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Fazia chucrute com batatas, carne de porco cozida com cerveja e temperada com cominho, acompanhada de uma maça cozida, recheada com airelles, as pequenas bagas vermelhas.

- Você é a melhor cozinheira do mundo, -dizia Walther, e Anna ficava vermelha de orgulho.

No terceiro ano de casada, Anna ficou grávida. Houve algumas complicações durante os oito meses de gravidez, mas Anna tudo suportou, muito feliz. Havia, entretanto, uma coisa que a preocupava. Começou um dia, depois do almoço. Ela estava tricotando um suéter para Walther, pensando na vida, e de repente ouviu a voz de Walther que dizia:

- Que é que você está fazendo, Anna, sentada aí no escuro? A tarde tinha passado e anoitecia. Anna olhou para o suéter no colo e viu que não havia tocado nele.

Para onde fora o tempo?

Onde tinha estado seu espírito? Depois disso, Anna passou por estados semelhantes e começou a pensar que esses acessos de inconsciência, essas decidas para o nada talvez fossem um presságio, um sinal de que ela ia morrer. Na verdade, não tinha medo da morte, mas não podia tolerar a idéia de se separar de Walther. Quatro semanas antes da data prevista para o parto, Anna teve uma das suas crises de inconsciência, falseou o pé no degrau e rolou pela escada. Acordou no hospital. Walther estava sentado na cama e lhe segurava a mão.

- Que susto você me deu!

Com um pavor súbito, Anna pensou: "Meu filho! Perdi meu filho!" Levou a mão à barriga e não sentiu mais nada.

- Meu filho! Onde está meu filho?

O médico disse:

- Teve gêmeos, Sra. Gassner.

Anna voltou-se para Walther, que estava com os olhos cheios de lágrimas.

- Um menino e uma menina. Ela poderia ter morrido naquele momento de felicidade. Sentiu um desejo súbito de ter os filhos nos braços. Queria vê-los, apalpá-los, carregá-los. - Falaremos sobre isso quando você estiver mais forte - disse o médico. - Só depois que você estiver mais forte.

Asseguravam a Anna que ela estava melhorando dia após dia, mas ela se sentia apavorada. Estava acontecendo alguma coisa incompreensível com ela. Walther chegava, tomava-lhe a mão e se despedia. Ela o olhava, surpresa, e começava a dizer:

- Mas você chegou agora mesmo… Olhava então para o relógio e via que três ou quatro horas tinham se passado. Tinha a vaga lembrança de que haviam levado os filhos para ela uma noite e que no mesmo instante ela adormeceu. Não se lembrava com clareza das coisas e tinha receio de perguntar. Mas não tinha importância. Poderia ver os filhos à vontade quando Walther a levasse para casa. Afinal, o grande dia chegou. Anna saiu do hospital em uma cadeira de rodas, embora dissesse que tinha forças para caminhar.

Na realidade, sentia-se muito fraca, mas estava muito nervosa e sabia que nada mais importava senão o fato de que ia ver os filhos. Walther entrou com ela nos braços e começou a subir a escada em direção do quarto.

- Não! - exclamou ela. - Leve-me para o quarto das crianças!

- Agora, você deve descansar. Está um pouco fraca…

Ela não quis mais escutar. Saiu dos braços dele e correu para o quarto das crianças. As cortinas estavam descidas, e Anna levou algum tempo para ambientar os olhos à escuridão. Era tamanha a sua agitação que ela estava até um pouco tonta, e teve receio de desmaiar. Walther a havia acompanhado e estava falando, tentando explicar alguma coisa. Mas, fosse o que fosse, não tinha importância. Eles estavam ali, dormindo nos berços. Anna se aproximou lentamente como se não os quisesse perturbar e ficou a olhá-los. Eram as crianças mais lindas que já vira. Mesmo naquela idade, podia ver que o menino seria bonito como o pai e teria os mesmos bastos cabelos louros. A menina era como uma frágil boneca de cabelos sedosos e dourados e rosto pequeno e triangular.

