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— Acho que vamos precisar de mais um café — disse por fim.

— Sim, obrigada — disse Rosa Figuerola.

Edklinth meneou a cabeça e o ministro da Justiça pegou a garrafa térmica.

— Deixem eu fazer um resumo para ter certeza de que entendi tudo direito — disse o primeiro-ministro. — Vocês desconfiam que exista uma conspiração dentro da Sapo, a qual estaria extrapolando suas atribuições constitucionais, e que, com o passar dos anos, essa conspiração manteve atividades que só podemos qualificar de criminosas.

Edklinth fez que sim com a cabeça.

— E vocês vieram me procurar porque não confiam na direção da Sapo.

— Sim e não — respondeu Edklinth. — Resolvi procurá-lo porque esse tipo de atividade contraria a Constituição, mas desconheço o objetivo da conspiração e não sei se posso ter interpretado mal algum elemento. Essa atividade poderia, afinal, ser legítima, e pode ter o aval do governo. Nesse caso, eu estaria partindo de informações erradas ou mal interpretadas e estaria arriscado a revelar uma operação secreta em andamento.

O primeiro-ministro olhou para o ministro da Justiça. Ambos compreendiam que Edklinth tomasse suas precauções.

— Nunca ouvi falar em nada parecido. Você está a par de alguma coisa?

— Em absoluto — respondeu o primeiro-ministro. — Não vi nada em nenhum relatório da Segurança que pudesse confirmar essa história.

— O Mikael Blomkvist acha que se trata de um grupo dentro da Sapo. Ele o chama de clube Zalachenko.

— Nunca ouvi falar nisso. A Suécia teria acolhido e mantido um dissidente russo desse calibre... Quer dizer que ele desertou durante o governo de Fãlldin...

— Custo a acreditar que Fãlldin tenha ocultado uma história dessas. - disse o ministro da Justiça. — Uma deserção dessa importância era para ser passada em absoluta prioridade para o governo seguinte.

Edklinth pigarreou.

— O governo de direita deixou para Olof Palme. Não é segredo para ninguém que alguns dos meus antecessores na Sapo tinham uma opinião bem particular sobre Palme...

— Quer dizer que alguém teria esquecido de informar o governo social -democrata...

Edklinth concordou com a cabeça.

— Eu gostaria de lembrar que Fãlldin cumpriu dois mandatos. Em ambas as ocasiões, o governo rachou. Na primeira vez, ele cedeu o lugar para Ola Ullsten, cujo governo era minoritário em 1979. Depois, o governo se fragmentou pela segunda vez, quando os moderados abandonaram o barco e Fãlldin governou com os liberais. Desconfio que a chancelaria do governo estava próxima do caos durante essas transferências de poder. É até possível que um caso como o de Zalachenko tenha permanecido num círculo tão restrito que o primeiro-ministro Fãlldin nem tomou conhecimento dele, de forma que nunca teve coisa alguma para repassar ao Palme.

— Nesse caso, quem seria o responsável? — perguntou o primeiro-ministro.

Todos, com exceção de Rosa Figuerola, balançaram a cabeça.

— Suponho que seja inevitável a imprensa ficar sabendo — disse o primeiro-ministro.

— O Mikael Blomkvist e a Millennium vão publicar. Ou seja, estamos numa posição incômoda.

Edklinth tivera o cuidado de usar a palavra nós. O primeiro-ministro meneou a cabeça. Entendia a gravidade da situação.

— Bem. Em primeiro lugar, queria lhe agradecer por ter me informado desse caso tão rapidamente. Não costumo aceitar encontros desse tipo sem aviso prévio, mas o ministro da Justiça me garantiu que o senhor era um homem sensato e que necessariamente algo extraordinário estava acontecendo, para que quisesse me ver assim, driblando todos os canais de praxe.

Edklinth respirou um pouco melhor. O que quer que acontecesse, não ria fulminado pela fúria do primeiro-ministro.

- Agora só nos resta resolver como administrar tudo isso. O senhor tem alguma sugestão?

— Talvez — respondeu Edklinth, hesitante.

