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— O que foi que o fez mudar? Por que ele mudaria com relação a nós, a você?

— Foi a Vontade de Deus. Deus abriu os olhos dele. Ele deve saber que está perto da morte e precisa tomar providências... ele é o khan. Talvez ele esteja com medo e queira se redimir. Nós não éramos culpados de nada. Que importância tem o motivo? Eu não me importo. Nós estamos finalmente livres do seu jugo, livres.

NO QUARTO DO DOENTE: 11:16H. O khan abriu os olhos. Sem mexer com a cabeça, ele olhou em volta. Ahmed, Aysha e o guarda. Nenhuma enfermeira. Então ele se concentrou em Ahmed que estava sentado no chão.

— Você a trouxe? — ele pronunciou as palavras com dificuldade.

— Sim, Alteza. Há poucos minutos.

A enfermeira entrou no seu campo de visão.

— Como o senhor se sente, Excelência? — ela perguntou em inglês, conforme ele lhe ordenara, dizendo-lhe que o turco dela era horrível.

— Na mesma.

— Deixe-me ajeitá-lo um pouco. — Com grande ternura e cuidado, e força, ela o ergueu e ajeitou os travesseiros e a cama. — O senhor precisa da garrafa, Excelência?

O khan pensou um pouco.

— Sim.

Ela a colocou e ele se sentiu embaraçado por isto estar sendo feito por uma infiel, mas desde que ela chegara, ele percebera que ela era tremendamente eficiente, muito sábia e muito boa, a melhor de Tabriz, Ahmed tinha providenciado isso — muito melhor do que Aysha, que se mostrara completamente inútil. Ele viu Aysha sorrir timidamente para ele, com seus olhos grandes e assustados. Eu imagino se jamais tornarei a enfiá-lo de novo, até o fim, duro como um pau, como da primeira vez, incentivado pelas suas lágrimas e gemidos.

— Excelência?

Ele aceitou a pílula e o gole de água e ficou satisfeito com o frescor das mãos da enfermeira que guiaram o copo. Aí tornou a ver Ahmed e sorriu para ele, satisfeito por ter de volta o seu confidente.

— Fez boa viagem?

— Sim, Alteza.

— Ela veio de boa vontade? Ou à força? — Ahmed sorriu.

— Foi como o senhor planejou, Alteza. De boa vontade. Exatamente como o senhor planejou.

— Eu acho que o senhor não deveria falar tanto, Excelência — disse a enfermeira.

— Dê o fora.

Ela bateu delicadamente no ombro dele.

— O senhor quer comer alguma coisa, talvez um pouco de horisht'!

— Halvah.

— O médico disse que os doces não fazem bem ao senhor.

— Halvah!

A irmã Bain suspirou. O médico tinha proibido os doces e depois tinha dito:

— Mas se ele insistir, a senhora pode dar, quantos ele quiser, que diferença faz isso agora? Insha'Allah. — Ela os encontrou e enfiou um na boca do khan e limpou a saliva, e ele o mastigou com prazer, tão liso e tão doce.

— A sua filha chegou de Teerã, Excelência — ela disse. — Ela me pediu para avisá-la assim que o senhor acordasse.

Abdullah Khan estava achando muito estranho falar. Ele tentava pronunciar as frases, mas sua boca não se abriu quando devia, e as palavras ficavam na sua mente por um longo tempo e então, quando uma forma simplificada do que ele queria dizer saía de sua boca, as palavras não eram bem formadas, embora devessem ser. Mas por quê? Eu não estou fazendo nada de um modo diferente do que antes. Antes de quê? Eu não me lembro, só me lembro de uma grande escuridão e do meu sangue rugindo e de estar sendo picado por agulhas em brasa e de não poder respirar.

Eu agora posso respirar, ouvir e ver perfeitamente e a minha mente está trabalhando com clareza e está cheia de planos tão bem feitos como sempre. Só que não consigo colocá-los para fora.

— Como?

— O quê, Excelência? — Mais uma vez a demora.

— Como falar melhor?

— Ah — ela disse, compreendendo imediatamente, uma vez que tinha muita experiência com ataques. — Não se preocupe, o senhor terá um pouco de dificuldade no início. Conforme o senhor for melhorando, vai recuperar o controle de tudo. O senhor deve descansar o máximo possível, isso é muito importante. Descansar e tomar os remédios, e ter paciência, e ficará em forma novamente. Está bem?

— Sim.

