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A mensagem estava rabiscada numa letra que Hakim não reconheceu: "Meus sinceros parabéns pela sua herança. Que o senhor possa ter uma vida longa e ser tão produtivo quanto o seu predecessor. Sim, eu também gostaria de encontar-me urgentemente com o senhor. Mas aqui, não aí. Desculpe. Assim que o senhor estiver pronto, eu ficarei honrado em recebê-lo, com pompa ou em particular, o que o senhor preferir. Nós deveríamos ser amigos, há muito o que fazer e nós temos muitos interesses em comum. Por favor, diga a Robert Armstrong e a Hashemi Fazir que Yazernov está enterrado no cemitério russo em Jaleh e que está ansioso para vê-los assim que for conveniente." Não havia nenhuma assinatura.

Muito desapontado, ele voltou para perto da cama e entregou o papel a Ahmed.

— Como você interpreta isto?

Ahmed não teve forças para segurar o papel.

— Desculpe, Alteza, por favor, segure-o para que eu possa ler. — Depois de ler, ele disse: Não é a letra de Mzytryk, eu... eu reconheceria a sua letra mas... mas acredito que seja genuíno. Ele deve ter transmitido a mensagem para... para os seus subordinados...

— Quem é Yazernov e o que ele quer dizer com isto?

— Eu não sei. É um código... um código que eles vão entender.

— Ou é um convite para um encontro ou uma ameaça. Qual dos dois?

— Eu não sei, Alteza. Acho que é um encontro. — Ele teve um espasmo de dor e praguejou na sua própria língua.

— Mzytryk sabe que nas duas últimas vezes eles estavam à espreita? Ele sabe que Abdullah Khan o traiu?

— Eu... eu não sei, Alteza. Eu lhe disse que ele era esperto e que o khan, seu pai, tomava muito cuidado com ele. — O esforço de falar e de se concentrar estava tirando as forças de Ahmed. — O fato de Mzytryk saber que eles estão em contato com o senhor... que ambos estão aqui agora, não significa nada, ele tem espiões em toda parte. O senhor é o khan e é claro... é claro que o senhor sabe que... que é espionado por todo tipo de homens, a maioria maus, que comunicam tudo aos seus superiores — na maioria piores ainda. — Ele sorriu e Hakim ficou pensando o que significaria o sorriso. — Mas, por outro lado, o senhor sabe esconder os seus verdadeiros propósitos, Alteza. Abdullah Khan nunca suspeitou o quanto o senhor é brilhante, nem uma vez. Se... se ele tivesse sabido o quanto o senhor vale, ele nunca o teria banido, mas tê-lo-ia feito seu herdeiro e conselheiro.

— Ele teria me mandado matar. — Nem por um segundo Hakim Khan ficou tentado a contar a Ahmed que fora ele próprio que enviara os assassinos que Erikki matara, nem sobre a tentativa de envenenamento que também havia falhado. — Há uma semana atrás ele teria ordenado que eu fosse mutilado e você o teria feito alegremente.

Ahmed olhou para ele, com olhos fundos que refletiam a face da morte

— Como é que o senhor sabe de tanta coisa?

— É a vontade de Deus.

O fim começara. Os dois homens sabiam disto. Hakim disse:

— O coronel Fazir mostrou-me um telex acerca de Erikki. — E contou o conteúdo do telex a Ahmed. — Agora eu não tenho Mzytryk para servir de barganha, não imediatamente. Posso entregar Erikki a Fazir ou então ajudá-lo a fugir. De qualquer maneira minha irmã prometeu ficar aqui e não pode ir com ele. Qual é o seu conselho?

— Para o senhor é mais seguro entregar o infiel ao coronel como pishkesh e fingir para ela que não pôde fazer nada para impedir... para impedir a prisão. Na verdade, não há nada que o senhor possa fazer se o coronel decidir que vai ser assim. Ele, o da Faca, ele vai resistir e portanto vai ser morto. Então o senhor pode prometê-la secretamente para o homem de Tbilisi... Mas não entregá-la nunca, assim o senhor poderá controlá-lo... embora eu duvide.

— E se ele, o da Faca, "conseguir" fugir?

— Se o coronel permitir isso, ele exigirá um pagamento.

— E qual será?

— Mzytryk. Agora ou no futuro. Enquanto ele, o da Faca, viver, Alteza, ela nunca se divorciará dele. Esqueça-se do Sabotador, ele pertence a uma outra vida, e quando os dois terminarem, ela irá ao encontro dele, isto é, se ele permitir que ela fique aqui. Eu duvido que até mesmo o senhor, Alteza... — Os olhos de Ahmed se fecharam e um tremor o percorreu.

