— O que aconteceu, Erikki? — tinha perguntado Hakim.
— Eu voei para o norte, em direção às montanhas e Ahmed foi descuidado. Não foi culpa dele, ele ficou enjoado, e antes que nos déssemos conta do que estava acontecendo, Bayazid encostou um revólver na cabeça dele, um outro nativo encostou um na minha e Bayazid disse:
— Voe até a aldeia, depois você pode partir.
— Você fez um juramento sagrado de que não iria fazer-me nenhum mal! — eu disse. *
— Eu jurei que não lhe faria nenhum mal e não vou fazer, mas o juramento foi meu, não dos meus homens — disse Bayazid, e o homem que estava com a arma encostada na minha cabeça riu e gritou:
— Obedeça ao nosso xeque ou, por Deus, você vai sentir tanta dor que vai implorar pela morte.
— Eu devia ter pensado nisso — disse Hakim. — Devia ter feito todos eles jurarem. Eu devia ter pensado nisso.
— Não teria feito nenhuma diferença. De qualquer maneira, a culpa foi minha; eu os trouxe aqui e quase estraguei tudo. Não posso dizer-lhe o quanto estou arrependido, mas era a única maneira de voltar e eu pensei que fosse encontrar Abdullah Khan, nunca imaginei que aquele matyeryebyets do Bayazid fosse usar uma granada.
— Nós não estamos feridos, graças a Deus, Azadeh e eu. Como você podia saber que Abdullah Khan estava morto, ou que metade do seu resgate já fora pago? Continue a contar o que aconteceu — tinha dito Hakim, e Azadeh notou algo de estranho na voz dele. Hakim mudou, ela pensou. Eu não consigo mais entender o que ele está pensando, como antes. Antes dele se tornar khan, khan de verdade, eu conseguia, mas agora não. Ele ainda é o meu irmão querido, mas um estranho. Tanta coisa mudou, e tão depressa. Eu mudei, Erikki também, meu Deus, e quanto! Johnny não mudou...
No salão, Erikki prosseguira:
— Continuar voando era a única maneira de tirá-los do palácio sem mais confusão nem matança. Se Bayazid não tivesse insistido, eu teria oferecido. Nenhuma outra maneira seria segura para você e Azadeh. Eu tinha que apostar no fato deles obedecerem ao juramento. Mas o que quer que acontecesse, era entre mim e eles, eu sabia disso e eles também, pois é claro que eu era o único que sabia quem eles eram e onde viviam e a vingança de um khan é uma coisa séria. O que quer que eu fizesse, deixa-los no meio do caminho ou ir até a aldeia, eles jamais me libertariam. Como poderiam?, era a aldeia ou eu e o único Deus deles votaria pela aldeia junto com eles, não importa o que eles tivessem combinado ou jurado.
— Esta é uma questão que só Deus pode responder
— Os meus deuses, os meus antigos deuses, não gostam de ser usados como desculpas e eles não gostam desses juramentos em seu nome. Eles desaprovam inteiramente isso, aliás, eles proíbem. — Azadeh percebeu a amargura e tocou nele com carinho. Erikki segurou a mão dela. — Eu estou bem agora, Azadeh.
— O que aconteceu depois, Erikki? — perguntou Hakim.
— Eu disse a Bayazid que não havia gasolina suficiente e tentei raciocinar com ele, mas ele disse apenas: "Seja como Deus quiser", enfiou a arma no ombro de Ahmed e puxou o gatilho. "Vá para a aldeia! A próxima bala vai ser no estômago." Ahmed desmaiou e Bayazid debruçou-se por cima dele para apanhar a arma que tinha escorregado para o chão da cabine, e estava sob o assento, mas não conseguiu apanhá-la. Eu estava com o cinto de segurança fechado, Ahmed também, mas eles não, então eu comecei a dar piruetas no céu de uma maneira que nunca pensei que um helicóptero pudesse agüentar, depois deixei-o cair e fiz uma aterrissagem malfeita; pensei que tivesse quebrado um esqui, mas depois vi que só estava torto. Assim que paramos, eu usei a arma e a minha faca e matei os que estavam conscientes e hostis, desarmei os inconscientes e atirei-os para fora da cabine. Então, depois de algum tempo, eu voltei.
— Assim, com esta facilidade — tinha comentado Armstrong — quatorze homens.
— Cinco, e Bayazid. Os outros... — Azadeh estava com o braço no ombro dele e sentiu-o tremer. — Eu os deixei lá.