— O senhor quer que eu mande chamar a sua filha? Ela estava muito ansiosa em falar com o senhor. Uma moça tão bonita.

Pausa.

— Mais tarde. Vejo mais tarde. Saia todo mundo... menos Ahmed. — A irmã Bain hesitou, depois tornou a bater gentilmente na mão dele.

— Eu vou lhe dar dez minutos, se o senhor prometer que depois vai descansar. Está bem?

— Sim.

Quando ficaram a sós, Ahmed chegou mais perto da cama.

— Sim, Alteza?

— Que horas são?

Ahmed consultou o relógio. Era de ouro trabalhado e ele o admirava muito.

— São quase onze e meia de terça-feira.

— Petr?

— Não sei, Alteza. — Ahmed contou-lhe o que Hakim tinha dito. — Se Petr vier para Julfa hoje, Fazir estará esperando por ele.

— Insha'Allah. Azadeh?

— Ela estava realmente preocupada com a sua saúde e concordou em vir imediatamente. Há poucos momentos eu a vi junto com o seu filho. Eu tenho certeza que ela irá concordar com tudo para protegê-lo, assim como ele o fará para protegê-la. — Ahmed estava tentando dizer tudo de forma clara e concisa, sem querer cansá-lo. — O que o senhor deseja que eu faça?

— Tudo. — Tudo o que discuti com você e um pouco mais, pensou o khan, com prazer, com o seu entusiasmo aumentando: Agora que Azadeh está de volta, corte o pescoço do mensageiro do pedido de resgate, para que os nativos façam o mesmo com o piloto; descubra se aqueles dois são traidores por todos os meios possíveis, e se forem, arranque os olhos de Hakim e mande-a para o norte, para Petr. Se não forem, pique Najoud em pedacinhos e os mantenha presos aqui, até que o piloto esteja morto, depois mande-a para o norte. E Pahmudi! Agora que estou oferecendo uma recompensa pela cabeça dele que tentaria até a Satã, Ahmed, ofereça-a primeiro a Fazir e diga-lhe que eu quero vingança, eu quero que Pahmudi seja torturado envenenado, picado, mutilado, castrado...

O seu coração começou a falhar, palpitando e ele levantou a mão para esfregar o peito, mas a mão não se moveu. Nem uma polegada. Mesmo quando ele olhou para ela, caída na cama, desejando que se movesse, não houve nenhum movimento. Nada. Nem sensação. Nem na mão e nem no braço. O medo tomou conta dele.

Não tenha medo, a enfermeira disse, ele lembrou a si mesmo, desesperado, com ondas rugindo no seu ouvido. Você teve um ataque, só isso, não foi muito forte e o médico disse que muitas pessoas sofrem ataques. O velho Komargi teve um há um ano e ainda está vivo e ativo e afirma que ainda dorme com a sua jovem esposa. Com tratamento moderno... você é um bom muçulmano e irá para o paraíso, então não há nada a temer, nada a temer, nada a temer... nada a temer, se eu morrer, eu vou para o paraíso...

Eu não quero morrer, gemeu. Eu não quero morrer, tornou a gemer, mas foi só na sua cabeça, não emitiu nenhum som.

— O que é, Alteza?

Ele viu a ansiedade de Ahmed e se acalmou um pouco. Graças a Deus eu tenho Ahmed. Eu posso confiar em Ahmed, pensou, banhado em suor. O que é mesmo que eu quero que ele faça?

— Família toda aqui mais tarde. Primeiro Azadeh, Hakim, Najoud... compreende?

— Sim, Alteza. Para confirmar a sucessão?

— Sim.

— Eu tenho a sua permissão para interrogar Sua Alteza?

Ele balançou a cabeça concordando, com as pálpebras pesadas, esperando que a dor no peito diminuísse. Enquanto esperava, mexeu com as pernas, sentindo os pés dormentes. Mas nada se moveu, não da primeira vez, só da segunda e só com muito esforço. O terror voltou a tomar conta dele. Em pânico, ele mudou de idéia:

— Pague o resgate rapidamente, traga o piloto para cá, Erikki aqui, eu para Teerã, compreende? — Ele viu Ahmed concordar com a cabeça. — Depressa — murmurou e fez sinal para que ele saísse, mas a sua mão esquerda não se moveu. Apavorado, tentou a mão direita e conseguiu, com dificuldade, mas conseguiu. Parte do seu pânico desapareceu. — Pague resgate agora. Mantenha segredo. Chame a enfermeira.