— Ótimo — concordou Rosemont. Ele os observara cuidadosamente na subida e ficara muito impressionado com o modo como eles trabalhavam em equipe, trocando de posições, sempre com um deles cobrindo a retaguarda, sempre parecendo saber o que fazer, sem precisar de ordens, sempre com as armas destravadas. — Isto não é um tanto perigoso? — perguntara.
— Sim, sr. Rosemont, se a pessoa não sabe o que está fazendo — dissera o inglês sem nenhuma arrogância aparente. — Mas quando qualquer árvore, esquina ou pedra pode esconder inimigos, a diferença entre uma arma travada e outra destravada pode significar matar ou morrer.
Vien Rosemont recordou como o outro acrescentara francamente: "Faremos tudo o que for possível para ajudá-lo e tirá-lo de lá" — e ele se perguntou mais uma vez se conseguiriam entrar, quanto mais sair. Fazia quase uma semana que Meca fora abandonada. Ninguém sabia o que esperar quando chegassem lá. Poderia estar intacta, já saqueada ou até ocupada.
— Você sabe que toda esta operação é loucura?
— Não nos cabe questionar isso.
— Nosso papel é obedecer ou morrer? Acho que é uma sacanagem.
— Também acho que é uma sacanagem, se isso ajuda alguma coisa. Foi a primeira vez que eles riram juntos. Rosemont se sentiu muito melhor.
— Ouça, não tive ainda oportunidade de dizer, mas estou contente por ter vocês três a bordo.
— Bem, ahn, prazer em estar aqui. — Ross disfarçou seu embaraço pelo cumprimento. — Aga — disse para o guia —, por favor, coma conosco.
— Obrigado, aga, mas não estou com fome — respondeu o velho, sem se mexer da entrada da caverna.
— Vocês têm muitas unidades especiais no Irã? — perguntou Rosemont, enquanto calçava as botas.
— Não, uma meia dúzia. Nós estamos aqui para treinar os iranianos. Você acha que Bakhtiar vai durar? — Abriu a mochila e distribuiu as latas de carne enlatada.
— Não. O que dizem nas montanhas, ente as tribos, é que ele vai ser deposto, provavelmente morto, até o fim da semana.
— As coisas estão tão ruins assim?
— Piores. Dizem que dentro de um ano o Azerbeijão será um protetorado soviético.
— Que merda!
— Sim. Mas nunca se sabe — Vien sorriu. — É isso que torna a vida interessante.
— Tome — disse Ross, oferecendo-lhe o cantil —, é a melhor pinga iraniana que se pode comprar.
Rosemont fez uma careta e provou um pouco, então sorriu.
— Cristo, é uísque escocês legítimo! — Preparou-se para dar um gole de verdade, mas Ross estava atento e puxou o cantil.
— Vá com calma. É só o que temos, aga.
Rosemont sorriu. Eles comeram rapidamente. A caverna era aconchegante e segura.
— Você esteve no Vietnã? — perguntou Rosemont, com vontade de conversar, achando que o momento era propício.
— Não, nunca estive. Quase fui lá uma vez, quando meu pai e eu estávamos indo para Hong Kong, mas de Saigon fomos desviados para Bangkok.
— Com os gurkhas!
— Não, isso foi há muitos anos, mas agora, de fato, nós temos um batalhão lá.
Ross pensou por um momento: eu tinha sete ou oito anos, meu pai tinha uns parentes em Hong Kong, Dunross, sim, este era o nome deles, e havia uma espécie de reunião de clã. Não me lembro muito de Hong Kong, exceto de um leproso deitado no chão ao lado da estação das barcas. Tinha que passar por ele todo dia. Quase todo dia.
— Meu pai esteve em Hong Kong em 1963 — Vien falou com orgulho. — Ele era o diretor adjunto local da CIA. — Pegou uma pedra e ficou brincando com ela. — Você sabe que eu sou meio-vietnamita?
— Sim, eles me disseram.
— O que mais lhe contaram?
— Só que eu podia confiar minha vida a você.
— Esperemos que eles tenham razão. — E Rosemont sorriu, encabulado. Pensativamente, começou a checar a mira do seu Ml6. — Eu sempre quis visitar o Vietnã. Meu pai, meu verdadeiro pai, era vietnamita, um agricultor, mas ele foi morto pouco antes de eu nascer; isto foi quando os franceses eram os donos da Indochina. Ele foi apanhado pelos vietcongues perto de Dien Bien Phu. Mamãe.. — A tristeza foi embora e ele sorriu. — Mamãe é tão americana quanto um Big Mac e quando ela tornou a casar, escolheu o que havia de melhor. Nenhum pai de verdade teria me amado mais...
