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Foi no sábado que Conroe partiu para Bandar Delam com o mulá, pensou, tentando tranqüilizar-se. Hoje é terça-feira, então só se passaram três dias e o dia hoje ainda nem acabou. Na noite passada ele lhe falara pelo rádio: "Oi, querida, está tudo bem aqui, não precisa se preocupar. Desculpe, mas tenho que ir. O tempo de transmissão está controlado no momento, eu te amo e estarei aí logo". A voz dele parecia firme e confiante, mas, mesmo assim, ela teve certeza de ter percebido um nervosismo que tomara conta de sua mente e permeara seus sonhos. Isso é imaginação sua. Ele vai voltar logo — deixe os sonhos para a noite e concentre-se pensando que está tudo bem. Concentre-se na cozinha!

Trouxera os pacotes de chili em pó de Londres, junto com temperos, páprica, pimenta-malagueta, gengibre, alho fresco e pimentas de chili secas e feijões secos e pouca coisa mais, além de uma maleta com roupas de dormir e papel higiênico, que pudera carregar no 747. Trouxera os ingredientes para o chili porque Starke adorava comida mexicana, principalmente chili, e ambos achavam que, fora o caril, era a única forma de tornar a carne de cabra suportável. Não teve necessidade de trazer roupas nem qualquer outra coisa porque ainda tinha algumas coisas no apartamento de Teerã. Além disso, o único presente que trouxe foi uma pequena garrafa de Marmite, que ela sabia que Genny e Duncan McIver adoravam passar na torrada amanteigada feita com o pão que Genny assava — quando ela conseguia comprar farinha e fermento.

Hoje Manuela tinha feito pão. As três fôrmas estavam esfriando na prateleira, cobertas com um pano para evitar as moscas. Malditas moscas, pensou. As moscas estragam o verão, mesmo em Lubbock... Ah, Lubbock, imagino como estarão as crianças.

Billyjoe, Conroe Júnior e Sarita. Sete, cinco e três. Ah, meus amores, pensou satisfeita. Estou tão contente de ter mandado vocês para casa, para o meu pai e os nossos cinco mil hectares de terreno para vocês se esbaldarem, e com o vovô Starke por perto: "Mas não deixem de usar botas por causa das cobras, estão ouvindo?" — com aquela sua voz rude e tão terna.

— Texas para sempre — disse em voz alta e riu sozinha, com os dedos ágeis cortando, moendo e mexendo, provando o cozido de vez em quando, pondo mais sal ou alho. Pela janela, viu Freddy Ayre cruzando a pequena praça para subir para a torre de rádio. Com ele estava Pavoud, o chefe dos empregados. Ele é um homem simpático, pensou. Temos sorte de ter empregados leais. Mais além, ela podia ver a pista principal e grande parte da base, coberta de neve, com o céu coberto de nuvens que ocultavam os cumes das montanhas. Alguns pilotos e mecânicos jogavam bola distraidamente. Marc Dubois, que tinha transportado o mulá de volta de Bandar Delam, estava entre eles.

Não havia mais nada acontecendo ali, apenas manutenção dos aparelhos, verificação de peças, pintura — nenhum vôo desde domingo, quando houve o ataque à base. E o motim. No domingo à noite, três amotinados, um piloto e dois sargentos do regimento de tanques, foram submetidos à corte marcial e, de madrugada, foram mortos. Durante todo o dia de ontem e de hoje a base estivera calma. Ontem eles viram passar dois aviões de combate, mas nenhum outro avião, o que era estranho, pois era uma base de treinamento e geralmente havia muito movimento. Nada parecia mover-se. Apenas uns poucos caminhões, nenhum tanque nem soldados — nem visitantes do lado de cá. Durante a noite tinha havido tiros e gritaria, mas durara pouco.

Ela se olhou criticamente no espelho que estava pendurado num prego sobre a pia, cheia de pratos e panelas sujas, além de talheres e copos. Virou o rosto de um lado para o outro e examinou o que pôde enxergar do seu corpo.

— Você está muito bem, querida — disse para o seu reflexo — mas é melhor você se mexer e começar a dar umas corridas e largar o pão, o chili, o vinho, as torradas, a manteiga, os tacos, os feijões e as panquecas da mamãe cheias de mel, os ovos fritos, o bacon e as batatas fritas...

O ensopado começou a transbordar, distraindo-a. Ela diminuiu mais o fogo, provou o caldo grosso e avermelhado, ainda forte demais por não estar totalmente cozido.

