome sobre os serviços estatais e as autoridades há pelo menos oito anos. Para isso, dependemos totalmente de freelancers e das informações repassadas pela TT... e, como vocês sabem, faz séculos que a TT desativou sua área de Serviços Públicos. Ou seja, não existe uma única redação na Suécia em condições de observar os Serviços Públicos e as autoridades do Estado.

— A imprensa escrita está passando por uma situação delicada...

— A realidade é que ou o SMP fecha as portas imediatamente, ou a direção resolve passar para o ataque. Temos hoje menos funcionários produzindo mais textos por dia. Os textos são medíocres, superficiais e carecem de credibilidade. Resultado: as pessoas deixam de ler o SMP.

— Parece que você não está entendendo...

— Estou cheia de ouvir vocês dizerem que eu não estou entendendo. Não sou nenhuma colegial estagiária que está aqui para se divertir.

— Mas a sua postura é insensata.

— Ah, é? Por quê?

— Está sugerindo que o jornal não gere receita.

- Escute, Sellberg, este ano você vai distribuir uma alta quantia de dinheiro em dividendos para os vinte e três acionistas do jornal. Acrescente-se bônus delirantes para os nove membros do conselho administrativo, que deverá custar ao SMP perto de dez milhões de coroas. Claro, estamos longe dos bônus que alguns diretores se auto-atribuíram na Skandia, mas a meu ver vocês não valem nem um centavo. Espera-se que o bônus seja dado quando alguém faz alguma coisa que fortaleça o SMP. Na verdade, as demissões que vocês promoveram enfraqueceram o SMP e só serviram para aumentar a crise.

— O que você está dizendo é muito injusto. O conselho ratificou todas as medidas que eu tomei.

— O conselho ratifica as suas medidas porque você garantiu uma distribuição anual de dividendos. É isso que deve acabar aqui e agora.

— Você está propondo a sério que o conselho tome a decisão de abolir toda a distribuição de dividendos e todos os bônus? Você imagina mesmo que os acionistas vão aceitar?

— Estou propondo um sistema de lucro zero para este ano. Isso equivaleria a uma economia de quase vinte e um milhões de coroas e à possibilidade de fortalecer a equipe e as finanças do SMP. Eu ganho por mês oitenta e oito mil coroas, o que é uma insanidade pura num jornal que não tem sequer condições de garantir os cargos da seção de Esportes.

— Então você quer reduzir seu próprio salário? Está defendendo uma espécie de comunismo dos salários, é isso?

— Não fale besteira. Você ganha cento e doze mil coroas por mês, contando o bônus anual. Isso é uma loucura. Se o jornal estivesse firme e os lucros fossem astronômicos, você poderia se conceder quantos bônus quisesse. Mas o momento, este ano, não é de aumentos. Proponho dividir pela metade o salário de todos os diretores.

—  O que você não entende é que os nossos acionistas são acionistas Porque querem ganhar dinheiro. Isso se chama capitalismo. Se propuser que eles percam dinheiro, não vão mais querer ser acionistas.

— Não estou propondo que eles percam dinheiro, mas também é possível que se chegue a isso. Ser proprietário implica responsabilidades. Você mesmo disse: aqui quem manda é o capitalismo. Os donos do SMP querem lucrar. Mas nas regras do capitalismo quem decide se vai haver lucro ou prejuízo é o mercado. Pelo seu raciocínio, você gostaria que essas regras valessem para todos os funcionários do SMP, mas que você e os acionistas fossem exceções.

Sellberg suspirou e ergueu os olhos para o céu. Desamparado, procurou Borgsjõ com o olhar. Borgsjõ estudava, pensativo, o programa de nove itens de Erika Berger.

Rosa Figuerola esperou quarenta e nove minutos até que Gõran Mârtensson e o desconhecido saíssem do prédio da Bellmansgatan. Quando começaram a subir a ladeira em sua direção, ela ergueu sua Nikon com teleobjetiva de trezentos milímetros e tirou duas fotos. Guardou a câmera no porta-luvas e voltou a se ocupar com seu mapa de Estocolmo, quando deu uma olhada na direção dos elevadores públicos. Não acreditou no que via. No alto da Bellmansgatan, bem do lado das portas do elevador, uma mulher morena estava filmando Mârtensson e seu assistente com uma câmera digital. Caramba... que porra é essa? Um congresso de espionagem na Bellmansgatan?

Mârtensson e o desconhecido se separaram no alto da rua sem se falar. Mârtensson foi até seu carro, na Tavastgatan. Ligou o motor, se afastou da calçada e saiu do campo de visão de Rosa Figuerola.

Ela desviou o olhar para o retrovisor e viu as costas do homem de macacão. Ergueu os olhos e viu que a mulher da câmera concluíra as filmagens e, indo na direção dele, chegava em frente à Casa Laurin.

Cara ou coroa? Ela já sabia quem era Gõran Mârtensson e qual sua profissão. Tanto o homem de macacão como a mulher da câmera eram cartas desconhecidas. Mas se ela saísse do carro, corria o risco de ser notada pela mulher da câmera.

Não se moveu. Pelo retrovisor, viu o homem de macacão dobrar na Brãnnkyrkagatan. Esperou que a mulher da câmera chegasse ao cruzamento à sua frente. Porém, em vez de seguir o homem de macacão, a mulher virou cento e oitenta graus e desceu em direção ao número 1 da Bellmansgatan. Rosa Figuerola viu uma mulher de uns trinta e cinco anos. Tinha cabelos castanhos curtos e usava calça jeans escura e jaqueta preta. Quando a mulher se distanciou um pouco mais, Rosa Figuerola abriu às pressas a porta do carro e correu em direção à Brãnnkyrkagatan. Não conseguia avistar o homem de macacão. Logo em seguida, uma caminhonete Toyota se afastou da calçada. Rosa Figuerola viu o homem de perfil e memorizou a placa. Mesmo que errasse número, conseguiria encontrá-lo. As laterais da caminhonete exibiam um núncio da Chaves e Ferraduras Lars Faulsson, com o número de telefone.

Não tentou correr até seu carro para seguir a Toyota. Andou calmamente chegou ao alto do morro bem a tempo de ver a mulher com a câmera desaparecendo dentro do prédio de Mikael Blomkvist.

Tornou a entrar no carro e anotou no caderninho o número da placa e do telefone de Chaves e Fechaduras Lars Faulsson. Depois, cocou a cabeça. Quanta movimentação misteriosa em torno do endereço de Mikael Blomkvist! Ergueu os olhos e avistou o telhado do prédio no número 1 da Bellmansgatan. Sabia que Blomkvist tinha um apartamento no último andar, mas, ao conferir os mapas do serviço municipal, observara que era um apartamento de fundos que dava para o lago de Riddarfjãrden e a cidade velha. Um endereço chique num antigo bairro histórico. Perguntou-se se ele se gabava disso.