Anna voltou-se para Walther e disse com voz embargada pela emoção:

- São lindos… Eu estou tão feliz…

- Vamos, Anna - murmurou Walther. Passou o braço pelo corpo dela, abraçando-a.

Havia uma fome impetuosa dentro dele, e ela começou a sentir também alguns impulsos.

Fazia tempo que não se amavam. Walther tinha razão. Havia bastante tempo para as crianças.

Deu ao menino o nome de Peter e à menina, o de Birgitta. Eram dois belos milagres que ela e Walther tinham feito, e Anna passava horas no quarto dos gêmeos, brincando e falando com eles.

Ainda que não pudessem compreendê-la, tinha certeza de que sentia o seu amor.

Às vezes, quando estava mais entretida com os filhos, voltava-se e via Walther parado à porta, de volta do escritório. Anna compreendia então que o dia inteiro passava sem que ela sentisse.

- Venha - dizia ela. - Estamos jogando.

- Já preparou o jantar? - perguntava Walther, e ela de repente se sentia culpada.

Resolvia dar mais atenção a Walther e menos às crianças, mas no dia seguinte tudo se repetia. Os gêmeos eram como um imã irresistível que a atraía. Anna ainda amava muito Walther e tentava atenuar o sentimento de culpa, convencendo-se de que as crianças eram também parte dele. Todas as noites, logo que Walther adormecia, ela saía da cama e ia para o quarto das crianças e ficava a olhá-los até que a luz da manhã começasse a encher o quarto. Apressando-se então em voltar para a cama antes que Walther acordasse. Uma vez, Walther entrou no quarto das crianças no meio da noite e surpreendeu-a.

- Quer me dizer o que está fazendo?

- Nada, querido. Estava apenas…

- Volte para a cama! Ele nunca lhe falara com tanta rispidez. Na manhã seguinte, Walther disse: - Acho que devemos tirar umas férias. Seria muito bom para nós dois.

- Mas, Walther, as crianças ainda são muito pequenas para viajar.

- Estou falando de férias para nós dois. Ela abanou a cabeça.

- Eu não poderia deixar as crianças.

Ele lhe tomou as mãos e disse:

- Quero que se esqueça das crianças.

- Esquecer-me das crianças? - perguntou ela, atônita. Walther olhou-a bem nos olhos e disse: - Anna, lembra-se de como tudo corria bem entre nós antes de você ficar grávida? Lembra-se de como vivíamos alegres e felizes, sem ninguém mais para interferir?

Foi então que ela compreendeu. Walther tinha ciúmes dos filhos. As semanas e os meses passaram rapidamente. Walther deixou de se aproximar das crianças. Nos aniversários delas, Anna lhes comprava belos presentes. Walther sempre achava um jeito de estar fora da cidade em negócios. Anna não podia continuar a iludir-se para sempre. A verdade era que Walther não tinha o menor interesse pelos filhos. Anna julgava que talvez a culpa fosse dela, pois era muito interessada neles. "Obcecada" foi uma palavra que Walther certa vez usara. Ele lhe pedira que consultasse um médico a esse respeito, e ela fora só para fazer-lhe a vontade. Mas o médico era um bobo. No momento em que começara a falar com ela, Anna o isolara, deixando seu pensamento vagar para bem longe. Por fim, ouviu o homem dizer:

- Nosso tempo está esgotado, Sra. Gassner. Poder vir na próxima semana?

- É claro.

Nunca mais voltou. Anna sentiu que o problema era tanto de Walther quanto dela.

Se ela era a culpada por amar demais as crianças, ele o era por não amá-las o quanto devia. Anna apreendeu a não falar nelas na presença de Walther, mas logo que ele saía para o escritório, corria para o quarto dos filhos. Não eram mais bebês. Tinham completado três anos, e Anna já podia ter uma idéia de como seriam quando crescessem.

Peter era alto para a sua idade e tinha um corpo forte e atlético, como o pai. Ana o tomava no colo e murmurava: