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- Ah, meu Peter, o que você irá fazer com as pobres Frãuleins? Seja bom para elas, meu pobre filhinho, pois com você elas não têm chances.

Peter sorria timidamente e abraçava-a. Anna voltava-se então para Birgitta, que ficava cada dia mais linda. Não se parecia nem com Anna nem com Walther. Tinha finos cabelos dourados e uma pele delicada como porcelana. Peter tinha o temperamento do pai, e Anna de vez em quando tinha necessidade de repreendê-lo. Quando Walther não estava em casa, Anna punha discos ou lia para eles. Insistiam em que Anna lhe lesse histórias de bichos-papões, duendes e feiticeiras, repetindo-as sem parar. À noite, Anna fazia-os dormir com uma canção.

Anna rezava muito para que o tempo suavizasse a atitude de Walther, fazendo-o mudar. Mudou, sim, mas para pior. Odiava as crianças. A princípio, Anna pensara que era porque Walther queria todo o amor para si, sem dividi-lo com mais ninguém. Mas, pouco a pouco, teve consciência de que o sentimento dele não era proveniente do amor por ela.

Era de ódio. O pai dela é que estava certo. Walther se casara com ela por dinheiro. As crianças representavam para ele uma ameaça, e ele queria ver-se livre delas. Falava cada vez com mais frequência a Anna da venda das ações.

- Sam não tem o direito de nos impedir-nos. Poderíamos pegar todo esse dinheiro e ir viver em algum canto. Só nós dois. Ela o escutava, espantada.

- E ascrianças?

- Não - respondia ele, exaltado. - Escute, para o nosso bem, temos que nos livrar delas. É preciso. Foi então que Anna começou a compreender que ele era louco. Ficou apavorada. Walther tinha despedido todos os empregados, deixando apenas uma faxineira, que ia trabalhar uma vez por semana. Anna e as crianças estavam sozinhas em casa à mercê dele. Walther precisava de tratamento. Talvez não fosse muito tarde ainda.

No século XV, os loucos eram arrebanhados e mantidos presos pelo resto da vida, em grandes barcos, Narrenschiffe, os navios de loucos. Mas agora, com os recursos da medicina moderna, devia haver um meio de curar Walther.

E naquele momento, naquele dia de setembro, Anna estava encolhida em um canto do seu quarto, onde Walther a trancara, e esperava que ele voltasse. Sabia o que tinha de fazer pelo bem dele, dela e das crianças. Levantou-se e foi até o telefone.

Hesitou apenas por um instante. Depois, tirou o telefone do gancho e discou o número de emergência da polícia. Uma voz estranha atendeu:

- Alo.

- Sim! - Sua voz tremia. Alguém lhe tomou de repente o telefone da mão e desligou-o. Anna recuou.

- Por favor - disse ela em voz chorosa. - Não me faça mal…

Walther se aproximava dela com os olhos brilhantes e a voz tão macia que ela quase não podia ouvi-lo.

- Não vou lhe fazer mal. Eu amo você, não sabe disso? Tocou-a, e ela sentiu um arrepio percorrer todo o corpo. - Acontece que não queremos a polícia aqui em casa, não é mesmo?

Ela balançou a cabeça, tão aterrada que não podia falar.

- As crianças é que estão causando todo o problema. Temos de nos livrar delas.

Eu… Neste momento, a campainha da porta tocou no andar térreo. Walther parou, hesitante. A campainha tornou a tocar. -Fique aqui - ordenou ele. - Vou voltar.

Anna viu, petrificava, o marido atravessar o quarto. Bateu a porta e passou a chave. Ele tinha dito que ia voltar. Walther Gassner desceu as escadas rapidamente, foi até porta e abriu-a. Um homem com uma farda cinzenta de mensageiro tinha um envelope na mão.

- Uma correspondência urgente para o Sr. e a Sra. Walther Gassner.

- Pode entregar - disse Walther. Fechou a porta, olhou para o envelope e abriu-o.

Leu então o telegrama. "Tenho o pesar de comunicar que Sam Roffe morreu num acidente de alpinismo. Por favor, esteja em Zurique às doze horas de sexta-feira para uma reunião de emergência da diretoria". Quem assinava a mensagem era Rhys Williams.

Capítulo 3 Roma. Segunda-feira, 7 de setembro. 18 horas.

Ivo Palazzi estava de pé no meio do quarto com o sangue a escorrer-lhe do rosto.

