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Com pouco mais de quarenta anos, sua aparência física, embora simpática, pouco tinha de impressionante. Alguém havia dito que a personalidade dele era informe como areia molhada, e não havia injustiça na afirmação. Foi, então, com grande surpresa para ele que, um dia depois de ter conhecido Hélsne no escritório, Charles Martel foi chamado à sala de Michel Sachard, chefe da firma, que lhe disse:

- Hélsne Roffe deseja que você se encarregue pessoalmente da ação de divórcio dela. Charles Martel ficou estupefato.

- Mas porquê eu, Monsier Sachard?

- Nem imagino. Veja se lhe presta bons serviços.

Estando encarregado da ação de divórcio de Hélsne, Martel teve necessidade de vê-la com freqüência. Com um pouco de exagero até, na opinião dele. Hélsne lhe telefonava e o convidava para jantar em sua villa em Le Vésinet, a fim de discutirem o caso, e o levava à ópera e à sua casa em Deauville. Charles cansava-se de explicar-lhe que o caso era simples e que não havia problema em conseguir o divórcio, mas Hélsne - ela insistia em que ele a chamasse de Hélsne, com grande embaraço para ele - dizia que precisava ser tranquilizada constantemente por ele. Por fim, ele passou a pensar nisso com um interesse um tanto amargo.

Um belo dia, Charles Martel admitiu a possibilidade de que Hélsne Roffe estivesse sentimentalmente interessada nele. Não podia acreditar nisso. Não era ninguém, e Hélsne pertencia a uma das grandes famílias da Europa.

Um dia, Hélsne não lhe deixou mais dúvidas sobre suas intenções e disse:

- Vou me casar com você, Charles.

Nunca pensara em se casar. Não se sentia bem ao lado das mulheres. Além disso, não amava Hélsne e não tinha certeza nem mesmo de simpatizar com ela. A agitação e as atenções que a cercavam em todo lado aonde iam desconcertavam-no. Era atingido pela luz dos refletores voltados para ela, e isso era um papel a que ele não estava absolutamente habituado.

Tinha também plena consciência do contraste entre eles. A expansividade de Hélsne era irritante para a natureza conservadora dele. Ela ditava moda e era o próprio requinte da elegância, ao passo que ele era apenas um simples e comum advogado de meia-idade. Não podia compreender o que Hélsne Roffe via nele. E ninguém mais podia. Em vista da notória participação de Hélsne em esportes violentos que eram tidos como redutos exclusivos dos homens, havia quem dissesse que Hélsne Roffe era partidária do movimento de libertação das mulheres.

Na realidade, ela desprezava o movimento e se insurgia contra o seu conceito de igualdade.

Não via razão para que ter homens à mão, quando fossem considerados iguais às mulheres. Era bom ter homens à mão, quando fosse necessário. Não eram seres particularmente inteligentes, mas podiam ser ensinados a ir buscar e acender cigarros, a dar recados, a abrir portas e a dar satisfação na cama. Eram excelentes animais de estimação. Bem treinados, tomavam banho sozinhos e não sujavam a casa. Eram uma raça excelente.

Hélsne Roffe tinha tido playboys, aventureiros, capitães de indústria, homens elegantes. Nunca tivera um Charles Martel. Ela sabia exatamente o que ele era. Nada.

Um pedaço de barro virgem que ela podia moldar como quisesse. Depois que Hélsne Roffe tomou essa decisão, Charles Martel não teve mais chance. Casaram-se em Neuilly e passaram a lua-de-mel em Monte Carlo, onde Charles perdeu a sua virgindade e as suas ilusões.

Ele pretendia voltar ao escritório de advocacia.

- Não seja idiota! - disse-lhe a mulher. - Acha que vou querer ser casada com um advogadozinho? Você vai entrar para a firma da família e um dia vai tomar conta de tudo.

Vamos tomar, aliás.

Hélsne conseguiu que Charles trabalhasse na filial de Paris da Roffe and Sons. Ele lhe contava tudo que acontecia, e ela o orientava e ajudava, apresentando-lhe as sugestões. O progresso de Charles foi rápido. Em pouco, era chefe da filial francesa e fazia parte da diretoria. Hélsne Roffe transformou-o de um obscuro advogado em diretor de uma das maiores empresas do mundo.

Devia estar encantado. No entanto, sentia-se infeliz. Desde o primeiro momento do casamento, Charles se sentira totalmente dominado pela mulher. Ela escolhia o seu alfaiate e os homens que lhe faziam os sapatos e as camisas. Fê-lo entrar para o circulo fechado do Jockey Club.

Hélsne tratava Charles como um gigolô. O seu salário ia diretamente para as mãos dela, e Hélsne só lhe dava uma mesada embaraçosamente pequena. Se Charles precisava de um dinheiro a mais, tinha de pedi-lo a Hélsne. Ela o fazia prestar contas de todos os momentos de seu tempo e queria que ele estivesse sempre à disposição dela.

Parecia gozar com a humilhação dele. Telefonava para ele no escritório e ordenava-lhe que fosse imediatamente para casa, com um vidro de creme para a pele ou qualquer coisa insignificante. Quando ele chegava em casa, ela estava nua no quarto, à espera dele. Era insaciável como um animal.

Charles viajou com a mãe até os trinta e dois anos de idade, quando ela morreu de câncer. Foi uma inválida por tanto tempo quanto a memória de Charles alcançava, e ele cuidou dela. Nunca teve tempo para sair com moças ou de se casar. A mãe foi uma carga pesada, e, quando ela morreu, Charles pensou que ia afinal viver em liberdade. Teve, ao contrário, um sentimento de carência. Nunca se interessou por mulheres, explicou seus sentimentos a Hélsne logo que ela lhe falou em casamento.

- Minha libido não é muito forte - disse ele. Hélsne sorriu.

- Pobre Charles. Deixe a parte do sexo comigo. Garanto que você vai gostar.

Detestou. E isso só pareceu aumentar o prazer de Hélsne. Ria das fraquezas dele e o obrigava a fazer coisas revoltantes, que levava Charles a sentir-se degradado e nauseado. O ato sexual em si era suficientemente desmoralizante. Mas Hélsne vivia interessada em fazer experiências. Charles nunca sabia o que devia esperar.

Certa vez, no momento em que ele estava tendo um orgasmo, ela pusera gelo picado em seus testículos e, de outra, lhe introduzira uma haste eletrificada no ânus.

Charles vivia apavorado com Hélsne. Ela o fazia sentir-se como um elemento feminino enquanto ela o masculino. Ele tentava proteger o seu amorpróprio, mas infelizmente não havia um só ponto nela que não fosse superior a ele.

Possuía uma inteligência brilhante. Entendia tanto de direito quanto ele, e muito mais de negócios. Passava horas e horas discutindo os casos da companhia com ele.

Nunca se cansava.

- Pense em nosso poder, Charles! - dizia ela. - A Roffe and Sons poderia arruinar ou fazer prosperar mais da metade dos países do mundo. Era eu que devia estar dirigindo a companhia que meu bisavô fundou. Ela faz parte de mim!

Depois de uma dessas explosões, Hélsne se tornava sexualmente insaciável, e Charles era forçado a satisfazê-la de uma maneira em que não gostava de pensar.

Acabou por desprezá-la. O seu sonho era livrar-se dela, fugir para nunca mais vê-la. Mas, para isso, precisava de dinheiro.

Um dia, na hora do almoço, René Duchamps, um amigo dele, falou-lhe numa oportunidade de fazer fortuna. Charles não podia confessar que não tinha um franco seu, mas foi até a Borgonha para ver os vinhedos e ficou profundamente impressionado.