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Rosa Figuerola olhou para ela.

— Está tão na cara assim? — perguntou. Erika balançou a cabeça, negando.

— O Mikael falou alguma coisa...

— Não falou nada. Ele costuma ser bastante discreto sobre suas namoradas. Mas às vezes ele é um livro aberto. E você, quando olha para mim, é descaradamente hostil. Vocês estão tentando esconder alguma coisa.

— É por causa do meu chefe — disse Rosa Figuerola.

— O seu chefe?

— O Torsten Edklinth ficaria furioso se soubesse de mim e do Mikael...

— Entendo. Silêncio.

— Eu não sei o que está havendo entre você e o Mikael, mas eu não sou uma rival — disse Erika.

— Não é?

— O Mikael e eu somos amantes de vez em quando. Mas não sou casada com ele.

— Pelo que entendi, vocês têm um relacionamento especial. Ele falou de você quando estávamos em Sandhamm.

— Ele levou você para Sandhamm? Então é coisa séria.

— Não brinque comigo.

— Rosa... eu espero que você e o Mikael... vou procurar ficar no meu lugar.

— E se você não conseguir? Erika Berger deu de ombros.

— A ex-mulher dele caiu em depressão quando o Mikael foi infiel comigo. Botou ele para fora. Por culpa minha. Enquanto o Mikael estiver solteiro e disponível, não pretendo ter nenhum escrúpulo. Mas prometi a mim mesma que se ele se envolvesse seriamente com alguém eu me afastaria.

— Não sei se me arrisco a investir nessa relação.

— O Mikael é especial. E você está apaixonada por ele.

— Acho que sim.

— Então não o ponha logo contra a parede. E agora vá se deitar.

Rosa refletiu um pouco. Então subiu ao piso superior, despiu-se e deitou-se na cama junto de Mikael. Ele resmungou alguma coisa e pôs o braço em sua cintura.

Erika Berger ficou um bom tempo a sós na cozinha com seus pensamentos. Sentiu-se, de repente, profundamente infeliz.

25. QUARTA-FEIRA 13 DE JULHO – QUINTA-FEIRA 14 DE JULHO

Mikael Blomkvist sempre se perguntara por que os alto-falantes dos tribunais de instância emitiam um som tão baixo e discreto. Teve dificuldade em distinguir as palavras anunciando que o julgamento de Lisbeth Salander teria início às dez horas da manhã na sala 5. No entanto, chegara cedo e postara-se diante das portas da sala de audiência. Foi um dos primeiros a entrar. Instalou-se na fileira do público, do lado esquerdo da sala, de onde teria a melhor visão da mesa da defesa. Os lugares reservados ao público foram ocupados rapidamente. O interesse da mídia aumentara à medida que o julgamento se aproximava, e na última semana o procurador Richard Ekstrõm concedera entrevistas todos os dias.

Ekstrõm não parará quieto.

Lisbeth Salander era acusada de violência e violência agravada contra Carl-Magnus Lundin; de ameaça, tentativa de assassinato e violência agravada contra o falecido Karl Axel Bodin, aliás Alexander Zalachenko; de dois arrombamentos — da casa de campo do Dr. Nils Bjurman e de seu apartamento em Odenplan; de roubo de veículo motorizado — uma Harley Davidson pertencente a um certo Benny Nieminen, membro do MC Svavelsjõ; de porte ilegal de três armas — uma bomba de gás lacrimogêneo, um cassetete elétrico e uma pistola Wanad P-83 polonesa, encontrados em Gosseberga; e de roubo e ocultação de provas — formulação vaga, relacionada com a documentação que ela encontrara na casa de campo de Bjurman e com uma série de delitos menores. No total, Lisbeth Salander tinha contra si dezesseis acusações.

