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— É claro. — Bakravan deu um puxão na barba para evitar cair na gargalhada. Pobre Ali, pensou, pretensioso como sempre! — Não me compete falar nisso, meu amigo, mas alguns dos lojistas me perguntaram sobre os milhões em ouro já adiantados para apoiar a revolução. Adiantados para o fundo em favor do aiatolá Khomeini, que Deus o proteja — acrescentou polidamente, pensando no fundo do coração: Que Deus o tire de nós depressa agora que vencemos, antes que ele e os seus mulás, gananciosos, parasitas, bitolados, façam muito estrago. Quanto a você, Ali, meu velho amigo, deturpador da verdade, que exagera a sua própria importância, você pode ser o meu amigo mais antigo, mas se você acha que eu confiaria em você... Como se algum de nós fosse confiar em qualquer iraniano fora da nossa própria família, e mesmo assim com muita cautela.

— É claro que eu sei que o aiatolá nunca viu, precisou ou tocou num único rial — disse, com franqueza —, mas mesmo assim, nós, lojistas, adiantamos enormes somas de dinheiro, de ouro, de moeda estrangeira, em favor dele, financiando a sua campanha. É claro que pela glória de Deus e do nosso amado Irã.

— Sim, nós sabemos. E Deus os abençoará por isso. E também o aiatolá. É claro que estes empréstimos serão pagos assim que tivermos o dinheiro. Imediatamente! Os empréstimos feitos pelos lojistas de Teerã são os primeiros da fila de pagamento, dentre todas as dívidas internas. Nós, do governo, compreendemos o quanto a ajuda de vocês tem sido importante. Mas, Jared, Excelência, velho amigo, antes de mais nada, nós precisamos tocar a produção de petróleo, e, para isso, precisamos de dinheiro. Os cinco milhões de dólares que precisamos de imediato serão como um grão de arroz dentro de um barril, agora que os bancos estrangeiros vão ser controlados e, na grande maioria, expulsos. O pre...

— O Irã não precisa de nenhum banco estrangeiro. Nós, os lojistas, podemos fazer tudo o que for necessário. Se nos pedirem. Tudo. Se procurarmos com afinco, pela glória do Irã, talvez, talvez possamos descobrir que temos todas as habilidades e ligações em nosso próprio meio. — Bakravan tomou um gole do seu chá com uma elegância estudada. — O meu filho Meshang tem um diploma da Escola de Administração de Harvard. — A mentira não incomodou a nenhum deles. — Com a ajuda de estudantes brilhantes como ele... — E deixou a idéia no ar.

— Oh, mas você certamente não poderia ceder os serviços dele para o meu Ministério das Finanças — atalhou Ali Kia, compreendendo logo a insinuação. — Na certa, ele é importante demais para você e seus colegas? É claro que sim, deve ser!

— Sim, sim, ele é. Mas as necessidades do nosso amado país vêm antes dos nossos desejos pessoais. Isso, evidentemente, se o governo quisesse utilizar o seu raro talento.

— Mencionarei isso para Mehdi amanhã de manhã. Sim, no meu encontro diário com o meu velho amigo e colega meu. — disse Ali Kia, imaginando quando conseguiria obter sua primeira audiência, muito adiada, desde que fora nomeado ministro interino das Finanças. — Posso também dizer a ele que você concorda com o empréstimo?

— Vou consultar os meus colegas imediatamente. A decisão, evidentemente, será deles e não minha — Bakravan acrescentou com um ar de tristeza que não enganou a nenhum dos dois. — Mas vou defender a idéia, velho amigo.

— Obrigado. — Mais uma vez, Kia sorriu. — Nós, do governo, e o aiatolá, apreciaremos a ajuda dos lojistas.

— Estamos sempre prontos para ajudar. Como você sabe, nós temos sempre ajudado — disse suavemente o velho, relembrando o apoio financeiro maciço dado pelo bazar aos mulás, a Khomeini, ao longo dos anos. Ou a qualquer figura política íntegra, como Ali Kia, que fazia oposição a ambos os xás.