Permaneceu calado por tanto tempo que Rosa Figuerola acabou dando uma tossidinha.

— Posso falar?

— Pois não — disse o primeiro-ministro.

— Se é mesmo verdade que o governo não está a par dessa operação, isso significa que ela é ilegal. Em casos assim, o criminoso é o responsável, ou seja, é o funcionário, ou os funcionários do Estado, que extrapolou suas atribuições. Se conseguirmos provar tudo o que Mikael Blomkvist afirma, significa que um grupo de funcionários da Segurança dedicou-se a uma atividade criminosa. O problema assume então dois aspectos.

— O que você quer dizer com isso?

— Em primeiro lugar, precisamos responder às perguntas: como isso foi possível? Quem é o responsável? Como uma conspiração dessas pode ter se realizado no âmbito de um órgão policial legitimamente estabelecido? Permita-me lembrar que eu mesma trabalho para a DGPN/Sapo, e me orgulho disso. Como isso pode ter se prolongado por tanto tempo? Como essa atividade pôde ser dissimulada e financiada?

O primeiro-ministro concordou com a cabeça.

— Esse aspecto vai ser abordado em livros que serão publicados — prosseguiu Rosa Figuerola. — Mas uma coisa é certa: existe necessariamente um financiamento, e ele deve girar em torno de vários milhões de coroas por ano. Examinei o orçamento da Segurança e não encontrei nada que pudesse ser chamado de clube Zalachenko. Mas, como sabem, existem alguns fundos secretos a que o secretário-geral e o diretor do orçamento têm acesso, e eu não.

O primeiro-ministro balançou a cabeça com tristeza. Por que a gestão da época sempre significava pesadelo?

— O outro aspecto diz respeito aos personagens principais dessa história. Mais precisamente, às pessoas que convém apanharmos.

O primeiro-ministro fez um muxoxo.

— Na minha opinião, as respostas a essas perguntas dependem da decisão que o senhor vai tomar dentro de alguns minutos.

Torsten Edklinth prendeu a respiração. Se pudesse, teria desfechado um pontapé na tíbia de Rosa Figuerola. Ela acabava de entrar de sola na retórica afirmando que o primeiro-ministro era pessoalmente responsável. Ele próprio cogitara chegar a essa conclusão, mas somente após uma longa digressão diplomática.

— Que decisão a senhora acha que devo tomar? — perguntou o primeiro-ministro.

— Quanto a nós, temos interesses em comum. Eu trabalho há três anos na Proteção à Constituição e considero essa missão de uma importância crucial para a democracia sueca. Nesses últimos anos, a Segurança se conduziu corretamente, dentro da Constituição. Para nós, é importante deixar claro que se trata de uma atividade criminosa comandada por indivíduos que agiram por conta própria.

— Esse tipo de atividade não conta, definitivamente, com o aval do governo — disse o ministro da Justiça.

Rosa Figuerola meneou a cabeça e refletiu por alguns segundos.

— De sua parte, imagino que o senhor não queira que esse escândalo atinja o governo, o que aconteceria se o governo tentasse ocultar o caso — disse ela.

— O governo não tem o hábito de ocultar atividades criminosas — disse o ministro da Justiça.

— Não, mas vamos, hipoteticamente, supor que ele tenha vontade de fazer isso. Nesse caso, o escândalo seria incalculável.

— Prossiga — disse o primeiro-ministro.

— A situação atual se complica com o fato de nós, da Proteção à Constituição, sermos obrigados a praticar ações que contrariam o regulamento para termos uma chance mínima de elucidar essa história. Gostaríamos que isso se desse do modo jurídica e constitucionalmente correto.

— É o que todos nós queremos — disse o primeiro-ministro.

— Sendo assim, sugiro que, na qualidade de primeiro-ministro, o senhor ordene que a Proteção à Constituição esclareça essa confusão o quanto antes. Que nos forneça uma ordem de missão por escrito e as autorizações necessárias.

- Não estou certo de que o que está sugerindo seja legal — disse o ministro da Justiça.