— Onde está Abdullah Khan? — gritou Bayazid, com os homens em volta dele, as armas apontadas e prontos para matar. — Diga-me logo ou vocês são homens mortos!
E quando Hakim não respondeu imediatamente, Erikki exclamou:
— Pelo amor de Deus, Hakim, diga-lhe onde ele está ou seremos todos mortos.
— Abdullah Khan está morto, ele está morto... morreu na noite passada... não, há duas noites atrás. Cerca de meia-noite... — disse Hakim com a voz fraca e eles o olharam incrédulos, sua mente estava voltando aos poucos ao normal e ele ainda não podia entender por que estava deitado ali, com a cabeça latejando, sem sentir as pernas, com Erikki segurando-o, se Erikki tinha sido raptado por nativos, se ele estava tomando café com Azadeh, depois tiros e ele correndo para se proteger, os guardas atirando e depois a explosão e metade do resgate tinha sido paga.
De repente, sua mente clareou.
— Em nome de Deus — exclamou. Tentou levantar-se mas não conseguiu. — Erikki, em nome de Deus, por que vocês me atacaram, metade do seu resgate já foi pago... por quê?
Erikki se levantou, furioso.
— Não houve nenhum pagamento, a garganta do mensageiro foi cortada, Abdullah Khan mandou cortar a garganta do homem!
— Mas o resgate... a metade foi paga. Ahmed fez isto ontem à noite.
— Paga? Paga a quem? — Bayazid perguntou furioso. — Que mentiras são essas?
— Não são mentiras, a metade foi paga a noite passada, foi paga pelo novo khan como... como um ato de confiança pelo... pelo erro cometido contra o mensageiro. Diante de Deus, eu juro. A metade foi paga!
— Mentira — Bayazid respondeu furioso e apontou o revólver para ele. — Onde está o khan?
— Não é mentira! Eu mentiria diante de Deus? Eu lhe digo, por Deus! Mande chamar Ahmed, mande chamar o homem que se chama Ahmed, ele pagou.
Um dos nativos gritou alguma coisa, Hakim empalideceu e repetiu em turco:
— Em nome de Deus, metade do resgate já foi paga! Abdullah Khan está morto! Ele está morto e metade do resgate já foi paga. — Um murmúrio de espanto percorreu o quarto. — Mande chamar Ahmed, ele lhes dirá a verdade. Por que vocês estão nos atacando? Não há razão para isso!
Erikki intercedeu:
— Se Abdullah Khan está morto e metade já foi paga, aga, e a outra metade prometida, então a sua honra está vingada, aga, por favor, faça o que Hakim está pedindo, mande chamar Ahmed, ele lhe dirá a quem pagou e como.
Havia muito medo agora no quarto, Bayazid e seus homens não estavam gostando daquele confinamento, queriam estar ao ar livre, queriam estar nas montanhas, longe daquelas pessoas e daquele lugar horrível, sentindo-se traídos. Mas se Abdullah Khan estava morto e metade tinha sido paga...
— Piloto, vá buscar Ahmed — disse Bayazid — e lembre-se, se me trair, encontrará a sua mulher desfigurada. — E arrancou a automática da mão de Erikki. — Vá buscá-lo!
— Sim, sim, é claro.
— Erikki, primeiro me ajude. — Hakim falou com a voz fraca e rouca.
Erikki estava tentando compreender aquilo tudo enquanto o erguia e colocava no sofá ao lado de Azadeh. Ambos viram o seu rosto pálido, mas também notaram a sua respiração regular.
— Graças a Deus — murmurou Hakim.
Então, mais uma vez, Erikki se viu num pesadelo, saindo do quarto, desarmado, indo até o alto da escada, gritando para Ahmed não atirar:
— Ahmed, Ahmed, preciso falar com você, estou sozinho...
Agora ele estava lá embaixo e ainda sozinho, sem ter levado nenhum tiro. Mais uma vez ele gritou por Ahmed, mas suas palavras ecoaram nas paredes e ele vagou pelas salas vazias, todo mundo tinha desaparecido, e então enfiaram-lhe um revólver na cara e outro nas costas. Ahmed e um guarda, ambos nervosos.
— Ahmed, rápido — exclamou — é verdade que Abdullah Khan está morto e que há um novo khan e que metade do resgate foi paga?
Ahmed ficou olhando para ele.
— Pelo amor de Deus, é verdade?