Que Deus amaldiçoe os Pahlavis, pensou Bakravan, eles são a causa de todos os nossos problemas. Malditos sejam por todos os problemas que causaram com sua exigência precipitada de modernização, com o seu descaso insano pelos nossos conselhos e nossa influência, por ter convidado os estrangeiros para virem para cá, só de americanos eram cinqüenta mil há um ano, deixando-os se apossarem dos melhores empregos e de todos os negócios bancários. O xá desprezou nossa ajuda, quebrou nosso monopólio, nos sufocou e destruiu nossa herança histórica. Em toda parte, por todo o Irã.

Mas tivemos a nossa vingança. Apostamos o resto da nossa influência e do nosso tesouro no ódio implacável de Khomeini e no seu poder sobre as massas sujas e ignorantes. E vencemos. E agora, com os bancos estrangeiros fechados, com os estrangeiros fora daqui, seremos mais ricos e influentes do que nunca. Este empréstimo será fácil de conseguir, mas Ali Kia e seu governo podem suar um pouco. Nós somos os únicos capazes de levantar o dinheiro. O pagamento oferecido não é ainda suficientemente alto, nem de longe nos compensa pelo fechamento do bazar durante todos estes meses. Mas quanto deveríamos exigir? perguntou a si mesmo, muito satisfeito com as negociações. Talvez a percentagem devesse...

A porta se abriu com violência e Emir Paknouri entrou correndo na sala.

— Jared, eles vão me prender — gritou, com as lágrimas correndo pelo rosto.

— Quem? Quem vai prender você e por quê? — explodiu Bakravan, vendo perturbada a calma habitual da sua casa, com as caras assustadas de ajudantes, vendedores e gerentes se comprimindo na porta.

— Por... por crimes contra o Islã! — Paknouri chorava abertamente.

— Deve haver algum erro! É impossível!

— Sim, é impossível, mas eles... eles vieram à minha casa com o meu nome... há meia hora atrás nós...

— Quem? Diga-me o nome deles e eu destruirei os seus pais! Quem foi na sua casa?

— Eu já disse! Guardas, guardas revolucionários, Faixas Verdes, sim, eles, é claro — disse Paknouri e continuou a falar, sem ouvir o sinal para calar a boca. Ali Kia empalideceu e alguém murmurou "Deus nos proteja!"

— Há meia hora atrás, com o meu nome num pedaço de papel... meu nome, Emir Paknouri, chefe da liga dos ourives que deu milhões de riais... eles foram na minha casa, acusando-me, mas os criados... e minha mulher estava lá e eu... por Deus e pelo Profeta, Jared — ele gritou caindo de joelhos —, eu não cometi nenhum crime, eu sou um dignitário do bazar, eu dei milhões e...

— De repente ele parou, vendo Ali Kia. — Kia, Ali Kia, Excelência, o senhor

sabe perfeitamente o que eu fiz para ajudar a revolução!

— É claro — Kia estava pálido, com o coração disparado. — Deve haver algum erro. — Ele conhecia Paknouri como um lojista muito influente, respeitado, primeiro marido de Xarazade, e um dos seus mais antigos patrocinadores. — Tem que haver um erro!

— É claro que há um erro! — Bakravan abraçou o pobre homem e tentou acalmá-lo. — Tragam um chá imediatamente — ordenou.

— Um uísque. Por favor, você tem uísque? — murmurou Paknouri. — Tomarei chá depois, você tem uísque?

— Não aqui, meu pobre amigo, mas é claro que há vodca. — Trouxeram-na imediatamente. Paknouri tomou-a e engasgou um pouco. E não quis outra. Em seguida ficou mais calmo e tornou a contar o que tinha acontecido.

Ele percebera que algo estava errado quando ouviu vozes alteradas na entrada da sua mansão, que ficava bem ao lado do bazar. Estava no andar de cima com a esposa, preparando-se para jantar.

— O líder dos guardas, havia cinco, estava sacudindo aquele pedaço de papel e pedindo para me ver. É claro que os criados não ousariam incomodar-me, nem deixariam um gorila daqueles entrar, então o chefe dos criados disse que ia ver se eu estava e subiu. Ele nos disse que o papel estava assinado por alguém chamado Uwari, em nome do Komiteh Revolucionário. Em nome de Deus, quem são eles? Quem é esse homem Uwari? Você já ouviu falar nesse homem, Jared?

— É um nome bastante comum — disse Bakravan, seguindo o costume iraniano de ter sempre uma resposta pronta para algo que não se sabe. — O senhor já ouviu falar, Excelência Ali?