— O que aconteceu com Bayazid e os bandidos? Ahmed... Ahmed não o escutou. Ele estava vendo as estepes, as vastas planícies da sua terra e da terra dos seus ancestrais, o mar de grama de onde os seus antepassados tinham vindo para cavalgar ao lado dos exércitos de Gengis Khan, e depois ao lado dos exércitos de seu neto, Kublai Khan e seu irmão Hulagu Khan, que invadiram a Pérsia e ergueram montanhas de crânios dos que se opuseram a eles. E que permaneceram aqui nas terras douradas desde tempos muito remotos. Ahmed pensou, terras de vinho, calor e riqueza, de mulheres de grande beleza e sensualidade, valorizadas desde tempos muito antigos como Azadeh... ah agora eu nunca a possuirei como ela deveria ser possuída, arrastada pelos cabelos como um despojo de guerra, carregada na sela de um cavalo para ser possuída e domada sobre peles de lobos...

De muito longe, ele ouviu a sua própria voz dizendo:

— Por favor, Alteza, eu lhe imploro um favor, eu gostaria de ser enterrado na minha própria terra e de acordo com os nossos costumes... — Então eu poderei viver para sempre com os espíritos dos meus ancestrais, ele pensou, atraído por aquela terra encantadora.

— Ahmed, o que aconteceu com Bayazid e os bandidos quando vocês pousaram?

Com muito esforço, Ahmed voltou.

— Eles não eram curdos, eram apenas nativos fingindo ser curdos e ele, o da Faca, os matou a todos, Alteza, com enorme brutalidade — disse com estranha formalidade. — Na sua loucura, ele os matou a todos, com faca, revólver, mãos, pés e dentes, a todos, exceto Bayazid que, por causa do juramento feito ao senhor, não podia atacá-lo.

— Ele o deixou vivo? — Hakim perguntou, incrédulo.

— Sim, que Deus lhe dê paz. Ele... ele pôs um r-e-vólver na minha mão e segurou Bayazid perto do revólver e eu... — Sua voz sumiu, ondas de grama o chamavam se estendendo até o horizonte.

— Você o matou?

— Oh, sim, olhando... Olhando dentro dos olhos dele. — A voz de Ahmed encheu-se de raiva. — O filho de um... um cão atirou em mim pelas costas, duas vezes, sem honra e sem... e sem virilidade, o filho de um cão. — Os lábios sem sangue sorriram e ele fechou os olhos. Ele estava morrendo, suas palavras eram quase imperceptíveis. — Eu me vinguei.

Hakim falou rapidamente:

— Ahmed, o que foi que você não me disse e que eu preciso saber?

— Nada... — Alguns segundos depois os seus olhos se abriram e Hakim viu a morte lá dentro. — Não há nenhum outro deus além de Deus e... — um pouco de sangue escorreu-lhe pelos cantos da boca. — Eu fiz do senhor kh... — A última palavra morreu com ele.

Hakim sentiu-se mal diante daqueles olhos parados.

— Doutor! — gritou.

Imediatamente o homem entrou junto com o guarda. O médico fechou os olhos dele.

— Seja como Deus quiser. O que devemos fazer com o corpo, Alteza?

— O que é feito em geral com os corpos? — Hakim afastou-se apoiado nas muletas e o guarda o acompanhou. Então, pensava Hakim, então, Ahmed, agora você está morto e eu estou sozinho, desligado do passado e sem obrigação para com ninguém. Você me fez khan? Era isso o que você ia dizer? Você sabia que havia buracos ocultos naquele quarto também?

E deu um sorriso. Depois seu rosto endureceu. Agora é a vez do coronel Fazir e de Erikki, Ele, o da Faca, como você o chamava.

NO PALÁCIO: 18:48H. Na luz do entardecer, Erikki consertava cuidadosamente um dos buracos de bala no pára-brisa de plástico do 212 com fita adesiva. Era difícil com o braço na tipóia, mas sua mão era forte e o ferimento do braço ia ficar bom — não havia sinal de infecção. Ele estava com a orelha coberta de curativos, parte do seu cabelo tinha sido raspado por medida de higiene, e ele estava melhorando rapidamente. Seu apetite era bom. As horas de conversa que tivera com Azadeh tinham-lhe proporcionado bastante paz de espírito.