— Sahibl — gritou Gueng, de repente, levantando a carabina. Ross e Rosemont agarraram suas armas, então ouviu-se um som agudo, trazido pelo vento, e Ross e Gueng relaxaram.
— É Tenzing.
O sargento apareceu tão silenciosamente quanto saíra. Mas agora seu rosto estava sério.
— Sahib, há muitos caminhões na estrada lá embaixo.
— Em inglês, Tenzing.
— Sim, sahib. Muitos caminhões, eu contei onze, em comboio, na estrada que fica no fundo do vale...
— Aquela estrada leva a Meca. A que distância estavam? — praguejou Rosemont.
— No fundo do vale. Eu fui até o outro lado do cume e há um... — Ele disse uma palavra em gurkhali e Ross lhe deu a tradução em inglês. — Um pro-montório. A estrada contorna o vale e depois começa a subir como uma cobra. Se o rabo da cobra está no vale e a cabeça onde quer que a estrada termine, então os quatro caminhões já estavam bem depois do rabo.
— Uma hora no máximo. — Rosemont tornou a praguejar. — É melhor... Neste momento, houve um pequeno tumulto e eles olharam para a entrada da caverna. Ainda tiveram tempo de ver o guia fugir correndo, com Gueng atrás dele.
— Que diabo...
— Por algum motivo, ele está abandonando o navio — disse Ross. — Esqueça-o. Uma hora nos dá uma chance?
— Claro. Uma boa chance. — Colocaram rapidamente as mochilas e Rosemont armou sua metralhadora. — E quanto a Gueng?
— Ele vai nos alcançar.
— Nós vamos direto. Eu vou primeiro. Se me acontecer alguma coisa, você desiste. Certo?
O frio era quase uma barreira física que eles tinham que vencer, mas Rosemont conduziu-os bem, a neve não estava muito ruim, a lua ajudava, e as botas de alpinismo davam-lhes uma boa tração. Rapidamente alcançaram o topo e começaram a descer do outro lado. Estava mais escorregadio, a encosta coberta de neve, com uns poucos brotos lutando para crescer acima da neve. Na frente estava a boca da caverna, a estrada entrava por ela, com muitas marcas de veículos na neve.
— Podem ter sido feitas pelos nossos caminhões — disse Rosemont, disfarçando a inquietação. — Há umas duas semanas que não neva. — Fez sinal para os outros esperarem e prosseguiu, saindo da estrada e correndo para a entrada da caverna. Tensing seguiu-o, usando o chão como cobertura, movendo-se também rapidamente.
Ross viu Rosemont desaparecer na escuridão. Em seguida Tensing. Sua ansiedade aumentou. De onde estava, não podia enxergar muito além, pois a estrada fazia uma curva, descendo íngreme. O luar tornava os rochedos e o enorme vale ainda mais ameaçadores, e ele se sentiu desprotegido e solitário, odiando a espera. Mas estava confiante. "Se os gurkhas estiverem com você, sempre terá uma chance, meu filho", dissera seu pai. "Proteja-os, e eles sempre o protegerão. E nunca se esqueça, com um pouco de sorte, um dia você será Sheng'Khan." Ross sorrira interiormente, orgulhoso, pois o título era dado muito raramente: só para uma pessoa que tivesse trazido alguma glória para o regimento, que tivesse escalado sozinho um pico bem difícil do Nepal, que tivesse usado o kookri e salvo a vida de um gurkha a serviço do Grande Raj. Seu avô, o capitão Kirk Ross, condecorado com a Cruz de Combate, morto em 1915 na batalha de Somme, recebera-o postumamente; seu pai, o tenente-coronel Gavin Ross, Medalha de Serviços de Guerra, recebeu-o em Burma, em 1943. E eu? Bem, eu escalei um pico difícil, o K4, e isso é tudo até agora, mas ainda tenho muito tempo...
Seus sentidos bem treinados mandaram-lhe um aviso e ele empunhou o kookri, mas era apenas Gueng. O homenzinho estava em pé ao lado dele, respirando com dificuldade.