— Puxa vida — disse satisfeita —, isto vai fazer Conroe mais feliz do que um porco na lama... — Sua expressão mudou. Faria, pensou, se ele estivesse aqui. Não faz mal, os rapazes vão gostar.

Começou a lavar a louça, mas não conseguia deixar de pensar em Bandar Delam. Sentiu as lágrimas caindo.

— Oh, merda! Controle-se!

— Emergência! — O grito que foi dado lá fora a assustou e ela olhou pela janela. O futebol tinha parado. Todos os homens estavam olhando para Ayre que corria pelas escadas externas da torre, gritando por eles. Ela os viu juntarem-se em volta dele, e depois se espalharem. Ayre dirigiu-se para o bangalô. Apressadamente, tirou o avental, ajeitou o cabelo, limpou os olhos e foi encontrá-lo na porta.

— O que foi, Freddy?

— Não quis deixar de contar-lhe que a torre deles se comunicou comigo e mandou que eu aprontasse um 212 para uma emergência em Isfahan — disse sorrindo. — Eles conseguiram o consentimento da IranOil.

— Isto não é um tanto longe?

— Oh, não. Fica apenas a trezentos quilômetros, umas duas horas, e ainda está bem claro. Marc vai passar a noite lá e volta amanhã. — Mais uma vez Ayre sorriu. — É bom ter alguma coisa para fazer. Curiosamente, eles pediram que Marc fosse o encarregado.

— Por que ele?

— Não sei. Talvez porque ele seja francês e foram os franceses que ajudaram Khomeini. Bem, tenho que ir. O seu chili está com um cheiro maravilhoso. Marc vai ficar danado por perdê-lo. — E saiu em direção ao escritório, alto e bonito.

Ela ficou parada na porta. Os mecânicos estavam tirando um 212 do hangar e Marc Dubois, fechando seu macacão de vôo, acenou alegremente e correu para observar a verificação do aparelho. Então, viu quatro carros em procissão se aproximando pela estrada. Freddy Ayre também viu. Franziu a testa e entrou no escritório.

— O senhor está com a licença de vôo pronta, sr. Pavoud?

— Sim, Excelência. — Pavoud estendeu-a.

Ayre não notou a tensão do homem, nem que suas mãos estavam tremendo.

— Obrigado. É melhor o senhor vir também, caso eles só falem farsi.

— Mas, Excel...

— Venha! — Abotoando a jaqueta por causa do vento, Ayre saiu apressado. Pavoud enxugou as mãos suadas. Os outros iranianos o observavam, também ansiosos.

— Seja como Deus quiser — disse um deles, agradecendo a Deus por ser Pavoud e não ele.

No 212, a verificação prosseguia. Ayre chegou lá junto com os carros. Seu sorriso desapareceu. Os carros estavam cheios de homens armados, Faixas Verdes, e eles cercaram o helicóptero, com alguns aviadores uniformizados no meio deles.

O mulá Hussein Kowissi saltou do banco da frente do primeiro carro, com um turbante branco e roupas escuras bem novas, e botas velhas e gastas. No seu ombro havia um AK47. Era óbvio que ele estava no comando. Outros homens abriram as portas traseiras do primeiro carro e puxaram o coronel Peshadi para fora, e depois sua esposa. Peshadi gritou com eles, xingando-os, e eles recuaram um pouco. O coronel ajeitou o casaco do uniforme e seu quepe. Sua mulher usava um pesado casacão de inverno e luvas, além de um pequeno chapéu e uma bolsa a tiracolo. Seu rosto estava pálido e abatido, mas, como o marido, mantinha a cabeça orgulhosamente erguida. Ela se voltou para apanhar a maleta que estava no carro, porém um dos Faixas Verdes agarrou-a mas, depois de uma ligeira hesitação, entregou a ela.

— O que está havendo, senhor? — Ayre tentou disfarçar o choque.

— Nós... nós estamos sendo mandados para Isfahan sob escolta! Sob escolta! Minha base... minha base foi traída e está nas mãos de rebeldes! — O coronel não disfarçou sua fúria ao gritar para Hussein em farsi: — Estou-lhe dizendo de novo, o que é que a minha mulher tem a ver com isso? Hein? — acrescentou com um rugido. Um dos nervosos Faixas Verdes empurrou um rifle nas costas dele. Sem desviar os olhos, o coronel empurrou o rifle. — Filho de uma cadela!