— Onde? — perguntou Hashemi Fazir. — O senhor poderia descrever o lugar, capitão? — Erikki fizera-o com bastante precisão e o coronel tinha mandado alguns homens para procurá-lo.
Erikki colocou a mão no bolso e tirou as jóias dadas como resgate, entregando-as para Hakim.
— Agora eu gostaria de conversar com minha mulher, se você não se importar. Contarei o resto mais tarde. — E os dois tinham ido para os seus aposentos e ele não dissera mais nada, apenas a abraçara com carinho. A presença dele afastou sua angústia. Ele logo adormeceu. Ela mal dormiu, pois voltava sempre à aldeia, lutando para livrar-se das suas garras sufocantes. Ela tinha ficado quieta por algum tempo nos braços dele, depois fora sentar-se numa cadeira e cochilara, contente por estar com ele. Ele dormira profundamente até escurecer, depois acordara.
— Primeiro um banho e uma barba e depois um pouco de vodca e então podemos conversar. Eu nunca a vi mais bonita nem a amei mais e sinto muito ter tido ciúmes. Não, Azadeh, não diga nada ainda. Depois eu vou querer saber de tudo.
Ao amanhecer, ela terminara de contar a ele tudo o que havia para contar — tudo o que ela jamais contaria — e ele terminara a sua história. Ele não tinha escondido nada, nem o seu ciúme, nem o ódio mortal nem a alegria da batalha e as lágrimas que derramara na montanha, ao ver a selvageria dos ferimentos que causara nos nativos. Eles... eles me trataram direito na aldeia deles... e resgate é um costume antigo. Se não fosse pelo fato de Abdullah ter mandado matar o mensageiro deles... talvez isso fizesse diferença, talvez não. Mas isso não desculpa os assassinatos, eu me sinto um monstro, você se casou com um louco, Azadeh. Eu sou perigoso.
— Não, não, não é, é claro que não.
— Por todos os meus deuses, eu matei vinte homens ou mais em dez dias e, no entanto, eu nunca tinha matado antes, a não ser aqueles assassinos, aqueles homens que entraram aqui para matar o seu pai antes do nosso casamento. Fora do Irã eu nunca matei ninguém, nunca feri ninguém, eu tive muitas brigas com ou sem pukoh, mas nada sério. Nunca. Se este calânder ou a aldeia ainda existissem, eu o teria matado sem pestanejar. Eu posso entender o seu Johnny na base; agradeço a todos os deuses por terem-no trazido para junto de nós para proteger você e o amaldiçôo por ter destruído minha paz, embora eu saiba que estou em dívida eterna para com ele. Eu não posso lidar com as mortes e nem com ele. Não posso, ainda não.
— Isto não tem importância agora, Erikki. Agora nós temos tempo. Agora estamos em segurança, você, eu, Hakim, nós estamos seguros, meu querido. Olhe para o amanhecer, não é lindo? Olhe, Erikki, é um novo dia agora, tão bonito, uma nova vida, Nós estamos seguros, Erikki.
NO SALÃO: 15:45h. Hakim Khan estava sozinho exceto por Hashemi Fazir. Hashemi chegara inesperadamente há meia hora. Ele se desculpara pela intromissão, estendendo-lhe um telex.
— Achei que o senhor deveria ver isto imediatamente, Alteza.
O telex dizia: "URGENTE. Ao coronel Fazir, Serviço Secreto, Tabriz: prenda Erikki Yokkonen, marido de Sua Alteza, Azadeh Gorgon, por crimes contra o Estado, por cumplicidade em pirataria aérea, seqüestro e alta traição. Algeme-o e mande-o imediatamente para o meu QG aqui. Diretor, Savama, Teerã."
Hakim dispensou os guardas.
— Eu não entendo, coronel. Por favor explique.
— Assim que eu o decodifiquei, telefonei para saber de mais detalhes, Alteza. Parece que no ano passado a S-G Helicópteros vendeu alguns aparelhos para a CHI e...
— Eu não compreendo.
— Desculpe, para a Companhia de Helicópteros Iraniana, uma companhia iraniana, onde trabalha atualmente o capitão Yokkonen. Entre esses havia, há, dez 212, incluindo o dele. Hoje, os outros nove, avaliados em cerca de nove milhões de dólares, foram roubados e retirados ilegalmente do Irã por pilotos da CHI. A Savama supõe que tenham sido levados para um dos Estados do golfo.