Ekstrõm também deixara vazar insinuações sobre o estado mental de Lisbeth Salander, o qual deixaria a desejar. Fundamentava-se, por um lado, na avaliação psiquiátrica médico-legal do dr. Jesper H. Lõderman, realizada quando ela atingira a maioridade, e, por outro, numa avaliação feita pelo Dr. Peter Teleborian na época de uma audiência preparatória, a pedido do Tribunal de Instâncias. Visto que a doente mental, como era seu costume, recusara-se categoricamente a falar com os psiquiatras, a análise baseara-se em "observações" feitas após sua prisão na casa de detenção de Kronoberg, em Estocolmo, no mês anterior ao julgamento. Teleborian, que tinha vários anos de experiência com a paciente, declarava que Lisbeth Salander sofria de um grave distúrbio psíquico; ele se apoiava em termos como psicopatia, narcisismo patológico e esquizofrenia paranóica.

A imprensa relatara que ela fora interrogada sete vezes pela polícia. Em todas as ocasiões, a acusada se recusara a dar sequer bom-dia às pessoas que estavam ali para interrogá-la. As primeiras sessões foram conduzidas pela polícia de Gõteborg e as demais ocorreram no Palácio da Polícia de Estocolmo. Os autos registravam simpáticas tentativas de estabelecer contato, persuasões cuidadosas e repetidas perguntas, sem que se obtivesse uma única resposta.

Nem mesmo uma tossidinha.

Em diversas oportunidades, ouvia-se a voz de Annika Giannini nas gravações, intercedendo quando percebia que sua cliente obviamente não tinha a intenção de responder. Assim, a acusação contra Lisbeth Salander baseava-se apenas em provas técnicas e nas informações que a polícia conseguira levantar.

Em alguns momentos, o silêncio de Lisbeth deixara sua advogada numa situação difícil, já que a obrigava a permanecer quase tão calada quanto sua cliente. O que Annika Giannini e Lisbeth Salander conversavam em particular permanecia, é claro, confidencial.

Ekstrõm não fez nenhum segredo de sua intenção de pedir, em primeiro lugar, o internamente psiquiátrico de Lisbeth Salander e, em segundo, uma respectiva pena de prisão. Em situações normais, esses pedidos eram feitos na ordem inversa, mas ele considerava que no caso de Lisbeth Salander os distúrbios psíquicos eram tão evidentes que o tinham deixado sem escolha. Era mesmo muito raro um tribunal se opor a uma avaliação médico-legal.

Ele considerava, além disso, que a tutela de Salander não devia ser anulada. Numa entrevista, declarara com ar preocupado que na Suécia havia um certo número de sociopatas portadores de distúrbios psíquicos tão graves que constituíam um perigo para si mesmos e para os outros, e que cientificamente ele não tinha outra opção senão manter essas pessoas internadas. Citara o caso de Anette, uma jovem violenta cuja vida, durante os anos 1970, fora tema de novela e que, trinta anos depois, ainda estava sendo tratada numa instituição fechada. A cada tentativa de abrandar as restrições ela atacara violenta e insanamente seus pais e a equipe médica, ou então tentara se automutilar. Segundo Ekstrõm, Lisbeth Salander sofria de uma forma semelhante de distúrbio psíquico.

O interesse da mídia também aumentara porque a advogada de Lisbeth Salander não havia se pronunciado. Recusara sistematicamente as entrevistas que lhe ofereciam a oportunidade de expor os pontos de vista da outra parte. A mídia via-se, portanto, diante de uma situação complicada: a acusação a sufocava com informações, ao passo que a defesa, de modo atípico, não oferecia o menor indício sobre a atitude de Salander ou a estratégia para o caso.

Toda essa situação fora analisada por um especialista jurídico contratado por um jornal vespertino para cobrir o caso. Numa crônica, o articulista observara que Annika Giannini era uma advogada respeitada na área de direitos da mulher, mas que era terrivelmente inexperiente em casos fora da sua alçada, concluindo que ela não tinha cacife para defender Lisbeth Salander. Através de sua irmã, Mikael Blomkvist ficou sabendo que vários advogados famosos tinham entrado em contato com ela para oferecer ajuda. Annika Giannini recusara gentilmente todas as propostas.

Enquanto aguardava o início do julgamento, Mikael observou o público. De repente, avistou Dragan Armanskij num lugar próximo à saída.

Seus olhares se cruzaram por um instante.

Ekstrõm tinha uma pilha considerável de papéis sobre sua mesa. Acenava com a cabeça ao reconhecer alguns jornalistas.