- Mamma mia!

- Nem comecei ainda a arruinar você, miserável figlio di putana! - gritou Donatella.

Estavam ambos nus no grande quarto do seu apartamento na Via Montemignaio.

Donatella tinha o corpo mais sensual e excitante que Ivo Palazzi já conhecera, e mesmo naquele momento, quando tinha o rosto ensanguentado pelas unhadas dela, sentia um prelúdio de desejo inflamar-lhe o corpo. Dio, como era bela! Havia nela uma decadência inocente que o enlouquecia. Tinha um rosto de leopardo, com os malares salientes e os olhos amendoados, lábios cheios e sensuais que o mordiam e sugavam e… mas não devia pensar nisso naquele momento. Apanhou um pano branco em cima de uma cadeira, para estancar o sangue, e compreendeu tarde demais que se tratava de sua camisa. Donatella estava no meio da grande cama e gritava para ele:

- Só quero é que você sangre até morrer! Quando eu acabar com você, seu mulherengo imundo, não restar nada onde um gatinho possa fazer cocô!

Pela centésima vez, Ivo Palazzi ficou sem saber como chegara àquela situação impossível. Sempre se gabara de ser o mais feliz dos homens, e todos os seus amigos concordavam com ele. Todos os seus amigos? Todo mundo! Ivo não tinha inimigos. Nos seus tempos de solteiro, fora um romano despreocupado, sem um só cuidado na vida, um conquistador invejado por metade dos homens da Itália. A sua filosofia se resumia na frase: "Fasi onore Con una donna". Isso mantinha Ivo muito ocupado. Era um verdadeiro romântico. Vivia a apaixonar-se, e, a cada vez, usava seu novo amor para ajudálo a esquecer o anterior. Ivo adorava as mulheres, e para ele todas eram belas, das putanas que exerciam o seu antigo ofício ao longo da Via Appia às modelos de alta moda que se pavoneavam pela Via Condotti. As únicas mulheres a que Ivo não ligava eram as americanas. Eram muito independentes para o seu gosto. Além disso, que se poderia esperar de uma nação cuja língua era tão pouco romântica a ponto de se traduzir Giuseppe Verdi por Joe Green?

Ivo tratara sempre de ter várias mulheres em cada uma das fases de preparação.

Havia cinco fases. Na primeira, situavam-se os conhecimentos recentes. As garotas recebiam telefonemas diários, flores e pequenos volumes de poesia erótica. Na segunda fase, estavam aquelas a quem ele mandava pequenos presentes de Gucci e caixas de porcelana com bombons de Perugina. As da terceira fase recebiam jóias ou roupas, e eram levadas para jantar no El Toula ou na Taberna Flavia. As das quarta fase conheciam a cama de Ivo e apreciavam a sua notável técnica amorosa. Um encontro amoroso com Ivo era elaborado como uma produção de cinema. O belo apartamento na Via Margutta ficava cheio de flores. A música podia ser ópera, clássica ou rock, de acordo com as preferências da escolhida. Ivo era soberbo cozinheiro, e uma das suas especialidades era justamente pollo alla cacciatora, frango à caçadora.

Depois do jantar, uma garrafa de champanha gelado para beber na cama… Sim, Ivo adorava a quarta fase.

Mas a quinta era provavelmente a mais delicada de todas. Constava de uma fala emocionada de adeus, de um generoso presente de despedida e um triste arrivederci.

Mas tudo isso havia acontecido no passado. Agora, Ivo Palazzi olhava para o rosto ensangüentado e arranhado no grande espelho acima da cama e se sentia horrorizado.

Parecia que fora atacado por uma máquina enlouquecida.

- Veja o que você fez comigo! - exclamou ele. -Sei que não foi de propósito, cara!

Aproximou-se da cama a fim de tomar Donatella nos braços. Os braços macios dela cingiram-no e, quando ele começou a abraçá-la, ela cravou as longas unhas nas suas costas, e as fez correr pela carne como se fosse um animal selvagem. Ivo deu um grito de dor.

- Pode gritar! - exclamou Donatella. -Se eu tivesse aqui uma faca, cortaria o seu cazzo e o enfiaria por sua miserável garganta dentro!

- Por favor! - pediu Ivo. - As crianças podem ouvir.

- Melhor!Já é tempo de saberem que espécie de monstro é o pai delas! Ivo deu um passo na direção dela.