— Sim, sim, é verdade. Mas...
— Rápido, você tem que dizer a eles! — E sentiu uma onda de alívio, pois não tinha acreditado muito em Hakim. — Rápido, eles vão matá-lo e matar Azadeh. Vamos!
— Então o... então eles não estão mortos?
— Não, é claro que não. Vamos!
— Espere. O que disse o... Sua Alteza, exatamente?
— Que diferença faz...
Ele enfiou o revólver na cara de Erikki.
— O que foi que ele disse exatamente!
Erikki vasculhou a memória e repetiu o melhor que pôde, depois acrescentou:
— Agora, pelo amor de Deus, vamos!
Para Ahmed, o tempo parou. Se ele fosse com o infiel, provavelmente morreria, Hakim Khan morreria, sua irmã morreria e o infiel, que era o responsável por toda aquela confusão, provavelmente escaparia com os malditos nativos. Mas por outro lado, se eu conseguir convencê-los a deixar o khan e sua irmã vivos, convencê-los a sair do palácio, terei provado a minha lealdade sem sombra de dúvida, para o khan e para ela, e posso matar o piloto mais tarde. Ou posso matá-lo agora e fugir facilmente e ficar vivo — mas como um fugitivo, desprezado por todos, como aquele que traiu o seu khan. Insha'Allah.
— Seja como Deus quiser. — E deu um sorriso. Tirou a faca e entregou-a, junto com o revólver, para o guarda apavorado e saiu andando.
— Espere — disse Erikki. — Diga ao guarda para mandar buscar um médico. Urgente. Hakim e minha esposa... eles podem estar feridos.
Ahmed deu a ordem ao guarda, atravessou o corredor e subiu as escadas. Lá em cima, os nativos o revistaram rudemente para ver se ele estava armado e depois o escoltaram até o quarto do khan, empurrando-o para dentro e segurando Erikki na porta, com uma faca encostada na garganta — e quando Ahmed viu que o seu khan estava mesmo vivo, sentado nas almofadas ao lado de Azadeh, que ainda estava inconsciente, murmurou:
— Graças a Deus — e sorriu para ele. — Alteza — falou calmamente — mandei buscar um médico. — Então viu Bayazid.
— Eu sou Ahmed Dursak, o Turcomano — disse orgulhosamente, falando em turco com grande formalidade. — Em nome de Deus: é verdade que Abdullah Khan está morto, é verdade que eu paguei metade do resgate, cinco milhões de riais, na noite passada, da parte do novo khan, a dois mensageiros do chefe al-Drah da aldeia da Árvore Quebrada, como um ato de confiança por causa da desonra imerecida do seu mensageiro, ordenada pelo falecido Abdullah Khan. Seus nomes eram Ishmud e Alilah e eu os mandei para o norte num bom carro. — Um murmúrio de espanto percorreu o quarto. Não podia haver nenhum erro, porque todos conheciam os nomes falsos, nomes de código, dados para proteger a aldeia e a tribo. — Eu disse a eles, em nome do novo khan, que a outra metade seria paga assim que o piloto e seu aparelho fossem entregues em segurança.
— Onde está este novo khan, se é que ele existe? — disse Bayazid, com desprezo. — Deixe-o falar por si mesmo.
— Eu sou o khan de todos os Gorgons — disse Hakim e fez-se um súbito silêncio. — Hakim Khan, filho mais velho de Abdullah Khan.
Todos os olhos se voltaram para Bayazid, que percebeu a surpresa no rosto de Erikki. Ele resmungou, inseguro.
— Só porque você está dizendo isso não significa que...
— Você está me chamando de mentiroso na minha própria casa?
— Eu só estou dizendo para esse homem — e Bayazid fez um gesto com o polegar na direção de Ahmed — que só pelo fato dele estar dizendo que pagou o resgate, metade do resgate, isto não exclui a possibilidade dele ter pago e depois ter armado uma emboscada para os homens e os matado, como fez com o meu outro mensageiro, por Deus!
— Eu lhe disse a verdade, diante de Deus, e torno a repetir, diante de Deus, que os mandei para o norte, em segurança e com o dinheiro. Dê-me uma faca, pegue outra e eu vou mostrar-lhe o que um turcomano faz com quem o chama de mentiroso! — Os nativos ficaram horrorizados por seu líder ter-se colocado numa posição tão ruim. — Você está chamando a mim e ao meu khan de mentirosos?